Capítulo 2

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A cidade ruge em um movimento frenético. Os trens lotados de funcionários, seguem em direção às fábricas. Em meio a um dos vagões, se espremendo entre a enorme aglomeração de operários suados, Mina se ressente do cheiro de suor já àquela hora da manhã.

Diana olha para seu rosto, enquanto exibe seu mais despretensioso sorriso, e diz:

— Saudades disso aqui, não é minha filha?

— Nossa... Como pude ficar tanto tempo afastada dessa graciosidade que somente Distopx nos proporciona?

Diana gargalha, se equilibrando com um braço erguido agarrado ao apoio do teto. Entre sacolejos e freadas bruscas, o trem chega a mais uma estação, onde mais e mais operários ainda conseguem adentrar o comboio. Após mais algumas estações finalmente chegam ao destino.

Não havia como se perder ou duvidar que chegaram ao destino, pois todos os passageiros descem e se dirigem, diligentemente, para a enorme estrutura cinza e decrépita, uma de muitas fábricas existentes em Distopx.

Quase ninguém fala, certamente ninguém sorri. Os capatazes observam o movimento dos peões entrando pelo grande portal em uma onda humana irrefreável. Todos usam o mesmo uniforme cinza, o mesmo capacete, os mesmos calçados. São humanos, mas também são peças de um processo de produção massificado e massificante, onde, diariamente tudo aquilo se repete, invariavelmente. Não podem parar jamais. Paralisar esta estrutura fabril destruiria a vida de sonhos e realizações de Utopx e Heterotopx imediatamente.

Mina se posiciona em sua estação de trabalho, defronte à esteira rolante onde, em breve, iniciará o fluxo de produção daquele turno e, por oito horas seguidas os itens passarão à sua frente, assim como, de todos os outros funcionários, para inspecionar, alinhar, arrumar, empacotar... em uma laboriosa atividade, sem fim e sem misericórdia.

Diana está a seu lado, agora, sem o mesmo sorriso que lhe é tão peculiar, sua concentração não permitirá a demonstração de sua tão habitual simpatia. Este é um mundo sem empatia, sem risadas, sem deleites, sem prazeres...

O processo se inicia e, por quatro horas, produzem incansavelmente quando, uma sirene, absurdamente alta, avisa do horário de almoço. O sorriso de Diana brota como um raio de estrela-branca passando por uma fresta de uma enorme nuvem de tempestade. Mina continua séria e ensimesmada, seca o suor da testa e parte em direção ao refeitório.

Enquanto Mina olha para sua bandeja, com uma indecifrável gororoba cinza, Diana puxa novamente uma espetada:

— Não é como lá em Heterotopx, não é? Quanto tempo faz que você não vê um rango tão apetitoso assim, hein?

— Tenho vontade de vomitar antes de comer isso... Imagine depois que esse tijolo estiver em meu estômago?

Ambas permanecem em silêncio enquanto deglutem aquele tenebroso prato. Então, é a vez de Mina romper o silêncio.

— Olhe, eu realmente passei tempo demais lá. Estou ficando frouxa. Olho para isso tudo agora e penso que não sei como alguém consegue viver nesse lugar.

— Não se preocupe querida. Aqui é um lugar onde ninguém morre. Pelo menos não morremos de fome. Temos que permanecer fortes para a produção.

— Eu sei. É sempre sobre trabalho... Lá também se trabalha, mas em função de reconhecimento. É tão diferente... Tudo gira em torno de receber glória, ou Glorx, como eles chamam por lá.

— Por falar nisso, como você conseguiu?

— Consegui o quê?

— Como assim? Você sabe exatamente do que estou falando... Esses olhos azuis que tenta esconder embaixo desses óculos de proteção?

GLORXWhere stories live. Discover now