• Sonhos •

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"Das muitas ocupações brotam sonhos;
do muito falar nasce a prosa vã do tolo."

Parece que Carlos percebeu meu embaraço e finalmente disse algo para que eu pudesse sair daquele sofrimento. Eu simplesmente havia travado, sem conseguir dizer nada nem sorrir, enquanto Daniel e a família riam como se tivessem ouvido uma piada.

- Lá na igreja não é, não. Até o pastor já participou, né Lauro? - disse Carlos, me tirando do estado apático que me encontrava.

- Si... Sim! É! - consegui dar um riso - o pastor participou... não esse atual. Foi um outro pastor. E tem outros meninos que sempre participam. - ficamos em  silêncio - Eu mesmo sempre participei. - Daniel olhou-me com ternura e forçou um riso, deixando à mostra as suas tão lindas covinhas nas bochechas.

- Não liguem! É doidice dela! - disse Daniel.

- Lá é bem tradicional, né? - perguntou Carlos.

Passei a mão em minha testa, secando as gotas de suor que aquela situação embaraçosa tinha me trazido. Senti que meu rosto estava frio, bem como o suor que dele tirei. Então comecei a pensar comigo mesmo que deveria aprender a me sair dessas situações. Frases ensaiadas ou risos forçados já eram de bom tamanho. Eu só não podia mais passar por aquilo outra vez, até porque nem sempre um Carlos estaria por perto para me livrar.

- O quê? - perguntou Daniel.

Ele parecia não ter prestado atenção na pergunta de Carlos, como se também estivesse em uma conversa interna. O que será que pensava? Daria tudo para saber. Mas, naquele momento, não era possível.

- No sítio... de onde vocês vieram. A igreja de lá era muito tradicional? - Carlos indagou novamente.

- Ah, tá! - ele pigarreou, algo que lhe era de costume antes de falar uma frase longa - Sim, era um pouco. Lá não tinha uma igreja grande e bonita como a daqui, mas era cheia de Deus e da palavra dele. Como na maioria dos interiores, eu acredito.

- É! Tem uns que nem aceitam que as mulheres usem saias na altura do joelho. - Carlos disse.

- Tem mesmo! Mas lá não era tão assim, não. Tinha umas meninas bem mal comportadas, que só Jesus na causa. Às vezes, era até pior que aqui. Acredite.

- Entendo!

Eu não dizia uma palavra. Apenas ouvia a conversa dos dois, enquanto meus olhos percorriam pela humilde casa de Daniel. Na verdade, percebi que todas as casas construídas nesta parte são bem humildes. E não é nenhuma novidade, já que nós moramos na periferia da cidade. Eu morava em terra firme, mas Daniel teve que vim viver sobre as margens do rio.

- Tá estudando? - perguntei de repente.

- Eu? - Daniel perguntou, e eu, balançando a cabeça positivamente, o respondi. Ele continuou - Sim! Estou! Segundo ano, infelizmente.

- Por quê, infelizmente? - perguntei.

- Porque... - ele coçou a cabeça - Não sei muito o que quero, ou se pelo menos quero alguma coisa.

- Tá falando de continuar os estudos?

- Isso! Nunca passou pela minha cabeça a ideia de entrar numa faculdade.

- Entendi! Então não tem sonhos?

- Isso é diferente. Pra mim, sonhos nem sempre têm a ver com muito estudo e boa formação. Eu só quero coisas simples.

- E que tipo de coisa simples tu quer?

- Uma fazenda. Minha própria fazenda! - ele respondeu.

- Isso não me parece tão simples.

O Fruto ProibidoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora