Capítulo 3.1

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Eu queria que todos voltassem para suas casas.

David foi embora fazia um tempo, mas um amigo da minha mãe chegou com a família para celebrar o Natal. Eu não estava no clima.

- Quantos pastéis você quer, querida? – mamãe me perguntou.

- Põe um pouco mais de macarrão no seu prato, Helena – sugeriu Rayane. – Está uma delícia.

Ignorei as duas e continuei enchendo os três pratos de comida, para as outras crianças.

Ouvi o sr. Willian contando uma piada e fazendo todos rirem, menos eu.

Não se ouviam tantas risadas no nosso apartamento nos dois últimos meses. Ouvi-las agora fazia eu me lembrar de como eram as coisas quando Lucas ainda estava por aqui.

Fiquei olhando a mamãe procurar por latas de refrigerantes na geladeira: ela tinha um olhar derrotado em seu rosto suave da cor do café.

A mamãe trabalhava como segurança do Brooklyn.

Acho que conseguiu esse trabalho porque é bem intimidadora. Nem é tão alta, mas é realmente grande. As duas, ela e Rayane, têm a estrutura de jogadores da defesa do New York Giants, – time de futebol americano de Nova York – só que são inofensivas.

- Eu tenho uma piada boa que vocês vão gostar. – Ouvi o sr. Willian gritar outra vez.

- Cala a boca, Willian! – Rayane gritou de volta.

Embora o sr. Willian fosse homem, ele agia como se fosse uma tia minha. Ele era um amigo de trabalho da minha mãe, que a conhecia desde antigamente – a época em que ela ainda estava com meu pai. - Na verdade, eu sabia que o meu pai culpava o sr. Willian pela minha mãe se descobrir lésbica.

- Aquele quebra-munheca ainda é amigo da sua mãe? – meu pai perguntava toda a vez que nos víamos.

Quando eu respondia que sim, o papai falava um monte sobre como o sr. Willian tinha inveja da alegria dele e da mamãe juntos e convenceu de que ela gostava de mulher, quando na verdade não gostava. Além de falar essas coisas, ele também me dizia que eu não devia me igualar a elas e que era errado se eu gostasse de alguma menina.

Eu não tinha muita certeza de como isso funcionava. Será que é realmente possível fazer com que alguém se torne gay só conversando?

Esperava que não fosse desse jeito, porque eu falo com muitos gays. Realmente gosto muito deles, embora tenham que lidar com muito preconceito. Muitas pessoas odeiam os gays e os xingam de vários nomes, e eu não acho que alguém escolheria passar por isso se tivesse uma opção. Quando alguém escolheria ser gay sendo que é bem mais fácil ser hétero?

Apoiei os três pratos de comida nos braços e comecei a sair da cozinha quando a mãe enfiou uma lata de refrigerante embaixo do meu braço. De repente, ela me abraçou bem apertado, e pensei que fosse derrubar tudo.

- Dê esse refrigerante pro Willian – ela disse. – Minha torta de maçã está quase pronta.

- Estou sem fome – falei.

- Eu sei, eu sei. – ela respondeu desanimada.

Rayane provocou:

- Helena tá segurando essa comida toda e tá sem fome?

Minha mãe me disse:

- Pelo menos você tem que provar a torta de maçã pra mim, querida.

Concordei. Eu só tinha pegado toda aquela comida para pensarem que eu estava faminta. Eu não queria a mamãe e a Rayane pegando no meu pé porque tenho comido pouco ultimamente.

Refúgio em PapéisWhere stories live. Discover now