A Srta. Holland havia tomado a sério suas novas responsabilidades,e agia mais como uma babá do que como uma acompanhante. Às vezes até tratava Alexandra como a uma criança. Mas, afinal de contas, ela já havia feito dezessete anos e, mesmo considerando que levara até ali uma vida relativamente protegida, tinha lido muitos livros que até teriam escandalizado as freiras. A única coisa que seu pai não lhe deixava faltar era dinheiro, e ela o gastava generosamente em livros de todos os gêneros. Toda a experiência que possuía sobre o relacionamento entre um homem e uma mulher tinha vindo das leituras, e Alexandra achava que poderia enfrentar uma situação destas quando chegasse a hora. Era uma jovem madura e inteligente, ou assim acreditava ser, mas a maneira como a Srta. Holland se comportava a irritava. Este fato divertia Harry desde a chegada deles ao Uruguai, o que aumentava ainda mais sua frustração.

 Embora Charles Durham não tivesse deixado fortuna, não morrera pobre. Usara grande parte de seu capital para financiar expedições, mas a venda de uma casa que possuía em Ealing proporcionara a Alexandra uma boa herança. Ela pretendia reembolsar Harry pelas suas despesas, mas ele, antes de viajar para a América do Sul, insistira em pagar tudo até ela se tornar maior de idade. Aquilo doeu em sua consciência, pois sabia que o enganara, inventando a história do pai tê-lo indicado como seu tutor, mas agora não havia mais nada a fazer. Consolou-se pensando que uma vez morando em sua casa procuraria ser útil, e que algum dia lhe pagaria com juros.

Depois da partida de Harry, os dias se arrastaram. A Srta. Holland acompanhou-a tanto na preparação dos papéis de embarque como para tomar as várias vacinas contra doenças tropicais. Ele fora na frente, uma semana depois do primeiro encontro, porque não podia deixar a fazenda por muitos dias, e Alexandra viveu numa ansiedade febril até a hora do embarque.

Deixaram a Inglaterra num dia frio e cinzento, saindo do inverno europeu para o verão exuberante dos trópicos. A noite que passaram no Rio de Janeiro não impressionou Alexandra, mas a Srta. Holland encantou-se com o Corcovado e o Pão de Açúcar. Alexandra recomeçou a viver quando desembarcaram, na manhã seguinte, num modesto aeroporto de uma pequena cidade uruguaia, onde Jason as esperava. Alexandra, decidida a ignorar suas restrições, e para desgosto dele e da Srta. Holland, correu ao seu encontro e atirou-se a ele naquele seu modo habitual e impulsivo. Mas desta vez Harry libertou-se rapidamente, e o beijo que ela pretendera dar em sua boca resvalou para o queixo.

Agora o Range-Rover penetrava numa região montanhosa Ao longe, os picos da Serra Grande pareciam misteriosos e enormes. Já no fim da tarde, os ciprestes castigados pelo vento lançavam suas sombras na terra como dedos de um fantasma gigante. Repentinamente, entraram num vale ainda banhado pelo sol, e viram lá embaixo um rio que corria por entre as pedras.

Foi neste momento que Alexandra o viu! Sua silhueta desenhava-se contra os raios dourados do sol poente, num espinhaço oposto a eles: um magnífico garanhão negro que observou somente por um breve segundo e que sumiu tão depressa que a princípio ela temeu ter apenas imaginado.

— Oh! — exclamou, maravilhada, e Harry, satisfeito, voltou-se para trás. — Que lindo!

— Você o viu! — Era uma afirmação, não uma pergunta, e a Srta. Holland, sem saber o que estava acontecendo, perguntou:

— O que... — mas não conseguiu terminar a frase, pois foi interrompida por Alexandra, entusiasmada.

— Sim! Sim, eu vi! Ele é seu? Oh, Harry, mas ele é lindo!

Harry sorriu, meio zombeteiro, ao perceber a excitação dela.

— Duvido que aquela fera um dia pertença a alguém — comentou, realista. — Deve ser meu porque vive em minhas terras, mas ninguém conseguiu domá-lo ainda.

Anjo LoiroWhere stories live. Discover now