Destino e Coincidências

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 Havia alguma coisa de misteriosa, estranha e mística em coincidências. Como era possível que, duas pessoas que não se conheciam, que não tinham nada em comum, que viviam duas vidas tão diferentes, se encontrarem tantas vezes ao acaso?

Eu costumava acreditar em destino, que havia um certo proposito a ser seguido, que o universo guardava algo de especial para cada ser vivo naquele mundo. Mas não conseguia entender o que exatamente o universo e o destino estavam guardando pra mim, já fazia algum tempo que eu não conseguia entender.

E eu não conseguia entender o porquê de aquela ser a terceira vez, em um curto espaço de tempo, que eu encontrava Nicolas. Uma coincidência estranha ou um destino ridículo? Eu sinceramente não sei o que seria pior.

Eis o que eu havia descoberto nos dias em que trabalhei no Centro de Arte e Cultura. Nicolas estava ali há pouco menos de um mês e, o suposto trabalho voluntário dele, era basicamente pintar as paredes envelhecidas da parte externa do CAC. As pessoas que trabalhavam lá o chamavam apenas de "Nick" e, quase todas elas, especialmente as mulheres, sorriam quando falavam dele, como se ele fosse uma notícia boa. Nicolas não falava com quase ninguém ali, fora o professor de violão, Lucas, que parecia gostar de falar com ele e com quem Nicolas parecia se dar razoavelmente bem.

Todo dia, ele chegava as nove horas da manhã. Luana o cumprimentava alegremente e ele respondia com um levantar de mão, não acenava e nem respondia o "bom dia" dela, apenas erguia a mão em reconhecimento. Enquanto à mim, eu apenas dizia "Nicolas" de um jeito neutro e, o que eu recebia em troca era um "hum", que poderia ter ou um tom indiferente ou zangado ou desdenhoso. Eu nunca sabia qual seria o "hum" do dia.

Ele chegava, ia direto para o vestiário e se trocava, colocando roupas que ele provavelmente considerava descartáveis, que sempre eram jeans e uma camiseta escura. Então, ele ia direto para os fundos, onde ficava pintando as paredes, às vezes tirando a tinta descascada com uma espátula, depois limpando tudo com uma vassoura. Ia embora todo dia à uma da tarde.

Descobri que ele já tinha pintado a lateral do casarão, que estava com um amarelo vibrante nas paredes e as cornijas delicadamente pintadas de branco. E, pelo que pude perceber, ele era bom nisso, em pintar paredes. Era surpreendente considerando que Nicolas poderia contratar uma equipe inteira de pintores, se quisesse.

Eu ainda não acreditava que ele estava lá por ser um voluntário, embora não conseguisse pensar em qualquer outro motivo que fosse. Toda vez que eu perguntava à alguém sobre a razão pela qual ele estava ali a resposta era a mesma, "Nick faz um trabalho voluntário". Mas não era possível. Ele era incrivelmente babaca e, incríveis babacas não eram altruístas.

Naquela primeira semana, aconteceu o que eu acabei batizando de "dança do acasalamento ao contrário" entre eu e Nicolas.

Toda dia quando nos víamos, nos corredores, na recepção ou nos fundos do casarão, Nicolas me encarava daquele jeito especial dele, como se eu fosse a coisa mais absurda que ele já vira na vida, como se eu fosse o resultado do acasalamento entre uma girafa e um pinguim. Eu sorria pra ele de maneira debochada e Nicolas respondia com uma careta de desgosto.

Às vezes, trocávamos diálogos passivo agressivos nos momentos em que nos esbarrávamos nos corredores ou nos fundos, sempre quando não havia ninguém por perto para ouvir. Ele costumava me chamar de "garçonete" como se fosse um xingamento, enquanto eu o chamava de "rockstar" com escárnio, o que resultava em um revirar de olhos por parte de Nicolas.

Naquele dia, eu recebi um "hum" indiferente. Quando fui pegar café na copinha dos funcionários, encontrei Nicolas apoiado contra a parede, ao lado da cafeteira, segurando um copo de plástico fumegante na mão. Ele me olhou por um breve momento, seu olhar, como sempre, estava carregado de desprezo.

Beca e Nick (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now