Parte II - A Estrela Reluzente

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Enquanto limpava a sujeira do vestido esvoaçante, levantei. Eu, acreditando que a situação não poderia piorar, fui relembrada da presença constante do meu carma. Quando ainda tentava assimilar os últimos acontecimentos, uma bomba de poeira me derrubou no chão. Garras afiadas imobilizaram meus braços, e senti um peso gritante nas costelas, meus pulmões reclamaram por mais ar. Se eu queria uma prova da veracidade dos fatos, ela estava agora em cima de mim. Uma espécie monstruosa de lagarto verde inundava toda a atmosfera da Canopus e meu olfato com seu odor.

- Quem diria que eu encontraria a Lady Constelação por aqui! - A fala sibilada do alien exalava surpresa. - Você será meu prêmio de consolação, doce Lady.

Eu estava congelada de pavor. Sua língua asquerosa molhou toda minha face direita, impregnando meus sentidos com seu bafo animal. Nervosa, tentei me debater, mas fui impedida pelo duxter. Seu semblante emanava diversão.

- Eu pensei que Lunitty, a grande Lady Constelação, fosse mais forte. - Respondeu de modo irônico. - Pelo visto, estava enganado.

A Lunitty é forte, eu não. Ayla Ramona é apenas outra humana desprovida de poder, que estava no lugar errado e na hora errada. Xinguei todos os deuses das estrelas e o senhor Andrômeda por me deixar sozinha ali naquele pseudo-inferno, sem qualquer noção de defesa básica. Tudo bem que eu era viciada em Star Gods, mas ficção é completamente diferente de realidade.

Era agora que eu morria realmente, então decidi aceitar meu destino. No fim, algo me dizia que eu não sobreviveria ao jogo de qualquer forma. O duxter não me deixaria viva nem se eu implorasse, já que, supostamente, sou a Lady Constelação. Até eu, se fosse uma alienígena assassina frustrada, não pouparia a vida do meu odiado inimigo.

Quando o E.T. levantou as garras para pôr fim a tudo, fechei os olhos no automático. Esperei a dor e a escuridão chegarem, mas elas nunca vieram. A única sensação que tive foi libertação, o peso havia sido retirado. Limpei resquícios de uma poeira misteriosa do rosto e abri os olhos. Braços fortes, corpo musculoso, vestimentas dos deuses, pele alaranjada, olhos violetas. Diante de mim, estava a personificação da beleza: Hasttwe, o Capitão das Galáxias.

Nossos olhares se encontraram, e eu senti um calor sedutor percorrer meu corpo por inteiro. Ele era lindo, mais perfeito que na minha imaginação de fã. Todos os banners, posters e imagens do jogo, pregados nas paredes do meu quarto, não faziam jus à elegância daquele ser espacial tão único.

- Você deveria ter se defendido, Lunitty. - Hasttwe lançou um sorriso caloroso, que descongelaria o Himalaia inteiro. A rouquidão na sua voz era uma carícia boa aos meus ouvidos.

Quando toquei sua mão para levantar, uma onda de choque prazerosa varreu meu espírito por completo. Eu acabara de conhecer meu ídolo e já o sentia invadindo as células do meu corpo como um inquilino perpétuo.

Plenamente narcotizada pela beleza do meu salvador, não percebi que ele empurrava um objeto brilhoso na minha direção. Era a estrela reluzente, a primeira estrela cadente do destino. Eu havia, inesperadamente, conseguido encontrar um dos meus objetivos. Eu não, o Capitão das Galáxias.

- Acho que isso te pertence, querida. Ela apareceu quando o duxter se desfez naquela nuvem de poeira.

Só agora notei a ruma de pó onde deveria estar o corpo do lagarto. A espada afiada de Hasttwe, usada para acabar com a coisa, continuava intacta rente ao seu corpo.

Meu dedos tocaram a superfície dura e quente da primeira estrela. Seu brilho intenso ofuscou minha vista, e enquanto o astro desaparecia na minha mão, escutei o sussurro do Senhor Andrômeda, como se ele estivesse ao meu lado. 

- Parabéns, Lady! A primeira estrela está agora no seu inventário. Faltam apenas mais duas. - Ele parecia animado. - Uma dica preciosa: você é capaz de se proteger, basta estar em sintonia com seu corpo.

Claro! Falar é fácil, o ruim é colocar em prática. Enquanto remoía a fala enigmática do E.T., o mundo retornou sua cor inicial. Pelo visto, ele não me ajudaria em mais nada.

- Temos que encontrar as outras duas, Lunitty! - Mesmo em alerta, as feições de Hasttwe eram afetuosas. - Fico feliz que esteja bem, minha amada. 

Foi então que o Capitão das Galáxias me puxou para os seus braços. Ao que tudo indica, ele aparenta não saber que eu sou uma intrusa naquela realidade.

Se com apenas um toque de mãos eu estava quente, agora me encontrava em chamas. Seu cheiro amadeirado entorpeceu meus sentidos. Tudo nele era convidativo.

Hasttwe era outro alien famoso, cujo planeta natal, o Britez, havia sido destruído pelos duxters. Como resposta, ele resolveu vingar a morte do seu povo e se tornou o temido, mas adorável Capitão das Galáxias. Ambos, Lunitty e Hasttwe, se apaixonaram no primeiro jogo e, diante de tantas inconveniências, salvaram o universo, solidificando também seu amor verdadeiro. Pontadas de inveja e ciúmes brilharam na minha cabeça. Eu sei que não sou a verdadeira Lady Constelação, mas é injusto ela ter o monopólio do amor desse grande homem somente para si.

- Falta pouco agora, Lunitty! Nós vamos conseguir salvar a galáxia. - Suas palavras pareciam um afago aos meus sentimentos conflituosos. 

Hasttwe me abraçava apertado. Talvez eu esteja tomada pelas emoções da Lady, já que ele era seu parceiro na vida e nas batalhas; ou por minha afeição de fã, porém, seja qual for a resposta, aquele abraço parecia ser errado e certo. Errado porque eu não deveria me apegar a um personagem fictício, uma vez que voltaria para casa, custo o que custar; e certo porque ele era o Hasttwe, meu Capitão das Galáxias.

Um pouco do temor por estar presa dentro de um jogo se esvaiu. Eu poderia ser morta a qualquer momento naquele lugar, mas pelo menos não estaria sozinha.

Mais rápido que o esperado, ele me soltou, porém permaneceu segurando minha mão.

- Precisamos sair daqui!

Eu sabia que o nosso próximo destino era a Constelação Centaurus, mais especificamente na Nebulosa de Bumerangue. Eu tinha um guia fanático na minha cabeça e conhecia cada fase desse jogo, mesmo que tenha sido lançado há apenas alguns dias. Contudo, o maior problema agora era viajar anos-luz até lá. Não era como se uma nave espacial da NASA fosse fazer frete na estrela Canopus.

- Claro que isso não será um problema. - Hasttwe sorriu. Devo ter pensado alto demais.

O Capitão das Galáxias voltou a me puxar ao encontro do seu peitoral. Seus braços estavam começando a se tornarem meus lugares favoritos nas estrelas, e acabei me censurando por esse pensamento. É meu dever ser imparcial, ainda que seja uma tarefa perdida.

Com a espada na mão livre, ele cortou o ar numa linha. O que parecia ser um buraco negro se materializou diante da nossa visão. Antes que meu grito rompesse pela garganta, nós dois caímos naquela região desconhecida no espaço-tempo.

1140 palavras

Star Gods II Where stories live. Discover now