Shin ficou com o imperador para planejar uma operação de infiltração, e como Mikoto não entendia daquilo, achou melhor voltar ao Genbu, onde encontrou Sayuri e Takako debruçadas no computador.

-- Estão todos muito assustados em casa –a mais nova contou ao ver a menina chegar – É melhor voltarmos para Shiro.

-- Mas Kuroi ainda está vulnerável – Takako argumentou.

-- Quais as chances de outro bombardeio aqui? Yasha já destruiu o Santuário Negro, e os Santuários Azul e Vermelho estão protegidos, então o próximo alvo dela é o Branco. Não podemos deixa-la chegar a eles também!

-- Sayuri, essa ânsia de voltar não seria porque você quer outra chance de brigar com os youkai? – Takako cruzou os braços. Sayuri olhou para a prima indignada.

-- O quê?! Como pode dizer isso?!

Era a primeira vez que Mikoto as via gritar daquele jeito, e sendo uma com a outra, só tornava a cena ainda mais assustadora. Em uma posição como a que ela estava, tentaria se fundir à parede e sair do recinto na primeira oportunidade, mas talvez pela visão de Haku a seu lado fazendo exatamente isso, encolhido como um animal assustado, Mikoto tomou outra atitude.

-- Parem! – gritou. As duas a encararam, só menos surpresas que ela mesma. Após engolir em seco e um instante de silêncio, Mikoto prosseguiu – Brigar só vai nos atrasar, e é isso que Yasha quer. Cheguem a um acordo.

Takako e Sayuri ainda olharam para ela por um breve momento, absorvendo o que escutaram, e a primeira quebrou o silêncio:

-- Isso foi muito maduro. Obrigada, Mikoto, acho que nós duas precisávamos disso.

Sayuri deu um profundo suspiro antes de recomeçar:

-- Eu só acho que ir para Shiro é a melhor decisão porque é o próximo passo óbvio de Yasha ela conseguiu destruir um santuário, se destruir outro, perderemos metade dos pilares principais. Nosso trabalho não é lidar com guerras e política, para isso tem o imperador e os reis.

Foi a vez de Takako suspirar.

-- Entendo o que você quer dizer, e eu concordaria, mas considerando o que aconteceu aqui, também seria uma opção reconstruir o Santuário Negro, porque agora que foi destruído, Kuroi está muito mais vulnerável a ataques youkai. Se Yasha voltar, estarão indefesos. Também é nosso trabalho zelar pela segurança das pessoas contra esses monstros.

As primas se encararam, sem saber o que dizer agora. Ali Mikoto percebeu que a posição de miko também pesava muito nos ombros delas, mesmo as duas sendo mais velhas e muito mais experientes, e agora essa responsabilidade as dividia.

-- Vocês podiam ir para Shiro, e eu fico aqui – ela sugeriu. Takako abria a boca para discordar quando um grito no corredor a sobressaltou.

-- Gente! – Yukio abriu a porta abruptamente, os olhos quase saltando das órbitas – Desculpe interromper, mas precisam ver isso!

A televisão do navio exibia a notícia de uma invasão de Aka ao território de Ao. Os tanques de guerra percorriam as ruas, e as pessoas na calçada só observavam, os rostos congelados em expressões de puro medo.

-- Como isso é possível? – Sayuri exclamou esganiçada. Kurono explicou:

-- Aviões de Aka bombardearam as bases aéreas, então Ao não pôde revidar quando veio a invasão por terra.

-- O imperador não pode ter permitido isso – Takako não conseguia desviar os olhos da televisão.

-- Não permitiu, não tinha como, do jeito que as comunicações foram comprometidas – respondeu o capitão – Se o imperador está incomunicável e um país se vê na ameaça de um ataque, o rei tem autoridade para ordenar a ação defensiva que achar mais apropriada.

-- O rei Sujin deve achar que a melhor defesa é o ataque – Yukio comentou.

-- Ainda não falaram nada sobre o rei Ayahito – Hiro aumentou o volume.

Mikoto foi para o convés, não queria ver mais destruição e guerra. Debruçada na amurada e observando o mar negro cintilante com a prata do luar, pensou que, quando via tais notícias de intrigas políticas em Iruka, tudo parecia tão distante da realidade tranquila e imutável da ilha. Nenhum ilhéu jamais pensaria que iria presenciar tais eventos, e Mikoto não era exceção.

Nos últimos dias ela vira mais morte e destruição do que na vida inteira, e apesar de não ter entrado em pânico como imaginou que faria, queria ficar longe de qualquer chance de passar por isso de novo. Por essa razão ela se candidatara a ficar ali.

Ajudar a reconstruir o Santuário Negro poderia fazer com que se sentisse melhor, mas com aquela invasão em Ao, com certeza Sayuri e Takako concordariam em ir para lá, e será que iam querer que Mikoto fosse também? Nenhuma pareceu gostar da ideia de deixá-la em Kuroi.

Sinceramente, naquele momento o que a acalmaria era voltar para casa e deitar a cabeça no colo de Megumi-sama, como fazia quando criança.

-- Mikoto, está triste? – para variar, Haku a seguira até ali. A jovem esboçou um sorrisinho para sua expressão ingênua.

-- Não, não exatamente.

-- Posso fazer alguma coisa para você melhorar?

-- Não é algo com que você possa ajudar, então não se preocupe.

Ele recostou a cabeça em seu ombro, numa tentativa de oferecer conforto. Mikoto retribuiu acariciando seu cabelo e voltou a contemplar o horizonte negro.

O Conto da Donzela do SantuárioWhere stories live. Discover now