Ɣ 01 - Duras Lembranças

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"Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente". — William Shakespeare

No meio da tarde, Bernard subiu as escadas e bateu na pequena porta do sótão, onde ficava o quarto da menina que adotou. Desde a sua chegada há quase um ano, as tardes de quarta-feira se tornaram cada vez mais complicadas.

O homem se preocupava com o trauma sofrido pela criança, era o quinto psicólogo que frequentava e de longe esta última, a jovem terapeuta, foi a que mais conseguiu progressos. A criança na maioria das sessões permanecia em silêncio com o olhar vago ou pedia para que pudesse ler um livro. Há pouco mais de um mês, os pesadelos e os ataques de fúrias diminuíram.

O mundo da pequena era silencioso, sem sorrisos ou brincadeiras, isolava-se na maior parte do dia entre o quarto ou a enorme biblioteca da casa. Raras eram as vezes que passeava pelo jardim e quando o fazia, era após muita insistência de Bernard.

— Olá. Vi que acordou mais tarde hoje, dormiu melhor? — ele perguntou ao entrar no quarto. Este havia sido preparado para sua chegada, as paredes foram pintadas em um branco suave, a cama ficou ao fundo próxima à janela de madeira e duas pequenas mesas de cabeceira foram postas em cada lado. Uma destas ficava livre para os livros e a outra tinham flores colocadas todos os dias pelo homem.

— Sim. — A menina loira com olhos azuis acinzentados o encarou, sentada numa pequena rede de crochê em forma de cadeira, com um livro sobre lobos nas mãos.

— Que bom — respondeu calmo. — Temos um compromisso, você gostaria de ir hoje? — Ele aguardava que a mesma se recusasse como fez na última semana.

— Tudo bem, se você quiser eu posso ir — respondeu com a voz rouca e num tom mais baixo.

— Não quero forçar-lhe, porém gostaria que fosse — pediu-lhe com um olhar carinhoso.

— Está bem. ­­­­

— Vou lhe dar um tempo para tomar banho e trocar de roupa, certo? — Ela apenas concordou com a cabeça e recebeu um sorriso do homem que se virou para sair do quarto.

— Podemos ir à praça? Depois de encontrar a Dra. Anny? — a menina pediu ao balançar as pequenas pernas no ar, ainda sentada na rede.

— Claro que sim — deu-lhe um sorriso, deixando-a sozinha.

Uma hora se passou e ambos chegaram ao consultório da Dra. Anny. A sala com paredes amarelas tinha pequenos quadros em sua extensão, a mobília consistia em um armário de cor escura, um sofá marrom, duas poltronas amarelas, uma bancada colorida com brinquedos e uma mesa branca com dois pequenos bancos azuis. Era um ambiente muito espaçoso.

Ao serem convidados a entrar, a terapeuta se levantou de sua cadeira e deixou na mesa de escritório as anotações que fez sobre o último paciente atendido. Foi ao encontro do pai com a filha.

— Bernard, que bom que vieram hoje! — estendeu a mão para o homem.

— Oi Dra. Anny, acho que essa garotinha nos deu uma chance hoje — disse ao apertar os ombros da criança que olhava para todos os lados da sala.

— Olá, menina linda! Sente-se melhor hoje? — perguntou ao se agachar para ficar na altura da criança e assim conversarem melhor.

— Sim.

— Vejo que seus olhos estão menos inchados, você está dormindo melhor? — perguntou a psicóloga e recebeu um aceno positivo.

— Podemos começar? — estendeu seu braço para tocar a pequena mão que a aceitou e juntas caminharam até uma das poltronas amarelas, onde a ajudou a sentar. Ela caminhou para a poltrona oposta para que começassem a sessão.

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