Um galho mais baixo de repente se mexeu, envolveu o peito do homem como um tentáculo e o puxou para suas folhas. Os outros sacaram as armas e abriram fogo contra a árvore, sem nenhum efeito além dos buracos de bala no tronco sangrarem. Toki começou a gritar.

Mikoto correu para baixo da árvore, rapidamente identificou o galho que agarrara Toki e espetou a lâmina da naginata, empurrando cada vez mais até que o soltasse.

O galho, quase arrancado, ficou pendurado por umas poucas fibras, e os outros arrastaram Toki para longe. Sua barriga sangrava por um profundo ferimento de perfuração.

-- Levem-no para receber primeiros socorros! Depressa! – Kurono ordenou e outros dois tiraram o ferido do templo.

-- Mikoto! Saia daí! – Takako gritou ao notar outro galho indo em sua direção.

Mikoto se abaixou e sentiu o deslocamento de ar acima da cabeça. Assim que o galho errou o alvo, ela correu de volta para junto dos outros, todos agora mais afastados da planta youkai.

Takako parecia prestes a explodir de indignação.

-- Uma jubokko plantada em nosso solo sagrado – sibilou – Temos que destruí-la agora mesmo, começando por queimar o tronco e as folhas, depois arrancaremos até a última raiz desse chão. Lembrem-se de ficar a uma distância segura.

-- Gente, olhem aqui – Hiro, primo de Yukio, mais alto e corpulento, encarava os troncos ressecados no chão. Os outros se aproximaram também, e todos que olharam ofegaram de susto.

-- O que foi? – Mikoto se deixou levar pela curiosidade e chegou mais perto também. Seu estômago se contorceu ao ver que não eram troncos secos, mas cadáveres humanos.

-- Parecem mumificados – Kurono murmurou.

-- São as vítimas da jubokko. Tiveram todo o sangue drenado – Takako segurou os ombros de Mikoto e a guiou para longe – Vamos, ao trabalho!

Todos começaram a se mobilizar, desenharam uma linha com giz ao redor da árvore vampira para delimitar a distância mínima segura, e algum tempo depois mais pessoas chegaram, munidas de lança-chamas.

Mikoto observou absorta os primeiros jatos de fogo disparados contra as folhas, e teria ficado para assistir ao restante do espetáculo se Takako não a tivesse puxado para longe, sob a alegação de terem "outros assuntos para resolver".

-- Voltaremos aqui quando a jubokko estiver morta e arrancada, para restaurar o templo – explicou ao descerem a montanha, e após uma pequena pausa, comentou – Você fez uma bela cena com a sua naginata, estou impressionada, não tinha demonstrado toda essa atitude ainda.

Mikoto encolheu os ombros, constrangida, mas ao mesmo tempo um tanto orgulhosa. Também não esperava tanta coragem de si mesma, talvez porque nunca experimentara uma quantidade de adrenalina como nos últimos dias.

Ela estava com Takako e Kurono quando Sayuri voltou ao Genbu horas mais tarde, acompanhada pelo príncipe Shin, e a expressão dos dois não trouxe esperança de boas notícias. Ao falar com o rei novamente, Sayuri contou sobre o que Yasha fizera em Aka e a ameaça que ela representava, mas ele não quis acreditar.

-- Shin veio me apoiar, mas nem isso adiantou.

-- Meu pai me chamou de traidor – o rapaz tinha os ombros encolhidos ao falar – Ordenou que eu voltasse para casa só quando eu entendesse o que ele está fazendo. Acho que a qualquer momento ele vai ordenar um ataque, Aka vai ser invadida.

-- Não, não vai. Acabei de enviar um e-mail ao imperador avisando sobre tudo, e recomendei que enviasse tropas para reforçar as defesas de Aka – Takako calmamente fechou o notebook que apoiava no colo.

-- Vocês têm o e-mail do imperador? – Shin indagou. Sayuri assoviou impressionada.

-- Você é rápida, prima. E eu pensei que fui competente quando pedi ao clã que investigasse a Yasha e a tal família de invocadores de youkai – ela deu um sorrisinho. Takako ergueu uma sobrancelha.

-- Quando você fez isso?

-- Um pouco depois de deixarmos Aka. Aquela história soou estranha para vocês também, não é?

Mikoto e Takako concordaram. A mais nova comentou:

-- Eu nunca ouvi falar de algo assim.

-- Acho que nenhum de nós – Kurono adicionou.

-- Por isso, quando tivermos a confirmação que não existe, poderemos desmenti-la e provar a Ayahito as reais intenções dela.

-- Não sei se adiantaria, mesmo que provassem que ela é uma enganadora – Shin olhou para baixo com desânimo – Meu pai está tão obcecado com a ideia expansionista que acho que seria capaz de continuar mesmo sem ela. Yasha o mudou demais, e não sei se vocês podem trazê-lo de volta.

-- Tem razão, nós não podemos – todos os olhares se voltaram para Takako – Tudo o que podemos fazer é tentar evitar essa guerra, mas trazer seu pai de volta é um trabalho seu.

O príncipe olhou para ela com a boca entreaberta, sem saber o que responder, e só alguns instantes depois conseguiu articular, meio sem jeito:

-- Sim, é verdade, me desculpem.

-- Ei, já que não tem lugar para ficar, podia dormir aqui – sugeriu Mikoto – Na cabine dos meninos, eu quis dizer.

Shin aceitou, agradecido, e seguiu para lá. Novamente sozinhas, Takako planejou o que fariam a seguir:

-- Logo de manhã faremos a cerimônia de purificação e refaremos a barreira do santuário. Depois é melhor partirmos.

-- Aonde vamos? – Mikoto perguntou – E vamos deixar o Shin sozinho aqui?

Foi Kurono quem respondeu:

--Se ele pensar bem, virá conosco. Ao não é o lugar mais seguro para ele agora.

O Conto da Donzela do SantuárioOnde histórias criam vida. Descubra agora