Daniel

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Salvador, 22 de Março de 2000

Geralmente, eu escrevo cartas para as pessoas que eu quero esquecer.

Isso ajuda.
Ajuda a superar.

Uns correm e se afogam em suor, outros bebem e se afogam em álcool.

Eu escrevo e me afogo em palavras.

Menos com você.

O que é totalmente injusto porque você é tudo o que eu preciso esquecer.

Nem uma frase eu fui capaz de terminar. Até agora.

Na verdade, é mentira. Eu me recordo de apenas uma carta destinada a você que eu completei - a única - com o peso de uma culpa que eu me auto sentenciei a carregar.

Mas agora, que a quebrada sou eu, não sei como escrever com o que me resta. Já não é minha culpa que eu preciso carregar - é a sua memória.

O que devo fazer?

Como supero você?

Quando pára de doer?

Minha cara já está ensopada de lágrimas e recordações e ainda assim, não consigo colocar o adeus. Nem me despedir consigo porque eu sei que quando a tinta secar e as lágrimas borrarem a folha e os meus sentimentos, você vai estar a meio delas, como sempre, me salpicando com dor e demasiado presente dentro e fora de mim para que eu me consiga resguardar.

Você me destruiu.

Li um livro da Colleen Hoover. Provavelmente você nunca o leu. É assim que acaba. Nele, Lily, a protagonista da história, se apaixonou por Ryle, um cara aparentemente quase perfeito, e continuou amando ele mesmo depois dele a magoar. Ela havia se prometido fugir ao primeiro sinal, desde nova. Mas ela não o fez.

Me vejo em Lily.

Eu fui a Lily.

Eu amei tão profunda e dolorosamente quem me destruiu, como a Lily (ou quase).

Eu achei que tudo ia acabar bem.

Não acabou.

Foi assim que acabou.

E ainda assim, quem tem que descobrir onde e como catar os caquinhos que você espalhou mundo fora, junto com suas mentiras, sou eu.

Não sei onde os encontrar porque eles estão em lado nenhum e em todo o lado, como você.

Eu me perdi totalmente quando te "perdi", "Daniel".

Me diga, quem é você afinal, "Daniel"?

Porque meu você nunca foi.

Nem de você mesmo.

Sabe o pior? Essa carta parece destinada a alguém que morreu - o que tem a sua graça, já que você mal existiu.

Ainda assim, penso que seria menos doloroso se assim fosse.

Até já.

Eduarda.

Chegaste ao fim dos capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Mar 22, 2020 ⏰

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