Epílogo

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vagando pelo meu coração acelerado e pelos labirintos da minha mente, ele está em mim. eu quero navegar nas ondas alvoraçadas da vida dele, me sentir perdida no olhar dele, construir pontes que nos conecte para as estrelas, colar a pele dele na minha e nunca mais perdê-lo entre as linhas das páginas em branco da vida.

quando eu ouço a voz dele, eu sinto os meus ossos se rompendo um por um, o meu pulmão perde a capacidade de respirar, há um véu negro que me asfixia, o meu coração se transforma num rubi sendo apertado por uma mão que o faz derreter, gotas de sangue tingem o chão fosco, a minha alma rompe a minha pele, reluta e me leva ao êxtase, eu me sinto fora de mim e perco a voz, fico totalmente muda, como se nunca tivesse aprendido a falar. tudo se apaga, eu vejo a escuridão dos meus olhos fechados e sinto uma energia calorosa e terna caminhar pelo meu corpo repousado à cama, eu te escuto a gritar dentro de mim.

eu vejo o meu amor por ele transbordar, formar um horizonte de luz e explodir pelos meus poros. no amontoado das nossas futuras fotografias, congelaremos momentos e desenharemos duas linhas pelos nossos corpos que percorrerá pés, pernas e barriga, contornará o coração, trilhará um caminho até os nossos pulsos e nos ligará pelas mãos, suadas e frias de tanto nervosismo.

depois de muitos anos, quando tu resolveres procurar pelas chaves do passado, verás em nossas fotos que o tempo se encarregou de colocar rugas ao redor dos nossos olhos e de apagar o tom castanho dos nossos cabelos

então, neste momento, eu terei toda a certeza que fomos felizes juntos. pois nós poderemos sorrir lembrando do agora, que será passado, e, todas as lágrimas não existirão mais, porque saberemos que a insegurança, que hoje arranha as nossas bochechas, como espinhos de uma rosa, se esvairá e tudo se concretizará num amanhã mais próximo.

meu amor, depois de muitos anos, enquanto eu estarei a regar as flores no jardim, se tu estiveres sentado à mesa, encarando o azulejo da cozinha, brincando com os próprios dedos e cansando-se da velhice, se tu sentires um vazio e isto guiares-te para o pensamento de que a terra já apagaste a chama da vida de cada familiar teu que faleceu, e, agora só lhe resta a solidão, não se engane.

por favor, quando chegarmos a longos anos prateados de vivência, que estaremos um ao lado do outro, não penses que um terremoto está a derrubar milhões de dilemas em nossas cabeças, porque eu estarei aqui para te abraçar e te aquecer, basta fechares os olhos e rodear a minha cintura com os teus braços, eu vou me sentir abrigada e segura, eu sei que irei.

quando as circunstâncias pesarem o teu coração, abra a boca e me deixa ouvir tudo que está armazenado aí dentro, eu passaria milénios só querendo ouvir a tua voz continuamente. és único, como o vai e vem das ondas do mar.

como eu te quero, eu sempre te quis, antes mesmo de te conhecer, eu comecei te amando profundamente. e as fitas do amor se juntaram e atravessaram o céu do entardecer, elas explodiram e giraram, como as rodas de uma bicicleta em movimento.

com uma rede de caça, eu continuo a apanhar as estrelas e a plantá-las pelo caminho que vamos trilhar, agora elas deixaram de iluminar a escuridão do céu e iluminam o centro das nossas almas, mantendo-se acesas, mesmo com esta ventania que varre sensações. os meus olhos sempre brilham por ti e as centelhas desta chama se perdem pelas raízes que constituem a nossa conexão mútua.

quando abri as gavetas das passagens, encontrei groselhas, escarlates e suculentas, implorando para serem libertadas pelo abrir daquela caixa de madeira sintética. a minha paixão por ti é imensidão percorrida nos trilhos por um trem de faróis acesos, adentrando na neblina da madrugada e na fria neve que desce pelo mundo, livre, como andorinhas a desenhar o amanhecer no céu alaranjado.

ele é a minha força, como vitaminas que percorrem o meu organismo, como os anticorpos que defendem a minha alma e como as plaquetas que fluem a essência da vida nas minhas veias, ele é o meu sol, um raio quente e acolhedor que me ilumina por inteira.

os frutos da groselha continuam a nascer, eles se fortificam, assim como o meu amor por ti, quando eu me deito na cama, pensando em ti, eles me abraçam. eu te sinto aqui, mesmo que esteja mais distante de mim.

vamos entrelaçar a nossa poesia e nunca deixarmos de sonhar um com o outro. sim, sempre estás aqui: no motivo das minhas lágrimas, na curva do meu sorriso e numa infinitude de detalhes.

e, se este livro cair nas tuas mãos, como uma velha pena azulada desprendida do corpo de um pássaro, tu saberás que cada palavra era para ti, porque verás o brilho dos desejos finitos e sentirá as emoções a correr diante dos preciosos diamantes vivos que são os teus olhos. tínhamos esperança de tecermos a nossa história eterna.

mas, hoje deixamos tudo se perder no passado. as mudanças regem o nosso destino, e, mesmo que tenha dor, eu ainda prefiro que seja assim. apenas escolhemos a melhor opção, na verdade, foi a única.

e, se não tivesse acontecido tudo como aconteceu, se tu fosses diferente, só queria que soubesses que, novamente, eu faria tudo de novo, mudaria algumas atitudes minhas e lutaria mais por ti, só para estar contigo durante todos verões e invernos em que eu viver nesta terra.

sobre as reviravoltas da vida e a capacidade de relembrar.

Mayara Orcelino.

Para o homem borboleta-azul que vive na colina do outono estelarOnde as histórias ganham vida. Descobre agora