⭒CAPÍTULO TRINTA E CINCO⭒

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Depois que cheguei do colégio passei a tarde com a cara nos livros e preciso me apressar porque estou atrasada pra sair com o meu pai, me encaro no espelho passando a mão pelos fios bagunçados que insistem em ficar me importunando. Desisto e bufo de raiva saindo do quarto pra encontrar com o meu pai e quase caio no meio da escada com a minha pressa, mas consigo equilíbrio.

─ Você está linda. ─ O mais velho deixa a xícara em cima da pia.

─ Está mesmo. ─ A minha mãe sorriu beijando a minha testa com carinho.

─ Obrigado. ─ Abri um sorriso tímido.

É tão bom ter de volta essa sensação boa que é chegar e ver os dois juntos no mesmo cômodo, depois de alguns anos parece que os meus pedidos por fim foram realizados. 

Me despeço da tia Helena e do Dani que estão assistindo uma série norueguesa na televisão. A minha mãe pede para que o meu pai não volte tarde e percebo o brilho nos olhos da mesma quando ele beija a bochecha dela antes de entrarmos no carro. Coloco o cinto de segurança enquanto aperto o botão automático para levantar o vidro da porta e abafar o vento frio. 

A música que toca na rádio no começo é tranquila e me faz sorrir cada vez mais. O meu pai sempre gostou de ouvir as músicas dentro do carro em um volume agradável que o faça cantar no mesmo tom que o cantor e bato de leve a mão na perna conforme a melodia. 

Por um tempo só observo o meu pai sorrir cantando todas as músicas e de vez em quando finge que a própria mão é o microfone, solto várias risadas cantando junto no mesmo tom. É tão divertido que não consigo parar de sorrir, tenho vontade de abrir a janela e cantar pro mundo todo ouvir.

Faço a mínima ideia para onde estamos indo e só sei que quero gravar cada momento porque estar com o meu pai é como se a qualquer dia o mesmo possa ir embora mais uma vez. Não estou pronta pra me despedir, mas ele tem uma responsabilidade no Brasil.

Ele parou o carro no estacionamento de um prédio. Ao descer do automóvel sorrio feito uma boba reparando em cada pessoa elegante que passa por nós e fico curiosa do lado do meu pai.

─ Senhor Gonzáles, seja bem vindo! ─ O cara alto de terno sorri com elegância enquanto nos entrega um panfleto.

─ Obrigado. ─ Sendo simpático o meu pai responde enquanto me direciona para dentro do local. 

Passamos por um tapete cor de marfim seguindo um corredor completamente espelhado nas paredes. Nos aproximamos e conseguimos ouvir uma orquestra tocando lindamente, não sei explicar, mas foi incrível a sensação que senti ao ver tudo. Mantenho os meus olhos vidrados a cada movimento de cada pessoa e em toda parte que a exposição pode me oferecer.

O meu pai sorri e pega na mão das pessoas que param para conversar, todos sorriem como se já me conhecessem e ouço todas as frases típicas:

"Seu pai fala muito de você!"

"Como você cresceu!"

"Está tão bonita!"

E a que me surpreende mais é a "Você deveria seguir com a carreira de estilista do seu pai"

Não sabia que o meu pai falava dos meus desenhos e tenho que confessar que puxei o lado artista dele quando se trata de inventar modelos novos.

Esse lugar parece mágico, sempre quando andamos mais um pouco fico admirada com tamanhos quadros lindos de vários artistas e o meu velho sempre sabe o nome dos artistas sem precisar ler na placa prateada em baixo. 

─ Esse você sabe? ─ Paro em frente para impedir que leia.

─ Esse é o do Salvador Dalí. ─ Responde tranquilamente tentando fazer suspense. ─ Se chama Persistência da Memória e é uma pintura surrealista de mil novecentos e trinta e um. A pintura original está localizada na coleção do museu de arte moderna de Nova Iorque desde mil novecentos e trinta e quatro 

 Querida, pequena vida. #1 ꪜ Onde as histórias ganham vida. Descobre agora