Capítulo XI - Guerra Santa

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Alugar o carro foi fácil.

Tanto dinheiro vivo na mão até gera desconfiança, em tempos de pagamento digital, mas, ninguém recusa dinheiro fácil e garantido. Quando saímos da locadora, graças à burocracia, já havia passado das sete da noite. Seguimos a discreta avenida até o fim, mas, antes que terminássemos esse segmento do nosso trajeto, aconteceu um blackout.

De repente, o breu era tão absoluto que só víamos o que o farol dos carros iluminavam, fosse o nosso ou os demais que vinham ocasionalmente no sentido inverso. O céu, com grossa camada de poeira e fuligem da capital industrial do país, não deixava a luz das estrelas ou da lua passar. Michelle foi obrigada a desacelerar o veículo, para evitar acidentes fatais.

No caminho, a vista apurada dos vampiros acostumou-se mais à escuridão, e foi possível notar melhor o que acontecia à sua volta. Na frente de uma igreja evangélica neopentecostal, um homem gritava coisas como "Morte aos vampirooooossss!!!", e dava tiros para o alto. Não foi difícil notar que o atirador, animando dezenas de pessoas com as palavras de ordem, ostentava uma arma com uma mão, e uma bíblia com a outra.

Em outro ponto, viram pessoas com tochas improvisadas nas mãos, em procissão, com uma imagem de alguma nossa senhora... ou outra santa. Emílio não sabia ao certo qual a santa, e não fazia questão.

Pararam em um posto de combustível com lojinha de conveniência. O tanque estava pela metade, então Eva mandou completar o combustível. Segundo o controle do painel, vinte litros seriam suficientes. Enquanto abastecia, ela entrou no posto de conveniência e comprou um cartão telefônico. Saiu, e foi pagar ao frentista pelo combustível, mas, ele lhe deu o preço de trinta litros. Eva ficou indignada! Já ouvira falar desse golpe: alguém havia adulterado o medidor da bomba. Mas, eles não podiam chamar atenção, então Michelle pagou, e tirou o carro de junto da bomba, estacionando-o perto da lojinha de conveniência. De frente para o carro, havia um telefone público, um orelhão bastante mal cuidado, severamente vandalizado, mas, que ainda funcionava.

— Hello! — alguém atendeu em inglês.

— Вы знаете анекдоты про попугаев?

— Ничего не стоит рассказывать.¹

Ok. Estava seguro. Ela poderia prosseguir.

— Ulfur Björnsson snälla.

— Ett ögonblick tack.²

Eva esperou, mas, preocupada. Ligações internacionais não duram muito no cartão telefônico. Mas, não demorou, e uma voz profunda falou um francês com sotaque grosseiro.

— Michelle? Ça va bien?³

A conversa que se seguiu foi toda em um idioma nórdico arcaico, com expressões esparsas em francês, mas, você lerá uma tradução livre para o português.

— Tão bem quanto é possível. Estou viva e sem ferimentos. A Ordem está acompanhando os últimos acontecimentos?

— Sim, estamos. — havia algo de plácido na fala de Ulfur — Sabia que nossa paz poderia ser ameaçada um dia, mas, após mais de dois séculos de paz... como esperar que explodisse algo tão violento assim?

— E agora é pior. O que está sabendo sobre o que já aconteceu até aqui?

— Soube da infeliz série de eventos que desembocou nesse conflito que a ninguém servirá... Lionel vampirizou um jovem quando deveria ser executado e você interveio, impedindo a execução. A Acção atacou nossa sede sul-americana, você está fugindo desde então, e vídeos feitos repletos de ódio, executando nossos irmãos, estão motivando levantes de total histeria mundo afora.

Um Vampiro [conto inicial]Where stories live. Discover now