Aqui, todos me conhecem, todos conhecem meu rosto antigo, aquele rosto cheio de dor, desespero e desilusão, um rosto encovado, com olheiras profundas e olhos enormes e sem vida. Eu não sabia que meu rosto e principalmente meus olhos estiveram em capas de revista e jornais por meses, não sabia que era considerada um tipo de heroína apenas porque fiz aquilo que qualquer um faria no meu lugar, em completo desespero.

Foi muito estranho ser recebida pela polícia no aeroporto e ser escoltada até o hotel. Apenas 6, contando comigo, das 12 que saíram daquela casa estão aqui.  Duas estavam muito doentes e não resistiram, duas não suportaram voltar para o mundo real e lidar com suas dores e acabaram com a própria vida e outras duas não conseguem sair na rua.

Não sabia de nenhuma dela desde aquele dia, evitei qualquer procurar sobre minha vida passada, só queria deixar tudo para trás e seguir em frente, não podia ajudar nenhum delas quando eu mesma precisava de ajuda até para sair no quintal.

Mas agora sentada nessa poltrona, olhando pela janela do hotel, olhando as montanhas altas na noite escura. Não consegui dormir depois que soube das outras garotas, fico pensando que talvez, só talvez, se tivéssemos mantido algum tipo se contato poderíamos ter nos apoiado. Só quem entende o que passamos somos nós mesmas, só nós podemos compreender o que a outra passou.

- Cami? - a voz de KJ no escuro me assusta um pouco e pulo em meu lugar - vem pra cama.

- Não consigo dormir. Fico pensando ... - não término a frase.

Escuto o farfalhar dos lençóis e o rangido fraco da cama quando Kage se mexe. Fico com receio que o barulho acorde Lukas, mas não consigo protestar. Abraço meus joelhos mais apertados e olho para fora, sinto a presença do meu namorado antes mesmo dele estar perto o suficiente.

- Angel, olha pra mim?! - eu quero, mas não consigo desviar meus olhos do escuro lá fora - não faz isso ... Olha pra mim. Preciso que olhe para mim. - suas palavras me despertam um pouco e olho em sua direção, Kage está agachado a minha frente - isso ... Olha para mim. Cami, por mais que você pense que poderia ter feito algo para salvar aquelas garotas, não podia. Você fez o que pode e tirou todas vocês de lá, o que aconteceu depois tem muito mais a ver com quem elas eram.

- Talvez se ....

- Não, baby. Não tem talvez nesse caso. Você era a com mais tempo presa ali, e a responsável por tirar todas de lá. Mas não podia consertar elas, você mesma estava quebrada em mil pedaços que precisaram ser colados. Mas você é a garota mais forte que eu conheço, você tem o maior poder de superação que já vi em toda minha vida. Talvez elas só não tivessem o que era necessário para sobreviver. Você não sabe o que vivia dentro delas, ou como elas lidavam com tudo que perderam, ou como foi a vida delas depois que saiu ... Você não era responsável por elas, baby.

- O mundo falhou com a gente, Kage, as pessoas falharam conosco. Lá dentro e aqui fora, fomos colocadas a nossa própria sorte, nos deram muito dinheiro e nenhum apoio. Mas eu podia ter apoiado elas.

- Não podia, baby, cada um tem que lidar primeiro com a sua dor para depois ajudar os outros. Não foi isso que o psicólogo disse?

- Sim. - murmuro e solto minhas pernas para poder esticá-las um pouco - mas é tão difícil seguir em frente ... Foi tão difícil voltar ao mundo onde todas as pessoas tinham vidas menos eu.

- Eu sei, estava lá. Vi você em pânico, apavorada, vomitando, tremendo ou dopada de remédios. Mas também te vi levantar e seguir em frente. E tenho um orgulho sem tamanho de você, e eu te amo por todas essas coisas. - percebo que estou chorando quando Kage limpa uma lágrima em meu rosto - saia dessa armadilha, ok? Você não podia fazer nada. Eu preciso de você, Cami, o Lukas precisa de você.

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