Cap. 12: "A"

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Encarar o teto do quarto foi a melhor coisa que consegui fazer depois daquela ligação. Hide, sem dúvidas iria fazer o de sempre: chorar escondido no banheiro. Era o que sempre acontecia. Lembro-me de uma vez que eu precisei sair correndo de casa, estava com meu pai. De alguma forma eu pressenti que algo estava acontecendo. Hideki precisava de ajuda. Eu estava certo.

Quando cheguei em sua casa, o silêncio nos recebeu como uma melancólica canção de dor e morte de espírito. Eu chamei, clamei por Hideki e nada. Tudo que eu conseguia receber como resposta aos vocativos, era a gargalhada debochada do silêncio.

Procurei por toda casa, meu pai ficou na sala. Ele sabia que nessas horas, o único que deveria entrar no campo de batalha era eu. O motivo? Hide é ríspido e impenetrável em seus momentos de vulnerabilidade psicológica e, se quiser ajudar, é bom que você seja alguém que ele confie, caso contrário, receberá as mais carinhosas ofensas que ele direciona àqueles que se intrometem na vida alheia. E, se há algo cujas consequências não são medidas por ele, é ofender.

Procurei por todo recinto - que era bonito, diga-se de passagem. Tinha três quartos, um banheiro, a cozinha, a sala de estar e a sala de jantar. Dois dos quartos tinham o mesmo tamanho, porém cores e estilos diferentes. No quarto de Adrian, o que pairava nos olhos eram paredes pintadas com cores frias, uma cama com coxas de algodão e desenhos que remetiam a rebeldia e a violência e, se fosse mais a fundo, seria possível encontrar algumas trouxinhas de drogas. Apesar de tudo, aquela praga era muito bem organizada. Entretanto, duvido que seja por puro prazer de ver tudo em seu devido lugar.

O quarto de Hideki era branco com detalhes verdes nas paredes, adornado com posters de Rock Lee, Jack Chan e de outros astros das artes marciais que eu desconhecia. Ademais, era possível vislumbrar uma estante abarrotada de troféus, medalhas e todos os tipos de premiações voltadas à luta e às artes marciais. Meu amigo era um gênio.

Não entrei no quarto dos pais, sabia que a mãe deles estava dormindo, não ousaria acordá-la. Os demais cômodos eram bem mais simples, cozinha e salas de estar e jantar convencionais.

Ao passar pelo corredor que levava ao banheiro, ouvi os barulhos da água do chuveiro. Ele estava lá! Acelerei o andar.

ㅡ Hideki! ㅡ ao adentrar pela porta entreaberta chamei, o box estava fechado. Abri com certa ferocidade, consequência do desespero. Como o esperado ele estava lá, ensopado, com as roupas encharcadas, as lágrimas misturadas com a água que caia veemente do chuveiro, as gotas eram como chicotes rechecoteando. Não suportei aquilo. ㅡ Vem aqui cara... ㅡ Peguei uma toalha e o puxei para fora do box - servi de apoio para que os passos fracos saissem do banheiro. Silêncio.

Saí do quarto e esperei ele se trocar encostado na parede, com as mãos nos bolsos. Depois de uns dez minutos a porta se abriu. Lembro-me de ter descido e pedido para meu pai ir embora nesse intervalo. Hide estava com os olhos marejados, me encarou por um instante e deu espaço, com as mãos na cintura, para que eu passasse. Ele cuspiu uma respiração feroz e bateu a porta.

ㅡ O que aconteceu? ㅡ Comecei.

ㅡ Adryan tentou me matar. ㅡ Curto e grosso. Aquelas palavras me fizeram engasgar. Para mim era a primeira vez que ocorria, mas ao avaliar a situação agora, penso que aquela foi a primeira vez que eu ouvi. Meu corpo perdeu a sustentação e eu caí sentado na cama.

ㅡ Você foi denunciá-lo?

ㅡ Acha que isso vai adiantar?

ㅡ Vai esperar ele fazer de novo? ㅡ O encarei com descrença.

ㅡ Mato ele na próxima.

ㅡ Na próxima? ㅡ arqueei uma sobrancelha. - Vai esperar uma próxima? ㅡ Hideki deu de ombros.

Sua verdadeira face: As aparências realmente enganam...Onde as histórias ganham vida. Descobre agora