Capítulo Dois

3.2K 162 24
                                    

Dias se passaram depois da minha prova e já era possível encontrar os primeiros vestígios da decoração de Natal da cidade. Não era típico dos moradores enfeitarem todos os cantos nessa época do ano, porém, esse ano algo estava mudado e a avenida principal já estava toda iluminada e era lindo passar por ela todas as noites. Como eu estudava no período noturno, eu passava por ela todos os dias com minha bicicleta e voltava também. Vivia com meu fone no último volume e corria, sentido o vento atravessar meu corpo e as luzes correndo ao meu redor. Por um bom tempo eu fui inocente o suficiente para achar que aquela era a melhor sensação do universo. Já que não nevava aqui, quer sensação natalina melhor do que se sentir no meio das luzes de Natal? Sim, quero sim. Ter a sensação de encontrar o Bernardo novamente. 

Depois daquele dia, assim que cheguei em casa eu fiz questão de me deitar, fechar os olhos, colocar qualquer música bonitinha para tocar e lembrar dele. Sim, eu fiz isso! Já estou aberto para receber julgamentos. Lembrar do perfume com cheiro de madeira e do sorriso lindo. Eu tenho que contar para vocês que sempre meio que tive uma queda por sorrisos, e isso é atual até hoje. Mas essa provavelmente era mais uma daquelas quedas que eu tinha por diversos rapazes regularmente. Não podia ver uma pessoa legal, e assim que ela trocava uma palavra comigo, eu já achava que estava gostando dela e ficava em crises de paixão por dois, três dias, caso não voltasse a vê-lo novamente. E eu sabia que esse caso com o Bernardo não poderia ser diferente, mesmo já passando quase dez dias da prova. Algo estava diferente sim. Quando eu voltaria a ver ele de novo? Passei dezessete anos da minha vida na mesma cidade que ele e nunca nos vimos. A probabilidade de nos revermos era mínima, vamos combinar.  E outra, quem eu era para afirmar que ele gostou de mim também? Ele só pediu uma borracha. Acorda João, a vida não é assim. Move on. Saltei quase três metros de altura enquanto alguém tentava arrombar a porta do meu quarto.

— Vai ficar nesse quarto o dia todo ou vai descer para o almoço?! Vamos queridinho! A comida não vai ficar te esperando não! — era possível ouvir minha mãe quase quebrando a minha porta com alguns tapas. Ela era tão delicada que nem consigo explicar.

— Já estou indo mãe.

Chequei meu celular uma última vez para ver se tinha alguma novidade. Havia uma mensagem de um amigo perguntando como fora a prova. “Tava tranquilo, acho que passei.” Enviei e desci para o almoço.

Almocei em dez minutos no máximo — geralmente eu almoçava mais devagar, mas estava sem fome, era um efeito passageiro de estar levemente apaixonado, que duraria no máximo três dias.

— Hoje vamos ao centro da cidade! — meu pai afirmou enquanto eu me levantava. — Vamos ver a decoração de Natal, então não se atrasem porque não vou ficar esperando muito tempo, estamos entendidos?

Concordei e voltei para o quarto. Duas mensagens novas. Ambas da Isabella. Isabella era uma das minhas melhores amigas. Nos conhecemos em 2009 pela Internet quando foi lançada a série The Vampire Diaries, e éramos loucos por ela. Depois de um tempo descobri que ela era da minha cidade e desde então nos vemos todos os finais de semana. Somos quase inseparáveis. Ela queria me ver naquele sábado a noite, e eu também, porque não estava nem um pouco afim de ir com meus pais ver qualquer decoração de Natal. Nada contra quem sai para ver decoração de Natal, eu particularmente adoro. Mas sozinho ou com um amigo ou algo do gênero. Respondi dizendo que sim e iria encontrar ela no Casablanca, um bar famoso aqui da cidade. Chamei a Bruna para ir também, minha outra melhor amiga. Conheci ela há pouco mais de um ano e parece que nos conhecemos há décadas. Se eu namorasse meninas poderia dizer que ela era minha alma gêmea. Brubu, Casablanca hoje, às nove, fechou. Enviar.

O tempo parecia se arrastar, e quando eu achava que já estava na hora de começar a se arrumar, ainda eram seis da tarde. Horário de verão é algo que incomoda a gente. E engana também. Liguei meu computador e fui assistir minhas séries que estavam pendentes e quando vi já eram oito e vinte. Maravilha. Ou está muito cedo, ou está muito tarde. Essa era minha vida.

Corri para tomar banho e sai de casa. Fui a pé até o Casablanca, pois não era muito longe de casa. Cheguei lá era nove e vinte e três e nenhuma das duas estava lá. Fiquei lá fora esperando elas chegarem. Era um sábado à noite, provavelmente uns 28 graus e eu estava com uma calça Skinny, uma camiseta branca com uma estampa da Lorde e um Vans preto. Como era um bar destinado para o público mais jovem, era possível ouvir músicas que eu adorava tocando ali dentro. Naquele caso em especifico, estava tocando Pumped Up Kicks, do Foster the People. Eu amava aquela música e me peguei me movendo ao som da música ali na frente do bar quando fui parado.

— E aí João! — Demorei uns segundos para me localizar e parar de dançar involuntariamente. Bernardo? É você?, pensei. Era ele sim, acompanhado de dois meninos e uma menina. Todos pareciam bastante à vontade e estava só de passagem pelo jeito. A menina baixa, loira, com olhos castanhos e eu short bastante curto. Os dois meninos pareciam irmãos, altos, com cabelos castanhos e um com uma camiseta do Rolling Stones e o outro com uma do X-Men. E por fim, Bernardo. Com Jeans, o mesmo All Star da prova e uma camiseta vermelha. Ele estava impecável para qualquer que fosse o lugar que ele estava indo e eu já queria acompanha-lo.

— E aí! Como você está? — tentei falar mas minha voz acabou tremendo um pouco. Esse sou eu na tentativa de um flerte bem sucedido. Tentativa.

— Eu estou bem e você? Fazendo o que sozinho aqui uma hora dessas?

— Esperando umas amigas, e você? Indo para onde? — os amigos dele me olhavam de um jeito diferente. Um jeito que dizia: para de falar que a gente ta com pressa! Mas eu não me importava muito. Enquanto houvesse evidencias que o Bernardo queria falar comigo, eu ficaria ali para falar com ele. Muito obrigado, de nada.

— Vou para um show de uma banda de um amigo nosso, algumas quadras para baixo.

— Ah sim. Entendi.

— Se quiser dar uma passada lá depois que sair daqui, fique à vontade, estarei naquela região.

Senti uma leve brisa passando entre nós e senti o perfume dele novamente. Sei que era a segunda vez que estava vendo ele na minha vida toda, mas queria largar tudo para trás e ir com ele aonde quer que fosse. Passar aquele sábado à noite com ele, e com mais ninguém. Poder conversar com ele e fazer crescer uma amizade para quem sabe depois fluir mais alguma coisa. Mas quem disse que eu tinha coragem? Então. Fiquei na minha.

— Vou ver com as meninas. Qualquer coisa te aviso, pode ser?

— Pode sim, mas, acho que você não tem meu número de celular. Tem?

— É... não.

— Então anota aí. Qualquer coisa me manda mensagem, pode ser?

Anotei e nos despedimos. Como eu queria seguir ele para qualquer lugar que ele me levasse. Mas sem estar com os amigos dele, logicamente. Eu queria conhecer mais sobre ele, sobre a vida dele, os segredos que ele guarda, as paisagens que já visitou e quem sabe poder visitar novos lugar com ele. Só de ter visto ele por alguns minutos, o meu sábado já estava ótimo. Nada poderia estragar.

Acontece que já eram quase dez horas e nenhuma das duas havia chegado ainda. Mandei mensagem para elas apressando-as e em poucos minutos elas já estavam lá. A noite fora ótima, ri como não ria há muito tempo, mas não contei a nenhuma das duas sobre o Bernardo. Eu queria encontra-lo, mas permanecer aquele segredo para mim. Queria viver tudo aquilo sozinho por enquanto. Queria tê-lo só para mim, estava cedo demais para dividir qualquer tipo de pensamento que ele fizesse parte, porque aquilo tudo era novidade. Enquanto nada se concretizasse, ele era apenas uma ideia dentro da minha cabeça e do meu coração, e naquela noite eu queria vê-lo. Queria dar uma chance para mim mesmo. Ah, como queria.

Inventei para as duas que estava com sono e que já iria embora. Marcava 00h25 minutos no meu celular. E é claro que minha noite de sábado não poderia parar por ali mesmo. Procurei pelo número dele na minha agenda. Onde você está? Estou a caminho. Te encontro daqui alguns minutos. Enviei. 

Prazer, João.Onde as histórias ganham vida. Descobre agora