Redenção

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        Uma luz bem ao longe chama a tenção de Kosey, ao se afastar um pouco do capô aberto para alongar as costas pra trás. Ele boceja para o céu noturno e então ele a vê.

        - Olha, um avião, será que ele vai mandar ajuda se brincarmos de boneco de posto e gasolina? – e ri sozinho, uma risada desolada.

        - Ai! – exclama Duprat ao bater a cabeça no capô para tentar ver melhor. – Não parece um avião – diz massageando o cocuruto da cabeça enquanto observa a luz analiticamente. – Nem se mexe, alá.

        De fato, a luz parecia imóvel. Eve que percebeu que apontava a lanterna para o céu para poder ver melhor baixou a lanterna novamente para a rua, envergonhada. Ela achou ter ouvido uma ambulância ao longe.

Não. Pera lá.

        - Gente! Tem uma ambulância vindo em alta velocidade! – Exclama uma recém acordada Erika apavoradíssima.

        - Ótimo! Porcaria! – Duprat perde as estribeiras. – Uma mãozinha aqui pra empurrar o carro princesas! – Ele pula pro lado do motorista e empurra com a ajuda dos outros enquanto direciona o carro para o acostamento invisível.

        - Para, para, PARA!!! – Berra Kosey do outro lado vendo o carro indo para uma ribanceira.

        Sem ter mais opções, eles tentam ficar fora da pista e longe do carro.

        A sirene fica quase ensurdecedora e passa. Mas...

        - Porra!!! Porra!!! – Grita Duprat insano – O que foi aquilo?!

        - Eu não consegui ver, só ouvi o som, mas não senti o deslocamento de ar nem nada – Diz Erika de uma forma monótona e estupefata. Ela estava em choque. Kosey, que permanecera calado diz que deve haver uma explicação para aquilo.

        - No mínimo foi histeria coletiva. No mínimo.

        - Hum... não, na verdade não é bem assim que acontece – Eve entra no debate timidamente. – Mas pode ser também, sei lá... – acrescenta rapidamente ao perceber que todos esperavam uma elaboração que ela não estava no clima para dar.

        - Ai meu deus.

Essa foi a frase que Erika materializou do pensamento de todos que olharam para a luz.

                                                                        *

        Sim, ela estava bem mais próxima agora. Todos olhavam fixamente para aquela bola de luz que se movia metafisicamente. Para os lados, pra cima, pra baixo, diagonais... e numa velocidade empiricamente impossível.

        E tinha... tinha o som. Hipnotizante. Algo sonar como o som de baleias. Todos foram tomados de uma curiosidade mórbida.

        Aquilo... aquela paralisia... pareceu ter durado horas. Dias. Uma vida inteira. Foi assim que a luz se aproximou deles. Uma luz de muitas cores, uma luz fria, uma luz ofuscante. Uma luz mortal.

        Kosey. Sim foi Kosey quem saiu do transe primeiro. Foi como sair de uma paralisia do sono, mas continuar com as alucinações. Ele se flagrou pensando nas histórias que sua avó costumava contar dos marinheiros que se afogavam ao bater nas pedras atraídos pela cantiga fúnebre de sereias, ao ver seus amigos balançado com os braços ao lado do corpo, a cabeças jogadas para trás com a boca arreganhada e os olhos... a cara, os olhos! Estavam tomados de branco leitoso assustador. Ele começou chamando-os baixinho... e depois aos poucos sua voz foi ganhando força o suficiente para se sobressair em meio as baleias, as malditas baleias!

        Quando todos estavam de volta a si, a luz se aproximou ainda mais.

        Foi o suficiente para que todos estivessem dentro do carro em segundos. Houve pânico, gritaria. Os vidros se embaçaram e isso só dificultou a visão do lado de fora. Li-Yu gritava freneticamente até desmaiar. Mas não foi percebida em meio a histeria e ao caos. A luz pareceu diminuir. Todos seguraram a respiração e... o que era isso agora?

        - Ai caramba tem gente lá fora, porra! – choramingou Erika esganiçada – eu não quero morrer! NÃO QUERO MORRER!

        O vidro de trás, onde Li-Yu estava desmaiada não fora fechado completamente e não chegou a se embaçar por dentro. Não se via ninguém, contudo... houve uma leve embaçada vinda... adivinha, do lado de fora. Circular. Então sumiu. E voltou. E sumiu

        - Tem alguma coisa respirando ali. – Essa foi a conclusão dada por Kosey. O que não ajudou absolutamente em nada, e em seguida eles ouviram arranhões frenéticos vindo daquele mesmo lado. Todos voltaram a se encolher e a luz que havia se afastado pra longe voltava a uns 50km/h e se ouviu o pior som que se podia esperar naquela situação. O som de uma porta se abrindo.

                                                                      *

        - EVE, NÃO!

Esse foi o pedido gutural feito por Kosey.

        Mas Eve já não mais escutava. Ela não pensava. Via o carro com os amigos se afastando – quando na verdade era ela que se afastava – e quando olhou pra frente, viu que corria em direção à luz, e a luz vinha na sua direção. Eve se jogou de joelhos sem diminuir a velocidade. Foi como um rockstar, sim foi. E a Luz ficou a flutuar a uns 15 metros dela. Eve joga a cabeça para trás e abre os braços, um gesto de redenção. Ela sente que a pequena lanterna ainda está em sua mão direita, e só com os dedos aperta o botão lateral para ligá-la. E faz um movimento brando como que em comunicação. A Luz flutuante parece ponderar alguma coisa. Então ela entende que foi ela quem chamou aquela... aquela coisa. Ela que chamou com a lanterna. Nada mais justo ser ela ali se entregando. Ainda de olhos fechados, ela sentiu algo se aproximar de seu rosto. Todo o som cessou. Ela foi tomada por uma vontade sobrenatural de abrir ou olhos e espiar o que a encarada tão de perto.

        Mas foi então que uma vozinha dentro de si ordenou com veemência.

                                                       Não abra os olhos. Apenas ore.

E ela orou.

Acenda uma luz em mimTahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon