- Gato danado, fazendo essa barulheira de madrugada e me obrigando a me sujar. Vou te levar pra casa, amanhã tentarei arrumar um dono pra você. – Explico ao gato enquanto me abaixo para pegar o celular.

O uivo soa novamente, desta vez não está longe, na verdade está bem atrás de mim, o que faz novamente o arrepio bater as portas. O gato em meu colo mia esganiçadamente em resposta, arranhando-me em desespero e pulando do meu colo.

- Droga. – Xingo sentindo minhas pernas travarem e o suor escorrer. Algo está errado, algo está muito errado.

Ouço algo se mover entre as folhagens, mas não consigo me mover. O ar dos pulmões é difícil de puxar e só consigo me xingar por ter saído de madrugada de casa para socorrer o animal indefeso que tanto gritava e agora emanava essa aura estranha até mim.

Não suporto não saber o que diabos está fazendo o barulho e me mantendo refém daquela maneira. Viro lentamente minha cabeça e meu corpo em sua direção, mas antes que eu possa ver algo sinto uma pata grande e pesada bater contra minhas costas e vou ao chão. O uivo se repete e eu sinto a adrenalina correr por minhas veias e em um gesto de desespero levanto desajeitamente do chão e me coloco a correr.

Mais um uivo dolorido e ressoante atrás de mim, mas não tenho tempo ou energia para me virar e ver do que se trata, eu apenas corro. Meus pulmões ardem ao serem esforçados em tamanho frio, o suor agora junto com o vento cola meu cabelo em meu rosto, tomo cuidado para continuar correndo e ficar firme, mesmo sentindo que talvez minhas pernas vacilem.

Um vulto passa ao meu lado e me seguro para não olhar. Derrapo na grama molhada, escorregando e decido tomar outra direção, talvez correr aleatoriamente não tenha sido uma boa ideia. Eu preciso ganhar tempo e ligar para a polícia, mas onde está o celular? Procuro nos bolsos da camisa desesperadamente até a ficha cair, quando o gato me arranhou para fugir eu esqueci do celular e o deixei lá, no chão.

O desespero começa a tomar conta de todo o meu ser, preciso aguentar ao menos até o dia nascer, não pode faltar tanto tempo, não pode. Corro mais um pouco e derrapo me enfiando em baixo do carro mais próximo, tento controlar minha respiração que sai entrecortada, mas as dores em meus pulmões e em minhas pernas me faz permanecer respirar com dificuldade e audivelmente.

Ouço um barulho próximo e tampo o nariz na hora, tenho vontade fechar os olhos para quem sabe controlar meu corpo melhor, mas a adrenalina não deixa. Grama é amaçada do meu lado direito, e tento controlar um arrepio, minha mente funciona em turbilhão mandando que eu saia correndo dali, mas obrigo-me a esperar.

Sinto os ferimentos em meus braços e joelhos começarem a arder, juntamente com meus músculos que parecem a cada momento mais enrijecidos, tremendo em expectativa ao mesmo tempo que demonstram o quão próximo ao meu limite eu me encontro.

Um uivo similar ao que já tinha ouvido antes corta o ar não muito longe dali, do meu lado outro uivo responde. Meu coração dá um salto tamanho o medo que começo a sentir. Há mais, não importa o que diabos isso seja, há mais. Tento me acalmar antes que desespero me faça fazer algum barulho.

Segundos se passam e não ouço mais nenhum barulho, muito menos consigo ver alguma coisa ao redor do carro onde estou. Talvez tenham ido embora, penso comigo. Aguardo mais algum tempo e como nada acontece sinto segurança em me arrastar para fora. Fico em pé com cuidado, olhando ao meu redor, tentando identificar algo, porém nada me chamou a atenção. Eu sei, que mesmo não os vendo, posso não ter muito tempo, então tenho de tomar uma decisão: corro, contando com a sorte até a minha casa; ou ando me escondendo até o lugar que deixei meu celular e chamo a polícia.

Decido pelo caminho que me dará maior cobertura, ou seja, o celular. Me abaixo e começo a andar silenciosamente, tomando cuidado com qualquer ruído que eu escuto. Ouço o barulho de algo sendo amassado e me escondo rapidamente embaixo de um carro. Vejo nitidamente a luz da lanterna do celular há poucos metros de mim. A ansiedade e o sentimento de euforia de estar finalmente perto de um desfecho em que sobrevivo a essa noite, me faz esticar um de meus braços em direção ao celular, como não consigo alcançá-lo começo a me arrastar no asfalto em sua direção.

Quando estou a centímetros do celular, minhas pernas são puxadas e não consigo segurar o grito que escapa a plenos pulmões de mim. Minhas unhas se cravam no asfalto, mas é tudo em vão. Não há mais para onde correr.


A vizinhança do bairro central está em polvorosa, jovem de 27 anos morreu de forma perturbadora nesta madrugada. Tudo o que os vizinhos encontraram quando acordaram nesta manhã foi partes do corpo amontoadas em frente à sua casa. A polícia acredita que pode se tratar um psicopata. Amostras da roupa, dna e o próprio celular da vítima foram requisitadas, mas até a hora da exibição desse jornal não se tem nenhuma novidade sobre um provável culpado.



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Miado do Gato e outros contosWhere stories live. Discover now