Capítulo 8: Lembre-se de Quem Você É

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- Ué, onde eu estou? – perguntou Raúl, bem confuso, andando num lugar escuro.

De repente ele viu uma luz ao longe, que vinha se aproximando, se aproximando, se aproximando, até consumí-lo por completo. Ele estava de volta ao Mundo dos Sonhos, o lugar mais seguro que ele poderia estar, em sua própria mente.

Ele foi até a Colina-das-Libélulas, na esperança de encontrar Lírio. E lá estava ele, brincando com os insetos alados, como sempre. Ao ver o Garoto-da-Torre, o rosto de Lírio se iluminou e ele foi correndo dar um abraço em nele.

Eles ficaram deitados algum tempo, um ao lado do outro, rindo e conversando, na elevação da colina, olhando o céu e adivinhando formas nas nuvens. Até que Raúl fechou os olhos e suspirou.

- Como é bom esse gostinho de liberdade, não é? – perguntou o pequeno príncipe.

- Pois é, bom de mais – concordou Lírio – Bem... agora que você voltou, preciso te mostrar uma coisa. Vem comigo! – Lírio levantou e começou a puxá-lo pelo braço, muito entusiasmado.

Eles foram muito além da Colina-das-Libélulas. Para um tipo de floresta, o Bosque da Memória. Quanto mais eles adentravam, mais denso o bosque ficava. O espaço entre as árvores ia ficando mais estreito, suas copas se juntavam cada vez mais, dificultando a passagem da luz do dia.

- Para onde você está me levando? – perguntou um preocupado Raúl.

- Relaxa! Você precisa ver isso, é muito importante! – era tudo o que o menino do cabelo arco-íris dizia.

Aquela floresta tinha um diferencial das outras. Nos troncos de suas árvores, eram mostradas imagens de momentos passados que o Garoto-da-Torre já tinha vivido. Dava para ouvir vozes, a de Raúl e de Evandro nas imagens.

Os dois passaram pela adolescência, pré-adolescência e infância, indo cada vez mais no interior do bosque. Já era impossível ver qualquer resquício de luz. Galhos e cipó brilhavam uma luz fantasmagórica, para que pudessem enxergar o que vinha a diante, mas dificultavam a travessia, como se ganhassem vida e recebessem ordens para proteger o que estava mais a frente, de qualquer um que ousasse  se aproximar. Raúl já estava começando a ficar com dor de cebeça. Ia se intensificando, até chegar ao ponto de se tornar insuportável.

Mas nada os deteve. Na frente deles havia a maior árvore de todas. Grande, imponente, resistente como uma rocha, cheia de vida, seus inúmeros galhos sustentavam as outras árvores ao redor.
Uma cortina de cipós contorcidos escondia uma porta que havia no tronco principal.

- Entre lá! – apontou Lírio para a portinha de madeira.

- Por quê?

- Vai achar as respostas que tanto procura, Garoto-da-Torre.

- Como assim? Você não vai entrar comigo? – Ele começou a ficar com mais medo.

- Desculpe, o que está mais a frente não depende mais de mim. Só poderei ir até aqui. Boa sorte, acredito em você! – despediu-se o Garoto-Arco-Íris.

Raúl olhou para a portinha, deu alguns passos em direção a ela e olhou de volta para Lírio.

Ele não estava mais lá.

-Lírio?... – Raúl começou a sentir um aperto no peito e uma lágrima escorrendo pela lateral do rosto – LÍRIOOOOOO!!!!

O som reverberou nas árvores ao redor. Em seguida um silêncio macabro, completado pela escuridão, se instaurou naquele lugar. A portinha se abre, como num passe de mágica.

Raúl engoliu em seco. Porém seguiu em frente, ainda que se cagando de medo.

Era um corredor de pedra, longo, escuro, úmido, com alguns candelabros dando seu último suspiro de chama para que, pelo menos, ele enxergasse o caminho.

Enquanto ia bem mais profundo nesse corredor, o menino conseguia ouvir várias vozes, assobios e salvas de palmas. Era uma comemoração com certeza. Então ele viu uma passagem arqueada, que dava para um imenso salão.

“Meu... Deus!”

Raúl se viu no meio de uma comemoração. Flamulas reais no teto, os mais finos tapetes estendidos pelo chão de mármore e comidas do mundo inteiro dispostas à mesa, no salão de jantar. Pessoas de todas as classes estavam lá: realeza, nobreza, burguesia e... até os pobres estavam lá.

Ao centro, viu um berço de ouro e três pessoas. Duas delas usavam imponentes coroas douradas e olhavam para o berço com ternura e amor. A terceira pessoa parecia um tipo de Evandro mais novo. A semelhança era assustadora. Esse olhava para o berço com empolgação e alegria.

- Que lugar é esse?? - ele tentou perguntar a uma das pessoas ali, mas quando tentou tocar-lhes o ombro, sua mão atravessou. Ninguém podia vê-lo ou sequer ouví-lo.

Ao olhar em volta, ele percebeu que aquele lugar lhe era familiar, como se já estivesse estado alí. Assumiu que poderia ter visto em um dos muitos filmes que gostava, mesmo essa não sendo a verdade. “Eu não estranharia se uma fada malvada viesse e acabasse com a festa”, ele riu consigo mesmo.

Resolveu dar uma olhada no berço de ouro. Lá jazia um lindo, pequenino e inocente bebê. Raúl ficou branco feito papel, ele sabia que já tinha visto aquele pequeno ser antes. Podia sentir a ligação que um tinha com o outro. O bebê riu graciosamente.

Raul estendeu a mão para poder tocá-lo. Hipnotizado pela linda criatura na sua frente.

Antes que pudesse fazê-lo, ouviu-se um grito terrível.

Um grupo de rebeldes disfarçados de convidados se levantaram em armas e fizeram alguns nobres de reféns.

- A festa acabou! É melhor vocês fazerem tudo o que eu mandar, ou cabeças vão rolar! – bradou o líder.

Os guardas do castelos logo foram acionados e estavam todos nos salão, tentando cercar os rebeldes, mas estavam em menor número. As armas deles eram superiores as dos guardas. Então a figura real masculina ao lado berço falou:

- Não é necessário derramamento de sangue. Diga-nos, o que você quer.

- A coroa, é claro. O poder sobre esse principado. É isso que eu quero, principezinho! Ou você coloca essa coroa na minha cabeça agora, ou você e seus súditos não verão o próximo nascer do sol.

- Muito bem, acalme-se. Tudo pode ser resolvido com um pouco de conversa e todos saem daqui felizes – enquanto o príncipe tirava a coroa com uma mão, se aproximando do líder, ele tirava do bolso de trás uma pistola calibre 45. Assim que chegou perto o suficiente, apontou a arma para o líder da quadrilha. – Achou mesmo que o líder de um país iria se render a um tipo como você sem uma luta? É muita prepotência mesmo.

Nesse momento, uma roda de fuzis foi apontada para o príncipe Brandon. A princesa Odette, vendo todo o ocorrido, olhou para o Evandro mais novo e deu um sinal. Um soldado que estava perto dela entregou, discretamente, uma bomba de fumaça e outra pistola. A princesa acionou a bomba e a jogou perto de Brandon. Uma cortina de fumaça se instaurou por todo o salão. Alguns soldados pegaram os rebeldes desprevenidos e soltaram os reféns.

Evandro pegou o bebê em seus braços no meio da confusão. Odette beijou seu filho e disse que o amava. Evandro e o bebê desapareceram pela passagem que Raúl tinha usado para entrar no salão.

Um tiroteio começou. Brandon e Odette lutaram bravamente para defender o seu país. Os guardas foram duros na queda, mas no fim acabaram sucumbindo, assim como os governantes .

O Garoto-da-Torre assistiu tudo dos fundos do salão. Além deles, alguns tiros acertaram súditos.

Houve um banho de sangue terrível naquele lugar. A dor de cabeça de Raúl só aumentava, as lágrimas não paravam de cair de seu rosto. Um vento tenebroso começou a soprar e só se ouvia a risada maligna do líder dos rebeldes.

- Agora, Raúl, vou atrás de você! HAHAHAHAHAHA!!

O Garoto da TorreWhere stories live. Discover now