Arcen balança a cabeça de novo e olha ao redor, piscando depressa. Acho que ele estava prestando menos atenção no que está acontecendo do que pensei.

— Aqui... — ele começa.

Dou de ombros e começo a andar na direção da nave.

— O que meus sensores detectaram sobre a fauna não me faz ter muita vontade de ficar aqui fora de noite.

Não espero para ver se ele está me seguindo, mas não demora para eu ouvir os passos de Arcen. Ótimo. Paro na escotilha por um instante antes de ir para a cabine de controle. Quando essa conversa voltar para o ponto que interessa, vamos precisar de informações.

Arcen faz aquele ruído irritante que parece alguém limpando a garganta. Olho para trás. Ele está parado na escotilha e levanta as mãos algemadas assim que me vê olhando. Cruzo os braços. Ele já tentou uma vez. Não vou cair no truque do "me solte porque preciso ir no banheiro".

— Dessa vez é sério — ele fala. — Não vou tentar fugir.

Levanto as sobrancelhas.

— E por que eu deveria acreditar?

Por um instante, eu tenho certeza de que Arcen vai pular em cima de mim e tentar me atacar da forma como conseguir. Tenho tanta certeza que minha mão já está na minha pistola - e é o que tudo o que sei sobre ele antes de ser preso diz que faria. Um drilliano de uma das famílias tradicionais, tendo sua palavra questionada, é garantia de violência.

Ele respira fundo e balança a cabeça.

— Quando meu pai começou essas pesquisas, foi com a garantia de que qualquer descoberta seria repassada sem custos para toda a população e para os kirjkare. Foi só por isso que ele aceitou reconstruir o trabalho da família quase do zero e assumiu os riscos que assumiu. E agora as mesmas pessoas que deram essa garantia para o meu pai estão cuspindo no seu trabalho, ignorando as promessas que fizeram e apagando tudo o que fizemos por causa deles. — Ele levanta os braços de novo e balança as algemas. — Então se isso é o preço que tenho que pagar para conseguir parar o que estão fazendo, vou pagar. Mas seria melhor se não precisasse fazer isso depois de me sujar.

Nisso eu posso acreditar. É o tipo de coisa que faz sentido para um drilliano. Mas estou falando de um drilliano que eu não consigo prever. Ele pode estar dizendo isso para me fazer baixar a guarda - o que não quer dizer que não esteja dizendo a verdade. Mesmo assim...

Certo, eu admito que não pensei na logística de tudo quando algemei ele.

Fecho a escotilha e abro o terminal que fica ao lado dela. Não tenho acesso aos controles mais sensíveis da nave por aqui, mas posso reajustar o que preciso.

— Eu vou te soltar para fazer o que precisa. E vou ficar do outro lado da porta, com minha pistola apontada para você. Se tentar qualquer coisa, não dou a menor garantia de onde vou estar mirando. E tenho certeza de que Drek vai entender. — Fecho o painel e me viro para Arcen, que estreitou os olhos. — Se por algum milagre conseguir passar por mim, o sistema de segurança da nave vai te reconhecer como uma presença hostil e tomar as medidas necessárias.

Arcen respira fundo de novo e estica as mãos na minha direção. Ah, não. Indico a porta do banheiro com a cabeça e ele vai até lá, suspirando alto. A nave pode não ser grande, mas não vou deixar ele dar voltinhas por aqui solto. E o tempo em que ele estava de costas para mim foi o suficiente para pegar a chave sem que ele visse em qual dos meus bolsos ela está.

Ele para na porta e olha para a chave na minha mão antes de me encarar.

— Você poderia só ter pedido para eu me virar.

Dou de ombros. Poderia, mas não tenho nenhum motivo para fazer isso. E não vou ficar com a consciência pesada por não confiar nele.

Seguro minha pistola enquanto uso a outra mão para abrir as algemas. Não acho que ele vai tentar alguma coisa agora, mas prefiro estar preparada para o pior. É estranho estar tão perto de Arcen de novo. Da última vez em que estive perto o suficiente para sentir o calor do seu corpo, estava usando isso como distração para colocar as algemas.

E talvez eu esteja há tempo demais sem sexo, se minha cabeça está indo para esse lado. Preciso dar um jeito nisso.

Arcen balança as mãos assim que tiro as algemas e olha para baixo de novo.

— Você ia atirar através do tecido.

Assinto.

— Se necessário.

Ele abre a porta do banheiro e para de novo. Tenho a impressão de que ele está tenso, mas não faço ideia do motivo, agora. Só sei que isso quer dizer que minha pistola já está fora do coldre e apontada para ele.

— Você está vivendo como uma mercenária há anos — ele começa, sem se virar para mim. — A essa altura, já deveria ter aprendido o valor que os drillianos dão para sua palavra.

Eu deveria ter imaginado que uma hora ele ia ter algum tipo de reação.

Confiro minha mira e a carga da pistola.

— Não estou lidando com um drilliano qualquer. Estou lidando com Te'vi Arcen, que foi o responsável pelo tráfico de mulheres terráqueas por anos.

Ele se vira para mim e não tenho a menor dúvida que se fosse antes de ser preso, ou talvez só antes de tudo o que Ei'ri contou, Arcen teria me atacado. Mas ele só me encara sem nem tentar esconder a raiva.

— Se desconfia tanto assim de mim, prefere que eu deixe a porta aberta? Assim pode ter certeza de que não estou fazendo nada além do que disse que faria.

Levanto as sobrancelhas.

— Não precisa, pode manter sua privacidade.

Por mais que essa fala dele tenha me feito voltar a pensar na sensação do corpo dele de novo. Não. Não quero olhar. Mesmo que fosse uma questão de segurança, eu não ia olhar. Isso é errado de todas as formas e ele é Te'vi Arcen. Não. Só não.

Ele fecha a porta do banheiro com uma delicadeza que é muito pior que se ele tivesse batido. Ugh. Isso vai ser complicado.

Arcen (Filhos do Acordo 7) - DegustaçãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora