Vida monótona, não?, pensei, sentindo-me idiota.

E eu ainda tinha a atenção totalmente voltada ao sitcom, no momento em que notei os olhos de Iolanda me fitarem, de soslaio. Quando voltei a encará-la, vi suas expressões se tornarem serenas.

— Querida, eu vou ser franca e não quero que fique brava — Socorro, pensei. —Mas não cometa o mesmo erro que cometi.

Ciente do sermão a caminho, suspirei. Ela, por sua vez, revirou os olhos, resignada:

— Olhe para mim, Cristina. Eu estou só! Cinquenta anos nas costas e completamente isolada do mundo — ela riu, com seu costumeiro humor sobre si mesma.

— Que exagero.

— Por acaso me vê por aí, namorando todo mundo?

— E desde quando ser reservada é ruim? — Retruquei.

— Não foi o que eu disse — ela semicerrou os olhos escuros, tão parecidos com os meus. — Até porque foi eu quem optei por ficar só. Mas, às vezes, me pego pensando como seria se tudo tivesse sido diferente.

Sem palavras, peguei-me pensando como a conversa teria tomado aquele rumo. Ignorando este fato, ela afagou minhas bochechas e sorriu:

— Mas você não precisa fazer o que eu fiz.

Abaixei a cabeça ao sentir seus olhos amorosos pesarem sobre os meus. Ela continuou:

— Dê uma chance para si mesma. Sei que odeia quando eu digo isso, mas Eduardo sempre foi perfeito pra você. Vocês se entendem como ninguém e, ainda que diferentes, são muito iguais — ela deu de ombros, colocando uma mecha escura atrás das orelhas. — E não é todo dia que o destino é tão bondoso conosco.

Destino.

O Destino escreveu suas curvilíneas linhas do passado à pura tinta negra.

A lembrança rapidamente tomou meus pensamentos. Durante aquela semana, tudo parecia convergir para aquele livro. Inquietei-me, mas consegui impedir que essa questão dominasse outra vez meus vulneráveis pensamentos.

 Inquietei-me, mas consegui impedir que essa questão dominasse outra vez meus vulneráveis pensamentos

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— Linda. Simplesmente linda.

De forma exagerada, Iolanda comentou um pouco atrás de uma mulher que o espelho insistia em dizer ser eu. De salto e de vestido rendado negro – justo demais para ser confortável –, meu reflexo me encarava com feições pasmas, perguntando-me internamente onde é que ela foi encontrar uma roupa daquelas para mim. No espelho, notei o ruivo de meus cabelos parecer mais intenso, e dei os créditos aos truques de maquiagem caseira, nada treinados desde a formatura do colégio.

Ligeiramente nervosa, encarei o relógio. De fato, Iolanda conseguiu me inquietar ainda mais com aquele papo de "chance do Destino". Peguei minha bolsa e andei em direção à garagem, sem antes ter o olhar atraído para a publicação de letras prateadas, que já se tornara uma grande e velha amiga de minhas paranoias infundadas.

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