Capítulo 8

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Meus ossos estralam quando desmonto do meu pélagos. O animal nem mesmo pestaneja e parte em direção a um pequeno lago na margem da mata em que pousamos. Depois de cinco dias de voo, Lírida nos comunicou que ainda haveria meia hora de caminhada até o Templo Virtus.

-Não sinto minhas pernas. –Cecília reclama.

-Bem, é melhor colocá-las para funcionar ou lhe deixaremos para trás. –Luke fala e esbarra no ombro na princesa.

Em resposta, Cecília bufa e seguimos nosso caminho. Rio internamente da dinâmica que se estabeleceu entre ambos. É como se os dois fossem polos opostos de ímãs se atraindo, mas lutando incontrolavelmente contra a força que insiste em lhes aproximar.

Em meio ao grupo, encontro o olhar pensativo de Rurik preso as costas de Luke. Ele parece retido em suas memórias quando me aproximo, o que lhe provoca certo sobressalto.

-Você parece preocupado. –Digo.

-Creio que a situação não é das melhores, não mesmo? –Ele questiona com um sorriso amarelo.

-Sem dúvidas. –Hesito antes de continuar e declarar o que está guardado em meu peito. –Gostaria de me desculpar com você. Tudo que me revelou foi demais para absorver e acabei perdendo o controle. –Disparo.

-Eu sei, menina. Você não precisa se preocupar em pedir desculpar, minha função sempre foi protegê-la e há muito tempo isso deixou de ser apenas uma obrigação. –Ele fala e pisca um olho.

Seguimos em silêncio trilhando uma leve inclinação do solo. Ao alcançarmos o topo, meu coração acelera com o cenário que se desenha a nossa frente: fogo se espalha por pequenas construções brancas enfileiradas e grandes labaredas varrem a vegetação ao redor. Por alguns segundos, é como se o ar parasse de fluir para que eu pudesse abstrair aquela cena.

Um uivo de dor se propaga em meio ao silêncio e vejo Lírida se ajoelhar enquanto observa as casas queimarem. Antes de quaisquer ordenanças serem pronunciadas, as fadas arqueiras correm em direção ao incêndio e, com seus dons, tentam dobrar as chamas. Contudo, não são bem sucedidas.

-Esse era o acampamento do Conselho Eterno. –Rurik sussurra ao meu lado. –Aquele é o Templo Virtus. Chegamos depois dos feiticeiros sombrios. –Ele sentencia.

Quando olho a direção indicada por sua mão, vejo uma grande catedral branca situada no vale entre dois montes. Ao seu redor, fogo se propaga sem piedade. Instintivamente, movida por sentimentos desconhecidos, marcho em direção ao caos.

Ouço chamados pelo meu nome, mas os ignoro. Um zunido se apossa de meus ouvidos e a realidade ao meu redor se desfaz. Somente uma sensação de posse e desespero me domina, como se aquele lugar pertencesse a mim, fosse uma extensão do meu corpo.

Um calafrio percorre minha espinha quando os quatro elementos despertam sob minha pele. O poder é tão forte que minha trança se desfaz e meu cabelo se liberta tomando conta da minha face.

Alçando o centro do círculo formado pelas pequenas casas, estendo minhas mãos atraindo a energia ardente. Quando nos conectamos, ordeno ao fogo que retroceda e se finde. No instante seguinte, apenas uma fina fumaça negra paira no ar.

Uma franqueza percorre meu corpo, fazendo com que eu me ajoelhe em busca de apoio no solo. Sinto uma mão em minha cintura que me impele a levantar e, ao olhar para cima, encaro o rosto de Lírida marcado por lágrimas.

Nesse momento, escuto passos provenientes da floresta e, pouco a pouco, fadas surgem ao nosso redor. Algumas voam pelos céus descendo de suas casas nas árvores. Seus rostos estão marcados por fuligem e seus corpos com machucados que deixarão cicatrizes. Entretanto, o que capta minha atenção são suas asas: despontando de suas costas e em movimentos graciosos, elas cintilam a luz do sol e ondulam como seda ao toque suave do vento.

Palácios De Cinzas - Livro 2 - Trilogia Mestiços Onde as histórias ganham vida. Descobre agora