Estágio 2

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Um pouco tempo depois, Aaron começou a trabalhar na plantação de flores do maior produtor da região, os Armstrongs, família constituída de três integrantes. Rubens Armstrong, um pai jovem de grande força e poder na região, dono da maior plantação da vila e produtor de grandes variedades de flores, imponente, porém de uma gentileza ímpar. Nora Armstrong uma mulher doce, firme e muito encantadora, que dentre todas as mães de Florais era a dotada de maior charme e beleza. Nora era uma mulher simples, mas o simples lhe caía muito bem, realçando sua personalidade intensa e justa. Rubens a amava profundamente e tinha muito ciúmes de sua incrível esposa, mas sabia controlá-lo, pois tinha consciência de que fazia parte do charme natural de Nora ser independente. O casal tinha uma única filha, a jovem e eloquente Catherine Armstrong. Dona de um belo sorriso e olhos expressivos, Catherine também era tão encantadora quanto a mãe, porém dissimulava suas emoções. A moça não era a mais honesta das damas de Florais e sabia tirar o melhor de cada pessoa para si mesma. Seu único medo era não conseguir o que queria.

Foi em meio a essa família que Aaron conseguiu um emprego e iniciou sua nova vida. Ele foi contratado para auxiliar dr. Sparkins nas pesquisas por novos tipos de flores e combinações das já existentes. O doutor era um típico cientista maluco, horas totalmente silencioso e horas totalmente hiperativo, mas tinha um peculiar bom-humor sobre tudo, sobre o errado e o certo e sabia reconhecer seus próprios erros. No laboratório, que ficava ao lado da casa dos Armstrongs e no centro de uma considerável estufa, Aaron e Sparkins trabalhavam juntos todos os dias. O jovem notou que, apesar de não se lembrar de nada, tinha uma grande aptidão para a química das flores e com isso era de grande ajuda para o doutor. Catherine era uma constante visitante do laboratório. Desde que Aaron apareceu na cidade, ela se interessou muito pelo rapaz, passou a observá-lo de longe e, assim que surgiu a oportunidade, mexeu seus pauzinhos e conseguiu colocá-lo perto de si. Dentre suas idas e vindas ao local de trabalho do cientista, percebeu que o rapaz não lhe dava tanta atenção, e o tratamento que ele lhe dava deixou-a mais intrigada e interessada nele, decidida a levar o desafio de conseguir sua atenção até o fim.

O laboratório, palco das pesquisas e projetos de Sparkins, era um ambiente fechado e protegido contra pequenos insetos e animais selvagens. Com grandes bancadas em todas as laterais, exceto a da entrada, seguia retangular com apenas uma janela ao fundo, que permanecia fechada para entrada apenas de luz. Uma pequena pia ao lado da porta e um banco de madeira no meio do laboratório fechava o lugar, além dos armários e prateleiras nas paredes, com todo tipo de amostra e material de pesquisa e inúmeros tubos de ensaio. Todos muito bem conservados pelo cientista que, apesar de sua aparência desgrenhada, era bastante organizado.

— Bom dia, Aaron. Como vai? — disse a filha dos Armstrong.

— Vou bem, senhorita — respondeu ele de cabeça baixa.

— Como vão os trabalhos para hoje? Será que vocês vão criar a flor mais bela e dar meu nome a ela? — disse, esperando uma resposta do rapaz.

— Isso cabe ao dr. Sparkins, srta. Catherine, mas creio que ainda estamos longe de tal descoberta — respondeu Aaron, desinteressado.

— Pois que seja. Sparkins? Já sabe o que fazer — a jovem bufou.

O cientista nada respondeu, pois estava em um dos seus acessos de silêncio, concentrado apenas em sua pesquisa e imerso em livros, frascos e microscópios.

Enquanto isso, no centro de Alta Montanha, Sophia trabalhava na floricultura Flor de Lis. Era ela a responsável por montar os arranjos e era muito boa no que fazia. Toda a clientela sempre a procurava onde estivesse para fazer seus arranjos. Conseguia criar combinações que nunca foram imaginadas e fazia recortes de papéis que combinavam perfeitamente com eles. Graças a isso, a dona da floricultura lucrara bastante desde que ela foi trabalhar lá.

Ao entardecer, quando a vila se preparava para a noite e as lojas começavam a fechar, dando lugar às animadas tabernas, Sophia terminou de arrumar a floricultura para o dia seguinte, despediu-se de Flora, sua chefe, e logo depois saiu. Ela sempre fazia o mesmo caminho quando voltava para casa. Não havia necessidade de mudar; todos a conheciam e ela se divertia falando com os aldeões que encontrava em seu percurso. Mas, nesse dia, ela decidiu não seguir a rotina: sentiu que deveria tomar outro destino, evitando os lugares habituais. Por conhecer toda a vila, desviou da rota principal e foi por fora da cidade, fazendo o contorno pelas casas e entradas da vila. Alta Montanha era rodeada pela floresta, um muro baixo limitava o território da vila e, margeando-o, um belo jardim se dispunha entre a relva que separava a mata do muro.

No laboratório, Aaron teve de sair para coletar algumas amostras no campo para Sparkins examinar e, para isso, tinha que contornar a vila a fim de chegar à entrada da floresta, onde havia um jardim com inúmeras flores que nunca se repetiam. O que continha naquelas flores era algo mágico — não havia nem sequer uma que fosse parecida com a outra e era lá que eles e todos os outros floricultores coletavam as amostras para suas plantações em Alta Montanha.

Ele se abaixou para começar o trabalho de colheita das amostras e, como sempre acontecia quando ia para o campo, se desligou por completo do mundo exterior, parecendo entrar em um transe momentâneo. Sophia vinha cantarolando uma antiga canção que ela não se lembrava de onde conhecia, mas acreditava que sua mãe biológica tinha cantado para ela quando ainda era um bebê. Também distraída, resolveu parar no campo para apreciar as flores desiguais. Nesse espaço de tempo, ela adentrou o jardim e caminhou por entre as plantas, passando sua mão por entre as pétalas, sentindo a textura com o corpo e a pele... Então ela acabou trombando com alguma coisa. A relva naquele lugar era alta e alguém abaixado ali poderia ser completamente encoberto pela vegetação — por sorte não havia animais de grande perigo no local, apenas coelhos que usavam aquelas terras para fazer suas tocas.

Quando Aaron foi derrubado, ele soltou um murmúrio bem baixo, que Sophia não percebeu, e logo se levantou de frente para ela, fazendo com que seus rostos ficassem muito perto um do outro. Ela não se assustou, mas sentiu-se absurdamente atraída por ele.

"O que é isso? Quem é ele?", ela pensou.

Ele, sem saber que havia trombado em uma pessoa, olhou para cima e encontrou os olhos de Sophia. Quase que no mesmo instante, a pedra do colar que estava em seu bolso começou a brilhar e seu brilho aumentou cada vez mais, até que só se via luz em torno dos dois. Ambos sofreram um apagão e, quando menos esperavam, estavam acordando com muita dor de cabeça e com os aldeões rodeando o lugar sem saber o que havia acontecido.

Aaron foi o primeiro a acordar. Estava assustado e perdido no meio das memórias que passavam tão rápidas pelos seus olhos que não conseguiu entender em que lugar estava. Os aldeões cuspiam perguntas e ele apenas sentia sua mente girar e girar. Levantou-se e sentou-se na grama, levando as duas mãos à cabeça na tentativa de acalmar seus pensamentos.

Quando Sophia acordou, ela teve a mesma sensação, mas, ao contrário dele, não tinha nenhuma memória perdida, apenas uma sensação dentro de si mesma, a de que algo estava fora do lugar. Algo que ela sempre sentiu, mas que nunca foi tão forte quanto naquele instante.

O fato é que, quando os olhos dos dois se encontraram, a pedra do colar em seu peito reagiu, causando uma explosão em torno dos dois, que não os feriu, somente os lançou para longe um do outro. Os aldeões ouviram o som e correram para o local, onde encontraram os dois caídos em cantos opostos do campo sem nenhuma marca de ferimento ou do que causou aquele som e luz.

Mais um enigma que Hannes presenciou e um dos seus pensamentos foi de que ele sabia bem menos de Aaron do que deveria saber.

Caminho das Fadas - Livro I [DEGUSTAÇÃO]Where stories live. Discover now