Reencontro

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Rochelle cantava animada com nossas colegas de quarto no karaokê enquanto eu beliscava os petiscos na mesa da sala que alugamos. Elas não sabiam, mas aquele era meu jeito de me despedir delas também.

Ela tinha alcançado o emprego dos seus sonhos, eu tinha momentaneamente perdido os meus. Rochelle iria para Xangai no dia seguinte, eu iria para Seul. Talvez não nos veríamos mais... Talvez eu não veria ninguém mais que conheci nos últimos meses.

— Clara! CLARA, É SUA MÚSICA!!!

A voz já meio bêbada da minha amiga dançarina soou na sala toda empolgada e eu acabei por sorrir, ela me fazia sorrir muito, essa era a verdade. Ia sentir falta dela e de todas ali, então tinha que me despedir a altura e por isso fui até elas, peguei o microfone enquanto ainda tocava a introdução da música que todos sabiam, eu amava.

Então a letra em japonês surgiu na tela e eu suspirei fechando os olhos.

Numa noite em que a lua se esconde sutilmente nas nuvens do céu estrelado
Por algum motivo, eu vago num pequeno quarto empoeirado...

O barulho ao redor parou e eu quase sorri, elas adoravam me ver cantar aquela música. E enquanto eu seguia, minhas lembranças voltavam, lembranças de todos os momentos divertidos e legais que passei naquela ilha e até mesmo nos passeios no continente chinês.

Quanto tempo nós passamos juntos neste quarto frio?

Você olhava para mim com uma expressão triste, pois não posso voar

Logo era apenas eu e a música e todas as decisões que me levaram até ali, agora eu tinha outra vida para cuidar, não seria só a minha, agora não seria apenas eu. Eu estaria preparada? Preparada para lidar com uma gravidez sozinha de uma criança cujo o pai eu não fazia a menor ideia de quem era?

O mundo não era bom com mães solteiras, ainda mais no oriente. Eu seria sempre uma estrangeira e agora uma estrangeira grávida de apenas vinte anos.

Onde eu iria passar essa gravidez em segurança? Como ia nos alimentar? Minhas economias não durariam a gestação toda e agora eu teria que me cuidar por dois. E médicos... E meus deus! E tudo o que viria com aquilo...?

Minha voz falhou e eu engoli um soluço.

O refrão soava em meus ouvidos, decorados por milhares de vezes em que eu ouvira aquela música, mas eu já não cantava mais, pedi licença sem graça e como todas elas estavam meio alcoolizadas já – eu não bebi, afinal agora não poderia – sai correndo de lá. Duas pessoas estavam próximas da nossa porta, mas eu apenas pedi desculpas tremula e continuei a correr dali até alcançar a rua lá embaixo e respirar o ar noturno e ver as poucas estrelas no céu aberto:

Você me ensinou sentimentos bons
Você me ensinou sentimentos dolorosos

Essa é a coisa mais importante
Eu não vou me esquecer

Não fui capaz de enxugar minhas próprias lágrimas, peguei meu celular e dei uma desculpa qualquer para as meninas pelo nosso grupo particular e então fui até o ponto de ônibus. Eu só queria dormir e esquecer um pouquinho da minha situação.

Ofeguei guardando meu celular no bolso do blusão e pisquei tentando controlar meus sentimentos bagunçados. Eu podia ser mais deplorável?

— Clara?

Uma voz baixa e familiar me chamou e eu pensei estar ouvindo coisas... Hein?

Então me virei lenta e lá estava ele, o moreno chinês da noite mais de um mês atrás e ao seu lado estava outro cara, com a típica máscara escura e vestido dos pés a cabeça como se tivesse mesmo medo de ser reconhecido. Estava frio, mas o cara estava exagerando...

Na cama com o exoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora