Capítulo Três

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Los Angeles, dois dias depois.

Mia

 Dois dias haviam se passado desde o fatídico episódio em que eu acreditei que a vida estava fazendo uma grande sacanagem comigo. Rindo da minha cara, enquanto testava a minha paciência na maior cara de pau do mundo em perceber que nem tudo que acontecia comigo deveria ser tão fácil. Era muito óbvio que eu não conseguiria aquele precioso papel na série sem precisar de um teste diário de sobrevivência, que arrancaria cada resto de sanidade que ainda timidamente vivia dentro de mim. E aquele teste, enfim, possuía nome e sobrenome.

 Will Hedlund.

 Não, eu não era uma completa alienada que não o conhecia, como aparentemente devo ter soado naquela tenebrosa noite na boate. Eu sabia muito bem o tipo de música que ele tocava, conhecia parte do seu trabalho, graças à uma ex-colega de quarto na faculdade de Artes Cênicas e sua obsessão por Hedlund. Também tinha pleno conhecimento que fazia parte de uma seleta gama de astros infantis que não havia se entregado às drogas ou ao manicômio mais próximo. Outro fato conhecido por mim era que Hedlund poderia não ser problemático em aspectos mais grotescos, mas possuía uma bela de uma fama de intragável.

 Virava a cara para quem bem entendesse, se achava superior a qualquer empregado ou colega de trabalho... Até mesmo enfrentava seus ex-companheiros de banda, quando confrontado a respeito de seu ego e sua total negligência de empatia para com os outros. As histórias eram muitas: desde fofocas sobre Will ter feito uma atriz veterana chorar, até ter incomodado tanto um dos maiores diretores de Hollywood, ao ponto do cara desistir da carreira e se aposentar para todo o sempre. Na noite após o segundo encontro com aquela mente problemática, eu até havia cogitado pesquisar alguns psicólogos da região... A sensação de que eu precisaria de algum auxílio, mais cedo do que eu esperava, havia me deixado um pouco de preocupação.

 Seu rosto não estava nas revistas, como era de se esperar. Em uma tímida pesquisa feita na calada da noite, pouco antes de dormir com o celular em mãos, percebi que Will tentava retornar para as telas lentamente, entre papéis dramáticos e profundos, até mudar seu foco. A notícia da série ainda não era certa, sequer sabiam tratar-se de Bad Habits, e parte de todo o chilique de Will era quase justificável. Se ele não aparentasse ser um completo babaca de cinco em cinco segundos.

 As próximas horas, até chegarmos a mais um dia de Mia sendo testada emocionalmente, haviam sido de leituras e mais leituras. Os scripts estavam espalhados pelo chão da sala e, sozinha, varei horas e mais horas empenhando-me em construir Crystal da melhor forma possível. Em certo momento, o baixo até estava em minhas mãos, ao que eu retomava aquele hobby com certa apreensão por saber que eu não era nenhuma mestra no instrumento. De toda forma, ensaiei como podia, declamei falas como nunca, pesquisei possíveis visuais que poderia agregar a minha personagem, ainda que soubesse que aquilo ficaria a cargo da produção. Sim, eu estava entregue de corpo e alma.

 Não havia Will Hedlund no mundo que pudesse tirar o sorriso do meu rosto e a minha ansiedade, quando, naquela manhã, me preparei para o que talvez fosse o primeiro ensaio oficial. Parte do elenco (nossa pequena equipe de sete personagens principais) se encontraria em um estúdio no centro de LA para ensaiarmos algumas músicas, pequenos covers, uma espécie de primeiro contato com o lado musical e com nossos companheiros de equipe. Pelo pouco que havíamos conversado em nossa primeira reunião, o restante do elenco era maravilhoso, para a minha sorte, todo composto de nomes medianos ou novos, como eu. Ou seja, não havia como ficar animada e esbanjar sorrisos, ao que saí de casa pela manhã.

 Errado. Um milhão de vezes errado.

- Será possível?! – Foram as primeiras palavras que soltei, assim que paguei o motorista do táxi, ao parar bem diante do meu destino naquela manhã. O estúdio ficava em uma rua pouco movimentada, com uma entrada lateral, entre um prédio estreito e um bar ainda fechado pelo horário... Assim que adentrei o pequeno estacionamento lateral, descoberto e com apenas dois carros parados, que ali havia, a fim de chegar à entrada na qual Fred Lang havia nos sugerido esperar, não demorei a encontrar uma figura esguia e mal encarada, encostado contra a parede de tijolos alaranjados do estúdio. – Você quer me foder, não é universo?! É a única resposta!

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