A Profecia

21 0 0
                                    

                                                                     Japão antigo – Vilarejo Totsugawa – Nara – 720 d. C

            O som grave e ensurdecedor de um trovão, junto com o ruído da chuva castigando o telhado da casa abafaram um grito de pura dor, as janelas tremiam com a força do vento e para Megumi, parecia que o mundo acabaria hoje.
            Sentia como se uma faca lhe rasgasse o abdome a cada contração, encontrava-se em um ofurô cheio até a altura dos seios com água morna, mas nem sequer aquilo servia pra aliviar a dor. A parteira do vilarejo estava ao seu lado, conversava e tentava fazer com que relaxasse, enquanto seu marido a olhava apreensivo e com medo.
            — Está coroando, estou sentindo o topo da cabecinha, mais um pouco de força apenas, Megumi, você consegue. – Sentiu suas forças voltarem, seu filho precisava dela e não iria decepciona-lo. Desta vez, com um grito, usou toda sua força e viu o bebê saindo de si para as mãos de Suki, ainda na água viu ela deixar o bebê flutuar um minuto para que ele se adapte ao novo lugar, aproveitando para remover parte do sangue.
            -É uma menina! – Suki falou enquanto retirava o bebê do ofurô e o colocava no colo da mãe, que massageou suas costas e logo ele soluçou, iniciando o choro fino e alto, que acompanhou as risadas aliviadas da mãe e do pai. – Uma menina saudável, apesar de pequenina! – E realmente, era o menor recém nascido que havia visto na vida, mas muito ativa, se movimentava e parecia estar procurando o seio.
            Assustou-se quando novamente sentiu uma forte contração no ventre e arquejou de dor, segurando o bebê com uma mão e a barra do ofurô com a outra, olhou para Suki em pânico, mas não houve tempo para entender e logo outras fisgadas de dor intensa vieram, seu marido pegou a filha no colo, logo que Suki anunciou que havia outro bebê, desta vez foi mais fácil e a passagem já estava dilatada.
            -Outra menina, parabéns! É uma bela surpresa, vocês são pais de gêmeas idênticas! – Suki estava encantada e sorridente, sentia orgulho de si mesma e de Megumi, ainda lembrava do dia que trouxe ela ao mundo, ao contrário de hoje, era uma tarde ensolarada, as flores de sakura caiam por terra e a brisa as carregava para perto da clareira onde a mãe escolhera como lugar para o parto.
            Horas mais tarde, Megumi estava sentada em uma cadeira de balanço que Akio havia fabricado para ela, era linda e tinha desenhos entalhados na madeira que retratavam os dois, ela em suas posições de luta e de meditação e ele com suas armas, por vezes com adagas finas e longas, outras com garras de aço grandes.
            Admirava suas filhas, eram lindas, doces e pequenos anjos, ainda não haviam escolhido nomes para elas, durante a gravidez perceberam que só poderiam nomear quando conhecessem seu filho, agora com a novidade, ficara ainda mais difícil.
            A tempestade ainda estava forte, por isso todos perceberam a hora em que os barulhos cessaram repentinamente, Akio levantou-se para ir ver porém ficou em choque quando virou e deu de cara com uma mulher, ela era tão linda que sequer parecia humana, cintilava em uma luz esverdeada, tinha a pele escura e cabelos e olhos completamente brancos. Ouviu os passos de seu marido no corredor e quando ele chegou viu o mesmo choque estampado em sua face.
            — Humanos, eu sou um oráculo mensageiro e vim lhes trazer uma profecia. – Jamais um humano teria uma voz como essa, a melodiosa entoação, mais parecia que havia mais de uma pessoa falando aquelas palavras, parecia seguir no ritmo de uma música que apenas ela ouvia. Notou que o ser virou o olhar para o pequeno cercado onde suas filhas dormiam e se sentiu apreensiva.
            O oráculo recomeçou a falar, seus olhos, narinas e boca passaram a emitir uma forte luz que parecia vir de dentro da mulher e agora a voz mudara, ficara grotesca e dava impressão de pertencer a alguém com milhares de anos.
            POR MEIO DESTA PROFECIA VENHO ANUNCIAR
            DOIS NOVOS DEMÔNIOS QUE O MUNDO CARREGARÁ
            NO DÉCIMO NONO ANO SERÁ LIBERTADO UM PODER
            E UMA ONDA DE HORROR A SUA FAMÍLIA IRÁ ABATER
            COMO YIN E YANG ELES SERÃO
            MAS POR ONDE PASSAREM O TERROR DEIXARÃO
            - Eu os aviso, devem matá-las agora, é a única chance de impedir tudo que acontecerá no futuro, pois digo, será terrível, porém vocês não viverão para ver. – A voz voltou ao tom de sinos e o olhar branco do oráculo focou no rosto cansado de Megumi.
             Olhou para suas filhas e sentiu um arrepio percorrer sua coluna, elas tinham os olhos abertos e olhavam para si, grandes olhos anormalmente vermelhos como sangue fresco, apesar da profecia, sentiu seu peito encher-se de amor por suas crias, jamais permitiria que lhe fizessem mal, quando virou-se para ordenar ao oráculo que saísse de sua casa, ele havia desaparecido e apenas restava seu marido, pálido e estático no vão da porta.
            - São nossas filhas, jamais permitirei que nada faça mal a elas. – Falou com a firmeza e a coragem de uma leoa protegendo os filhotes.
             - Você tem razão, nós as amamos independente de qualquer coisa. E eu também amo você, querida. – Ela a abraçou reconfortando e passando a segurança que ela tanto necessitava.
            Soltou-se do marido e foi até o cercado, acariciando suas bochechas falou:
            - Akuma e Sumiko, serão os nomes delas. – Olhou pra Akio com os olhos marejados esperando ele concordar ou discordar de sua escolha.
            - Parece adequado, como Yin e Yang elas serão, gosto dos nomes.
            As lágrimas de Megumi começaram finalmente a cair e quando uma dela caiu na bochecha da pequena Sumiko, logo se apressou para limpar, surpreendendo-se quando tocou a pele e estava seca, sem vestígios da lágrima.

Essa história foi escrita há oito anos atrás, por uma adolescente de 14 anos. Sem fins lucrativos e apenas pra reviver os bons dias vividos anos atrás.
Aberta a opiniões e críticas.
Obrigada!

Chi TsukiWhere stories live. Discover now