Noctem Illam

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SINOPSE DO CAPÍTULO:

Desde que Catarina contraiu a peste, Afonso é incapaz de focar em seus afazeres. A cada hora que passa, seu medo de que Catarina junte-se a lista de óbitos aumenta. Ele fica dividido entre ficar com a princesa e lhe prestar o apoio que necessita ou doar-se a suas obrigações como Rei e dedicar sua atenção à Amália.

Ele estava resistindo muito bem... até aquela noite.


CAPÍTULO II - Noctem Illam


A peste assolou o reino de Montemor. Haviam doentes por todos os cantos do reino e a doença não poupava nem mesmo os nobres, cujo dinheiro e poder nada podiam fazer contra a peste. Alguns diziam ser um castigo divino que dominava apenas os corpos possuídos pelo pecado; outros diziam ser obra das bruxas, mulheres demoníacas, concubinas de Satã e suas agentes do caos. O número de mortes e enfermos subia a cada dia, e mesmo com todos os palpites, não havia como saber qual era o real motivo da chegada da doença.

À parte de bruxas, castigos divinos e quaisquer outras sandices que o povo pudesse criar, Afonso sabia que a peste era uma desgraça, independente de sua origem, e precisava ir embora. Seu povo estava sofrendo, mas o número de enfermos no castelo tampouco era tranquilizador. Primeiro seu sogro, Martinho, padecera há alguns dias e agora, Catarina sofria com os sintomas da doença.

Quando a princesa de Artena desfaleceu em seus braços, Afonso tentou não demonstrar o quanto estava preocupado. Ele rezou, implorou para Deus que não permitisse que a peste a levasse. Poderia ser apenas um mal estar, uma tontura passageira, mas quando doutor Lupércio lhe mostrou as manchas na pele dela, Afonso quis gritar. Amália estava no quarto e seus olhos estavam fixos nele, esperando para ver como ele se portaria. O Rei notou como ela reagiu quando viu que Afonso segurava a mão de Catarina. Talvez ele não devesse tê-lo feito... mas a princesa estava tão frágil, assustada! Como ele poderia negar-lhe um pedido num momento como aquele? Ainda mais um pedido tão simples como não deixá-la só.

Agora, deitado em sua cama, ele ainda tentava processar tudo que tinha acontecido. Não importava o quanto tentasse, era impossível pregar os olhos. Amália havia se esgueirado para os seus aposentos na calada da noite para fazer-lhe companhia. Ele ficou com receio de admitir que preferia ficar sozinho e permitiu que ela ficasse. Sua esposa tinha boas intenções.

O tempo se arrastava e tudo no que Afonso conseguia pensar era que Catarina estava deitada em sua cama, sofrendo e lutando contra a peste. Ainda que fosse a mulher mais forte e determinada que ele já tivesse conhecido, como se luta contra um inimigo que não podemos ver? Teve visões da princesa tremendo de frio, a pele suada e a expressão distorcida em feições que denunciavam sua dor e agonia.

Aquilo foi a gota d'água para Afonso e ele saiu da cama (com cuidado para não despertar Amália), vestindo seu robe negro por cima da roupa de dormir. Abriu a porta com cuidado e saiu pelo corredor. Àquela hora da noite todos haviam se recolhido para dormir, apenas alguns guardas faziam patrulha pelo castelo e quando viam o Rei, prestavam reverência e continuavam seu trabalho. Ao chegar à Ala Leste, onde ficavam os quartos de hóspedes e a biblioteca, Afonso encarou a porta do quarto da princesa de Artena. Ele sentiu um frio na barriga. O que exatamente estava planejando fazer quando chegasse lá? Simplesmente bater na porta de Catarina e esperar que a moça, doente, se levantasse para atendê-lo e o recebesse normalmente na calada da noite? Aquela tinha sido uma péssima ideia, seria melhor que ele retornasse na manhã seguinte, quando Catarina estivesse desperta e ele não precisasse agir como um ladrão no meio da noite.

Prestes a virar-se para voltar ao seu quarto, Afonso parou quando ouviu o ranger da porta de Catarina. Lucíola estava ali, de frente para ele, os cabelos bagunçados e um olhar cansado.

Perdoe-meWhere stories live. Discover now