Expresso

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Nada acontecia e dessa vez eu estava num motel com um pouco mais de qualidade. Pedi um balde de gelo e tinha meu punho direito enfiado dentro dele. O quarto tinha TV por assinatura, dessas que tem um canal de música, e um jazz aleatório tocava.

Eu mataria por uma copo de café gelado, cold brewed, como dizem os americanos. Em Nova York, você pode tomar todos os tipos de café não importa que horas são ou em que parte da cidade você está.

Se eu quiser um balde de café gelado, em pleno inverno, é só dar três passos em qualquer direção que pelo menos um Starbucks você irá encontrar.

Lugar engraçado.

Uma vez acompanhei um político, no meu antigo emprego, andei por Nova York,"a cidade que nunca dorme" como dizem pajeando o sujeito e sua amante. E aí você percebe que a cidade não é o que dizem - é mais.

O apartamento onde ele ficou no hotel tinha dois andares e só a sala era maior do que qualquer casa que eu já vivi (quintal incluso). As paredes eram revestidas de uma madeira lisa que eu nunca saberia identificar, mas que cheirava a garrafas de whisky de mil reais recém abertas. A luz era amarela vinda de uma lareira etérea que não podia ser enxergada em nenhum lugar.

O couro, tudo era feito de madeira pesada ou couro. Também haviam tecidos nobres, alguns finos e leves como seda, outros grossos e com cheiro de coisa de museu.

Ao enxergar as coisas nos filmes que se passam em Nova York você não tem ideia do quão luxuosa aquela cidade é.

Aqui no Brasil você vai num barzinho com um cara tocando sertanejo universitário num violão barato. Lá, em qualquer restaurante você precisa de reserva, e se tocam músicas boas em instrumentos que são no mínimo duas vezes mais velhos que os próprios artistas.

Esta viagem me deixou viciado em Jazz e em comédias românticas que se passam na cidade. Até hoje tudo me parece um sonho.

Tudo isto para agradar a amante de um prefeito em deus me livre.

O prefeito vai bem. Hoje? Deve estar em Paris. E eu continuo em "Deus me livre".

Não é mais político, agora vive dos rendimentos roubados de sua época de labuta. Agora está muito bem aposentado. O cara tinha o dom, muitos saíram da área quando viram que ele ia se aposentar. E deu no que deu. Quando os ratos saem é porque o barco está afundando.

E afundou mais rápido que o Titanic.

Meu punho ainda dói. Peço café pelo interfone e escuto a pequena escotilha do quarto girar, proporcionando a entrega da bebida sem que haja o menor contato humano. Afinal de contas, as pessoas geralmente estão nuas nesses quartos.

É por isso que eu gosto de motéis. O mínimo de contato humano possível num serviço de hospedagem.

Pego três cubos de gelo e jogo dentro do café. Cold brewed?

O motel está vazio. Nada acontece pelo resto da noite.

Café & Cigarros (amostra)Where stories live. Discover now