29.

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(Dorian)

Ela tinha cheiro de flores mortas, de menta e noite. Ela tinha as cores pálidas da imortalidade. Carol sorriu, chamando meu nome.

Mas Katherine estava lá. Ela cheirava a café, chocolate e sol. Ela resplandecia. Não sorriu, não chamou meu nome. Estava viva, pulsava.

Dei um passo em sua direção.
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Acordei às 5h em ponto, banhado por uma camada fria de suor e por uma terrível e abominável enxaqueca. Pulei da cama e tomei uma ducha gelada, como se a água pudesse apagar os rastros da noite anterior. No espelho, eu parecia mais velho, mais infeliz: a barba por fazer, as olheiras escuras.  Talvez já estivesse morto àquela altura.

Havia um bilhete escrito à mão sobre minha escrivaninha, letras redondas e pequenas. Dizia: Compre dipirona 1g e beba água. Eu falei que seria uma merda.

Sorri, a língua com gosto de guarda-chuva e ferrugem. Uma parte de mim exultou, como se na esperança de vê-la. Sua juventude, gentileza, sua autenticidade eram um bálsamo que adormecia ocasionalmente o vazio estéril que havia em mim.

"Você fica linda quando está brava" Lembrei-me de dizer.

"Eu não sei se isso foi um elogio." A memória de sua voz acordou meus nervos.

Álcool e coragem eram coisas extraordinárias perigosas, principalmente quando ela circulava em meu espaço de forma tão casual e confortável que me fazia imaginar: e se ficasse?

Afastei o pensamento. Ela era minha secretária. E havia... ele. Sim. Obviamente, Ian estava interessado nela, mesmo que não admitisse. Os olhos que a buscavam ávidos por todos os lugares, a voz e a postura que se desconcertavam por seu sorriso, o desejo que dardejava sua face quando ela se aproximava demais.

Acendi um cigarro, inalando a fumaça.

Eu precisava dar um fim ao ciclo vicioso entre nós. Aquela doença cármica que nos havia levado ao túmulo. Ianor e eu, que éramos sangue do mesmo sangue, sempre à mercê do obstáculo que nos polarizaria.

Havia uma chamada não atendia às 3 a.m dele. As mensagens da noite anterior de Katherine em minha caixa postal, no entanto, pareceram-me mais convidativas: você está bem? Não vá trabalhar, eu dou um jeito.

Eu estava sorrindo quando notei, sorrindo para a tela desbloqueada do celular, terrivelmente satisfeito. Liguei pra ela de imediato, a chamada não foi completada e caiu na caixa postal. Duas, três vezes, nenhum retorno.

"Estou vivo. Obrigada por ontem. Encontro você no escritório." Digitei, apaguei e digitei novamente: "desculpe o inconveniente. Obrigada por sua colaboração." Apaguei, odiando o tom formal e frio.

Por fim, enviei apenas:

"Você é uma ótima babá, se desconsiderarmos a boca imunda. Já pensou em mudar de profissão?

Dorian Bratv, CEO e chefe com ressaca"

Nenhum retorno. Nada até que eu estivesse encarando a xícara de café expresso diante de mim, duvidoso do que exatamente estava fazendo comigo. Aspirais fumarentos encheram o ar com aroma de dia e de pressa, enquanto eu me via refletido no mármore negro do balcão.

Mr. Bratv Where stories live. Discover now