Capítulo 11 - Conversa

34 14 9
                                    


Nos dias seguintes não deixei a fazenda. Não havia nenhuma negociação nova em curso e a produção estava a pleno vapor. Serviço era o que não faltava ali. E serviço era o que eu precisava para manter minha mente ocupada e me desligar dos meus problemas. Assim, a semana terminou sem novidades. Mas, aí chegou o sábado.

Sábado era dia de levar as crianças no catecismo. As aulas iam das 08:00 às 10:00, então eu as deixava no salão paroquial e aproveitava o tempo para fazer compras ou resolver pequenas pendências. Naquele dia não foi diferente. Desembarquei as crianças e fui à loja da Cooperativa Rural da cidade para comprar os insumos da semana. Seria um evento corriqueiro se não tivesse encontrado certa pessoa lá.

Sempre que encontrava meu amante em situações públicas, comportávamos como meros conhecidos. Nunca trocamos mais do que um "bom dia" ou "boa tarde". Mas, naquele dia ele mal me viu e já caminhou em minha direção. E não foi só isso. Sem nem mesmo me cumprimentar, começou a tirar satisfação, pedindo uma explicação sobre o fato de eu não atender mais as suas ligações. Como ele falava alto, acabou chamando a atenção de um tanto de gente. Eu não sabia onde por a minha cara. Saí correndo, entrei no carro e disparei.

Dirigi por muito tempo, sem rumo, desesperada. Não sabia bem por onde ia, apenas queria seguir em frente. Estava tomada pela vergonha. Saí da cidade, mas, não consegui ir muito longe. Parei no pátio do posto de gasolina, aquele mesmo no qual estacionei tantas vezes para me encontrar com o meu amante. Eu não estava aguentando mais aquela situação. A todo momento meu erro se estampava diante de mim. Enquanto eu não esclarecesse a situação com todos os envolvidos - meu marido, meus filhos e meu amante, não teria paz.

Mas, eu já sabia que não tinha escolhas. O escândalo de agora há pouco mudou as coisas por completo. Todo mundo já sabia que havia alguma coisa entre eu e o amante, pois, do contrário, ele não faria aquelas exigências em público. E mesmo que o fizesse, eu não sairia em disparada. Numa cidade do tamanho da nossa, em que todos se conhecem, não demoraria muito para que a notícia se espalhasse. Eu viraria o alvo número um das fofocas por um bom tempo. E o pior: toda a minha família ficaria exposta.

Fiquei ali por um bom tempo, aos prantos. No entanto, tinha que voltar, pegar as crianças e voltar para casa como se nada tivesse acontecido. Tinha que voltar ao mercado e efetuar as minhas compras, a fazenda dependia disso. Então, engoli o choro, retoquei o batom me guiando pelo espelho retrovisor e manobrei para pegar a estrada de volta. Neste exato momento outro veículo, velho conhecido, adentrou o pátio e parou diante do meu carro, impedindo que eu deixasse o espaço. Não tive como fugir da conversa.

-Posso saber por que você não me atende mais? - Meu amante me perguntou tão logo abriu a porta do meu carro e sentou-se no banco do carona.

-Está tudo errado. Não podemos continuar com essa história.

-Errado é você brincar comigo. Quando é conveniente para você, ficamos juntos. Aí você se cansa e passa a me ignorar. Nem uma palavra, nem um gesto. Some, simplesmente. Eu mereço mais consideração. Custa chegar para mim e dizer que não quer mais?

Nessa hora me deu vontade de falar das fotos. Mas não o fiz, pois estava temerosa. Não sabia quem estava por trás daquilo. Então, me saí com a desculpa clássica do nosso caso:

-Eu nunca lhe prometi nada.

-Mas, eu contava com o seu respeito, pelo menos.

-Estou lhe comunicando agora: não dá mais. Não me procure, nunca mais. Eu não quero mais errar com o meu marido, ele não merece.

-Então, você diz que não vai ficar comigo porque seu marido não merece um chifre? Você não precisa chifrar um marido para ficarmos juntos. Sempre soube disso. Eu sempre quis ser o seu marido. E não diga que não sente nada, não me convence, afinal, sei como se sente quando estamos juntos, na cama.

-Cama não quer dizer muita coisa? O que você sabe de mim fora dela? O que eu sei de você? Nada!

A discussão seguiu por esse caminho, ele tentando me convencer de que fôramos feitos um para o outro; eu tentando mostrar a inviabilidade de um relacionamento sério entre nós. Mas, tudo o que conseguíamos era nos ferir. Eu estava irritada pelo fato de ele ter me exposto ainda há pouco. Ele estava magoado com o meu desprezo.

-Perdoe-me por não ter conversado com você antes. Fui inconsequente e desrespeitosa, eu sei. É que não imaginava que fosse tão importante. No entanto, estou conversando agora. E o que tenho a dizer é o seguinte: não dá mais. Não vamos mais nos ver.

Aí ele passou a exigir uma razão, um motivo para o rompimento.

-Já não é motivo suficiente eu não querer mais? Não quero mais trair meu marido. Não quero perder a família linda que construí.

-Será que você não percebe que já perdeu?

Essa pergunta me assustou. Aquela suspeita de vingança me veio à mente na hora.

-O que você quer dizer com isso?

Ele desconversou. Disse que se eu considerasse minha família tão importante, se estivesse realmente satisfeita com o casamento, não teria me envolvido novamente com ele, etc. etc.

Não resisti e perguntei sobre aquela novidade de virar fazendeiro. Então ele contou que a tal visita à fazenda era só um pretexto para me ver já que eu, de uma hora para outra, não atendi mais suas ligações e nunca mais fora vista na cidade.

Aquela história estava indo longe demais e eu precisava por um ponto final naquilo. Com muito esforço consegui fazê-lo prometer que não me procuraria mais. Dessa forma, voltei para a cidade mais aliviada. sabia, no entanto, que meus problemas estavam longe de ter um fim.

Fazer as compras sob o escrutínio das pessoas foi constrangedor. Embora ninguém tenha feito menção ao fato, era evidente que o descontrole do meu amante havia chamado a atenção e ensejava muitas perguntas. No entanto, fiz "cara de paisagem" enquanto escolhia a ração, uns vermífugos, adubo e outros itens normalmente necessários em uma fazenda e fazia o pagamento no caixa.

Mais cedo ou mais tarde teria que dar explicações. Aquele assunto não iria morrer ali. Não demoraria muito e o Sr.B. saberia do acontecido e eu não sabia o que dizer. Minha vontade era chegar em casa, chamar o meu marido para uma conversa e contar tudo, dizer do meu arrependimento e deixá-lo decidir o que fazer. Mas, cadê a coragem?

No passado, quando traía o meu ex-marido, buscava justificativa no fato de que ele não me dava a atenção que merecia. Mas, e agora? Agora eu tinha o Sr.B. que era puro carinho; que vivia para mim e para as crianças. Eu que sempre fora mulher de ação, agora estava paralisada pela culpa e pelo medo de perder quem eu mais amava. Aquela situação estava insustentável e eu precisava tomar uma atitude. Mas, qual?

Novas Confissões da Trintona DescoladaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora