O início da mudança.

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(Tomaz)

Depois de longos e torturantes três meses, eu enfim pude ser considerado "curado". Infelizmente o alcoolismo não tem cura, tem controle. Mas eu sabia que não era alcoólatra, eu estava tentando mascarar a dor da perda da minha filha.

Se foi fácil? Não!

Me fizeram visitar o túmulo da minha filha uma vez por semana. Até que me dei conta que eu não tinha mais necessidade alguma de beber, nem vontade. Era só colocar toda dor pra fora, extravasar.

Contei com a ajuda de alguns amigos, em especial a Hannah, que enfim pôde também sair da clínica. Eu estava esperando o Fábio vim me buscar na frente do lugar quando sinto uma mão no meu ombro.

_Você ainda vai atrás dela?_Seu tom de voz é tão calmo.

_Sim, só que com outros pensamentos. Temos um filho ou filha. Eu quero acompanhar essa criança, quero que ela sinta que tem pai. Que pode contar comigo pra tudo, assim como fui com a Nathalie antes dela morrer._Suspiro olhando o brilho do sol._Eu e a Bianca talvez possa acontecer novamente... Talvez. Ela precisa querer porque se depender de mim eu sempre estarei pronto pra ela.

_Maduro da sua parte._Ela me abraça._Espero te ver outra vez, Tomaz. Aqui está meu cartão, ligue pra qualquer coisa.

Guardo o cartão no bolso e me despeço dela. A mesma entra em um carro e vai embora. Avisto o carro do Fábio de longe, aceno. Ele para e assim eu entro jogando minha pequena mala no banco do carona.

_Diferente._É a primeira palavra que ele diz a mim._Um diferente bom. Preparado pra tomar decisões a partir de agora?

_Sim, muito preparado._Sorrio olhando pro meu amigo._Pode me levar até a casa dos meus pais?

Ele assente e assim vamos o caminho todo conversando. Ele abre o jogo pra mim sobre a Bianca. Meu coração dói quando ouço que ela está namorando, mas acabo sorrindo.

_Você está sorrindo depois de saber que sua mulher supostamente pode estar transando com outro cara?_Sua voz soa desacreditada.

_Ela está cumprindo o que me disse naquela carta, meu amigo. E claro que iria aparecer alguém pra fazê-la sorrir como fiz no passado._Olho a paisagem pela janela do carro._Não nego que me dói, sou um homem extremamente possessivo, mas não ao ponto de chegar quebrando tudo e destruindo o recomeço dela. Eu quero saber do meu filho, o que tem entre mim e a Bianca só ela é capaz de dizer se tem conserto ou não.

_Uau!_Ele diz surpreso._Não tenho nenhum vício, mas preciso me internar nessa clínica. Que dinheiro mais bem pago, cara! Tu tá outro, mané!

_Agora me diz como irei atrás dela. Onde a Bê se enfiou?

Conversamos por mais tempo até que ele me deixou na frente da casa dos meus pais. Estava com saudades da cidade, dessa liberdade toda.

_Vou tirar as passagens e te encontro no aeroporto amanhã._Desço do carro._Irei com você.

_Tudo bem. Até mais então.

Ele vai embora e então eu entro na casa dos meus pais. Foi a maior alegria quando me viram, fizeram até eu discursar sobre como foi esses meses. Meus pais são incríveis!

Como pude passar tanto tempo submerso numa dor que estava destruindo a todos ao meu redor?

Depois de falar com meus pais e explicar a minha viagem, em que tive todo apoio, voltei pra casa. Eu precisava pôr ordem no lugar e arrumar uma mala. Fábio cuidou da minha casa, dos salários dos empregados e tudo mais. Pedi pra ele não tocar em nada que era da Bianca. Eu quis que fosse assim. Abri o guarda-roupa passando a mão nos poucos vestidos que ela deixou pra trás. Senti meus olhos queimarem, não evitei que as lágrimas descessem.

Eu fui tão babaca que minha mulher fugiu de mim.

Falei com os empregados, peguei algumas correspondências atrasadas e sentei pra olhar. Uma era de um advogado, avisando sobre a entrada no pedido de divórcio. Era de um mês e poucos dias atrás. Suspirei. Percebi que não existia mais nenhum resquício de garrafas de bebida na casa. Melhor assim.

_Vai querer jantar, Sr. Tomaz?_Ruth, a empregada doméstica, se aproxima cautelosa.

Confesso que fui muito rude com meus funcionários, é natural que tenham medo de mim. Claro que sabem que fui pra uma clínica, isso saiu nas revistas locais, mas talvez possam duvidar que eu tenha jeito.

_Chame todos os empregados da casa, Ruth. Dê um jeito de chamar o jardineiro também. Quero jantar com todos vocês, pode ser?

_Pode sim, Sr. Tomaz.

_Ruth?

_Sim?

_Você acha que um dia eu posso merecer o amor de alguém que magoei muito?_Eu estava inseguro, muito pra ser sincero.

_Se o Sr. for sincero sobre o que sente e continuar melhorando no jeito de ser, sim. A dona Bianca vai ficar não só orgulhosa, mas muito apaixonada novamente._Sorrio pela sua resposta._Desculpe, Sr. Tomaz.

_Obrigado, Ruth. Pode ir preparar algo pra todos nós.

Conto com isso, Ruth, mas sei que não vai ser fácil. A Bianca deve estar extremamente magoada comigo. E com razão, claro.

E pensar que eu cheguei ao ponto de negá-la na cama, no lugar onde nos entendíamos tão bem...

Tomei um banho, vesti uma roupa despojada e sentei na cama pra arrumar minhas malas.

Você foi pra muito longe, meu anjo. Pro lugar onde sempre planejamos ir nas férias.

Terminei de ajeitar as malas e desci pra jantar. Os seguranças, o jardineiro, a Ruth e a Felícia estavam me aguardando. Nos sentamos à mesa e assim pedi que cada um se servisse. Perguntei sobre a vida de cada um, sonhos, medos, desejos...

Eu realmente tinha que pedir perdão por todas as vezes que os tratei mal.

E pedi. Pedi de coração aberto e sorriso no rosto.

Eu preciso pelo menos tentar corrigir todas as burradas que fiz. Não é algo fácil, mas não é impossível. Eu sei que consigo.

Meu medo é que a maior burrada que fiz não tenha conserto. Eu quero pelo menos o perdão dela, isso eu preciso conquistar.

***

Tentando recomeçar - Duologia Recomeço  Onde as histórias ganham vida. Descobre agora