Cena 2

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CENA 2

Redação de jornal do interior. Um homem barrigudo e com os cabelos brancos está sentado em sua mesa bagunçada. Ele olha para uns arquivos colados na parede. Tira e põe os óculos o tempo todo. São arquivos da diagramação do jornal. Ele ainda é das antigas e prefere ver o jornal impresso e colado na parede à tela do computador.

— O que foi Marta? Eu estou te vendo pelo vidro da porta. Você ainda não é invisível, sabia? — Ele fala com certo gracejo, mas parece estar cansado.

Marta entra esbaforida na sala ainda puxando Óscar pela coleira e com a câmera na mão. Seus olhos estão vidrados e ela parece mais desesperada que de costume.

— Meu Deus, Marta, que cara é essa? — O homem fita o cachorro e faz carinho nas suas orelhas. — Eu adoro o Óscar, mas quantas vezes já conversamos sobre ele vir para a redação, Marta? Assim vou ter que incorporá-lo à folha de pagamentos, que já é pequena.

— Sandro, você tem que ver isso. — Fala Marta sem prestar atenção em nada que o velho falava.

— Ver o quê, Marta? Outro ataque de aliens? Já falei pra você parar com essas manias de teoria da conspiração. Você é uma ótima repórter, mas a sua reputação não ajuda as pessoas a acreditarem no que você escreve...

— Sandro, para de falar e olha isso. Tem alguma coisa bizarra acontecendo agora mesmo no canavial norte. A gente precisa ir pra lá. Eles querem segredo, tem um monte de engravatado e o seu amiguinho delegado estava com cara de palmito murcho.

(Enquanto Marta vai falando, Sandro pega a câmera para ver as fotos. Coloca os óculos de novo e respira fundo algumas vezes. Dessa vez ele se senta em uma das cadeiras do seu escritório. Respira fundo mais uma vez. Tira os óculos. Está atordoado).

— Quando foi isso, Marta? Como você conseguiu essas imagens?

— Óscar queria fazer xixi, não posso privá-lo de passear um pouco — disse Marta com cara de cachorro sem dono.

— Marta, Marta... Quantas vezes já conversamos? Você não pode sair por aí invadindo os locais e tirando fotos das pessoas.

— Mas, Sandro, isso é primeira capa!

— Isso o que? A gente nem sabe o que é ainda.

— E você não está vendo? Luzes que saem do chão, buracos do tamanho de um cometa, gente engravatada com cara de importante, o delegado com cara de palmito murcho. É claro que alguma coisa está acontecendo. Eu não estou falando nada de teoria da conspiração. Mas, porra, isso é quase um Arquivo-X!

Sandro dá mais duas respiradas profundas. Sente uma dor de cabeça surgindo e massageia a testa. Marta sempre lhe dá dor de cabeça.

— Marta, não posso publicar o que não sei...

— Então, tá. Vou agora mesmo enviar essas imagens pro jornal da capital. Aposto que em dois tempos eles colocam uma equipe aqui de prontidão e você vai ter que engolir mais um furo que não deu.

Sandro olha pra Marta com cara de poucos amigos.

— Vamos descobrir o que é isso. Vou publicar essas fotos no mural do leitor, assim não queimamos você, de novo, com os policias. Enquanto isso, vamos pesquisar e ver o que as autoridades vão falar quando virem as imagens publicadas.

Marta arregalou os olhos de decepção.

— Mural do leitor? Porra, Sandro! Você ta de brincadeira, né? Se fosse o Augusto, essa porra era primeira página. Mas como eu trouxe o furo, é essa merda de mural?

— Marta, você nem está mais trabalhando aqui. Lembra que está afastada? Não pode publicar nada afastada. Estou te fazendo um baita de um favor. Eu mesmo vou conferir essa história de perto.

— Nem a pau. A história é minha, eu checo. Pode me "desafastar". Mesmo porque, não tem motivos nenhum para me deixar longe. Se as pessoas não sabem lidar com os fatos, a culpa não é minha.

Enquanto falava, Marta ia arrastando Óscar para fora da sala. Pegou a câmera na mesa.

— Depois te mando as fotos de casa por e-mail. Aí você coloca no seu muralzinho...

Sandro continuava massageando a testa. Bufou algumas vezes e pegou o telefone logo depois de Marta bater a porta com uma puta agressividade.

— Aqui é o Sandro, quero falar com o delegado. Não está? E onde ele está? Atendendo alguma ocorrência? Como assim não pode falar, Vera. Sou eu, o Sandro. Como acha que vou trabalhar assim? Caso secreto? E desde quando a gente tem isso aqui em Capão dos Sonhos? Alô? Vera? Puta que pariu!

Sandro desliga o telefone nervoso. Pega o casaco da cadeira e disca de novo.

— Marta, onde você está? Me espera aí no estacionamento que vamos dar uma volta. Espero que o Óscar ainda tenha muito xixi nessa bexiga velha!


Marta e Óscar - em busca do segredo perdido!Where stories live. Discover now