Sobre poemas anônimos, garotos e amor - Livro I [COMPLETO]

Capítulo I: Cadernos perdidos

Porém, é óbvio, eu não tinha nenhum talento ou dom sobrenatural. Não que eles soubessem.

Deixei a folha com os exercícios respondidos na mesa do professor, saindo da sala após ouvir um "está se adaptando bem, Ella?". Era a terceira vez neste dia que ouvia essa mesma frase, ainda que já tenha passado duas semanas da minha chegada. Os professores sempre procurarão saber se você está bem, mesmo que eles não se importem nem um pouco com isso.

Apenas esbocei um sorriso no rosto, enquanto o professor dava atenção a outro aluno e eu tratava de sair da sala o mais rápido possível. Virei o corredor, indo até o meu pequeno armário azul e vendo, ao lado dele, uma menina de baixa estatura e cabelos curtos e escuros: Karyn.

— Louisie quer marcar de estudar depois da aula — falou assim que parei a sua frente, abrindo o armário e jogando alguns livros dentro. — Na minha casa, como sempre. Vamos direto para lá.

— Tudo bem — respondi com um aceno de cabeça e ela passou seu braço pelo meu, me puxando até o refeitório.

Karyn era, como todos chamavam pela escola, a Rainha da Física. Louisie, Evan e ela tinham um pequeno grupo de estudos, que funcionava sem uma data estipulada, e no qual eles trataram de me inserir assim que possível, sem nem consultar a minha opinião. Karyn era, fugindo de alguns padrões, a garota rica da escola que não era líder de torcida e, sim, a mais nerd de todas, com direito a notas dez em quase todas as matérias.

Louisie acenou para nós duas assim que entramos no refeitório, com seus cabelos ruivos balançando e Evan quieto ao seu lado. Pelos corredores, só se falava sobre o treino pesado dos jogadores e o quanto o treinador estava acabando com eles por causa do campeonato que estava chegando.

— Como vai minha mais nova amiga preferida? — Louisie me perguntou logo que me sentei.

— Ei! E eu? — protestou Karyn e eu dei risada.

— Eu estou bem — respondi e apontei para Evan. — Ele que não parece tão bem assim...

— O treinador pegou pesado ontem — respondeu a ruiva enquanto fazia carinho no cabelo do namorado, também ruivo. De acordo com Louisie, "as pessoas naturalmente ruivas estão quase desaparecendo do planeta, eles precisam se unir".

Os garotos do time estavam todos sentados em sua costumeira mesa, em silêncio como nunca antes e o refeitório tinha uma calmaria estranha. Karyn digitava algo no celular, enquanto Lou e Evan conversavam baixinho. Eu apenas olhava tudo o que acontecia em volta.

Ser a aluna nova e já conseguir me encaixar em um grupo, mesmo que não seja um daqueles muito convencionais, era lucro para qualquer um. Pelo menos, eu não estava sozinha, isolada em alguma mesa. Olhando ao redor, consegui avistar meu irmão, que teclava furioso no celular, entre alguns meninos que não estavam nem aí para nada. Algo estava errado entre ele e Juliet, mas eu não arriscaria tentar ajudá-lo nesses momentos.

— Você vai hoje, El? — perguntou Louisie e eu confirmei com a cabeça, fazendo-a sorrir. — Você vai conhecer o gato do irmão da Karyn, ele é da faculdade.

Ela falava de outros garotos como se o próprio namorado não estivesse ali, mas ele não se importava nem um pouco.

— Não sei qual é esse fascínio que Louisie tem com a faculdade — disse Karyn revirando os olhos. — É apenas uma fase onde te iludem dizendo que você vai fazer apenas o que quer e sair de lá desbravando o mundo. Quase um conto de fadas.

— Você é muito chata, Karyn — resmungou a ruiva e voltou a comer.

As últimas aulas passaram rápido, mais professores perguntando se eu estava me adaptando, fazendo amigos, tendo alguma dificuldade ou qualquer uma dessas baboseiras. Ao final da aula, seguimos para a saída da escola, quando eu percebi que havia esquecido um livro, que precisaria usar para fazer uma atividade, dentro do armário.

Louisie e Karyn ficaram me esperando do lado de fora, no pátio, já que Evan ficou para o treino, enquanto eu voltava correndo para pegar o livro. Já com ele em mãos, parei no meio do corredor quando reparei em um caderno caído no chão.

O caderno era todo branco, com exceção de alguns desenhos a lápis na capa e metade de suas folhas com algumas coisas escritas.

Poemas.