9 - Victória

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Eu gostava de ser o centro das atenções. Os olhos sempre estavam sobre mim em qualquer lugar que eu fosse.

Desde muito nova minha mãe já me ensinava os macetes do cuidado com a minha aparência. Eu fazia atividades físicas, sessões de massagem e drenagem linfática, não saía de casa sem estar maquiada, ia de forma constante ao salão de beleza e balanceava minhas refeições.

Eu gostava e me orgulhava por ser a mais bela dentre todas. No entanto, eu não havia calculado possíveis problemas que poderiam vir. Afinal, que problema eu poderia ter com uma vida tão perfeita? Será que tudo era perfeito ou eu estava vivendo uma ilusão?

E foi aos 16 anos que meus olhos se abriram...

– Victória, querida, vamos logo! – Chamou Vânia, uma das empregadas da casa.

Eu estava terminando de me arrumar para o jantar de gala que meu pai estava oferecendo, a fim de agradar clientes e atrair os sócios. A maioria não passava de um bando de velhacos repugnantes e o pior deles, era o "Malti"; sócio e amigo pessoal do meu pai.

Eu percebo... Eu estou assistindo a tudo e não mais vivendo. Eu estou me vendo, mas não tenho conexão comigo mesma. Eu estou sonhando? Ainda assim posso sentir a irritação me aferir, porém ela é a tradução de uma sensação muito pior: a humilhação.

Suas escapadas eram frequentes e eu sabia para onde iria. Direcionei-me ao escritório do meu pai, onde com certeza ele estaria bem "achegado" com alguma de suas conquistas recentes.

Quase coloquei a porta abaixo, ainda que ela não estivesse trancada e claro que percebi o susto das pessoas que estavam ali. Como eu já havia adivinhado, meu pai estava acompanhado. Aparentando vergonha, ela se retirou de modo apressado, ajustando a saia, e meu pai fechou a expressão e inqueriu:

– O que veio fazer aqui? Por que entrou desse jeito?

A irritação dele não era maior do que a minha, ou melhor, a dele não era nem um décimo da minha. Pausadamente, tentando engolir a raiva, pronunciei bem o aviso:

– Fale para aquele nojento do seu sócio parar de me importunar.

Virou-me as costas e falou desentendido:

– Não sei do que você está falando.

Não achei que minha indignação pudesse ficar maior. Mas, assim aconteceu. É claro que o meu pai sabia do que eu estava falando!

– O senhor não vai fazer nada a respeito, pai? – O intimei. – Aquele velho tarado tentou passar a mão em mim.

– Você está exagerando Victória – foi o que ouvi de resposta. – Além do mais, se não quer ser desrespeitada não dê motivos para o ser. Seu vestido justo e decotado é a prova disso. Você é a responsável!

Eu não podia crer no que ouvia. Como eu poderia ser responsável pelo caráter e dignidade de outros? Vi minha cara de indignação e descrença, e mal consegui expressar o que senti em palavras para aquele hediondo ser. Era notável o meu esforço para não soluçar em lágrimas, então, me ouvi falar pausadamente com uma ira incomensurável:

– Esse é um dos motivos pelos quais eu o desprezo.

Saí e bati a porta do escritório com mais intensidade do que quando entrei. Senti o leve tremor dela, mas, infelizmente, não foi o suficiente para fazer com que toda a casa viesse abaixo.

***

– Victória, acalme-se! Vamos! Reaja!

Ouvi alguém me chamar. Quem foi que me tirou daquele tormento? Acho que eu estou chorando, sinto o meu rosto arder. Mas, sinto que meu desespero foi arrancado de mim! Por quem?

– Está aqui, Daniel.

Era a voz da minha tia? ... "Daniel" outra vez? Quem era "Daniel"?

Senti que tocava o meu rosto. Acho que estava limpando as minhas lágrimas. Mas, por que eu não conseguia focá-lo? Eu não estava cega... Eu conseguia identificar as cores, as formas, a presença da minha tia, mas não podia ver quem era "Daniel". Por quê? Eu me esforçava para vê-lo, meus olhos se concentravam, mas meu cérebro não conseguia traduzi-lo. Por quê? Por quê?

– Ela está se alterando outra vez. Se continuar assim, teremos que voltar com os monitores e os medicamentos de sedação.

Não! Não! Não faça isso. Por que eu preciso de tantos cuidados? O que está acontecendo comigo? O que aconteceu antes para que eu mal consiga me mover? Não posso me mexer sem sentir dor! E minha voz? Por que não sai? ... Eu preciso me acalmar... Seja qual for, verdadeira ou não, esta realidade me parece melhor. Não quero estar de volta com meu pai, nem com toda a sua inércia. Preciso me concentrar... Não quero voltar! ... Posso sentir sua respiração próxima de mim. Parece que está me dando confiança e alento! Nele eu vou me concentrar!

– Da.niel?

– Eu não acredito! Vivi falou!

Sim! Eu consegui falar! Se minha tia não tivesse dito, talvez eu nem percebesse; pois eu desconhecia aquela voz que emiti. Eu estava cansada, com frio, com os olhos irritados, com os dedos dos pés e das mãos formigando, com falta de ar, com a garganta seca, com dores nas costas e no peito, mas eu não me deixaria envolver por esses. Eu precisava me concentrar para não ter que voltar. A realidade com meus pais era dura demais! ... Eu precisava me fazer entender! Eu precisava me manter! ... Eu precisava vê-lo! Eu precisava interpretá-lo! ... Eu precisava do Daniel!

Da.niel, me... ajude!


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Como terá sido a reação de Daniel nisso tudo? O que ele fará? 

Hoje ficaremos só com a visão da Victória (capítulos menores que os demais, embora esteja ficando maior - nossa Vivi está ficando mais forte?). Minha mente tem fervilhado de ideias e Adriel e Natiel não têm me deixado em paz ainda (hehe). Ainda assim, eu sei os passos que virão e torço para que Daniel mude esse destino. 

Até breve queridos! ;)

Música da multimedia: My Heart Is Broken (Evanescence)

FRAGILIZADO - Livro 3 [COMPLETO] - Trilogia Irmãos AmâncioOnde as histórias ganham vida. Descobre agora