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- Porra, Cameron! Eu disse-te para estares aqui às nove e meia, já viste que horas são? – Elevei a minha voz quando ele entrou na nossa sala da rádio.
- Dallas, Jess. Já disse que é Dallas. – Ele suspirou enquanto me revirava os olhos.
- Chamo-te como eu quiser! – Encarei-o irritada. – Irei-te chamar Dallas quando me respeitares e levares isto a sério!
- Estás a fazer uma tempestade num copo de água. Eu não estou assim tão atrasado. – Ele sentou-se no sofá, olhando para a tela do seu telemóvel.
- O quê? – Arranquei-lhe o aparelho das mãos, fazendo-o resmungar, mas ao menos consegui a sua atenção. – Já passa do meio-dia, Cameron! Eu estava a contar com a tua ajuda para o meu primeiro programa! Se a tua palavra serve tanto como merda, então para a próxima não me garantas que venhas!
A raiva está a invadir todo o meu corpo, fazendo-me andar de um lado para o outro na sala.
Não é que eu tenha precisado dele, não precisei e o programa correu melhor do que eu imaginei mas a questão aqui é ele e o voto que quero depositar nele.
- Dizes que não és como as pessoas te pintam, como me queres provar isso? – Parei diante dele.
- Eu peço desculpas, ok? Ontem fui sair e adormeci, podes parar de agir como a minha mãe, por favor? – Ele está tão descontraído que enerva.
- Como tua mãe? – Eu gargalhei, cruzando os meus braços. – Olha para a minha cara, tenho cara de quem quer ser mãe de alguém? – Elevei a minha voz.
Ele nada pronunciou, ficou simplesmente com aqueles seus olhos castanhos postos em mim.
Respirei fundo.
- Eu não sou tua mãe, é verdade, mas estava a dar-te uma oportunidade, coisa que pouca gente faz contigo. – Baixei um pouco o meu tom de voz mas ainda soava rígida. – Não voltarei a mentir ao teu pai quando ele perguntar por ti, não vou encobrir as tuas merdas porque estou a ver que estava certa em relação à tua pessoa.
O seu olhar desceu e ele mordeu o seu lábio. Espero sinceramente que ele se esteja a sentir culpado porque não sei o que fazer para o chamar atenção.
Ele não é a porra de uma criança, por isso, que se comporte como um homenzinho.
- Eu sei que estive mal. Desculpa. – Ele falou baixinho e quando os seu olhar subiu até ao meu, eu pude ver que ele estava a ser sincero.
- Chegas sempre atrasado, não posso continuar assim. Eu conto contigo para as cenas e tu simplesmente estás-te nas tintas. – Sentei-me ao seu lado.
- Eu sei que não estou a facilitar as coisas e sei que isto é importante para ti...
- Exato. Hoje encobri-te mas não o voltarei a fazer, Dallas. – Encarei-o mais calma.
- Só mais uma oportunidade. – Ele olhou-me com um sorriso nos lábios.
Aposto que é com este sorriso que ele conquista as miúdas, não as censuro, ele é muito bom nisto.
- Tudo bem. – Sorri-lhe, suspirando. – É a ultima, Dallas.
- Prometo que farei o meu melhor. – Ele parecia firme nas suas palavras.
Espero mesmo que ele leve isto a sério.
- Isso não será o suficiente. – Assegurei-lhe.
- Entendido, generala. – Ele levou a sua mão à sua testa, fingindo sentido.
Ambos soltamos uma gargalhada.
- Tudo bem. Falando do que realmente importa, tratas-te do que te pedi? Em relação ao site?
- Eu? – Ele olhou-me confuso. – Estava à espera que me desses os papeis. Não mos entregaste.
- Não? – Entreolhei-o surpresa.
Como deixei este pormenor me escapar?
- Nop. – Ele negou. – Como pode ver, a chefe também não facilita o meu trabalho. – Ele brincou.
- Olha as piadinhas, menino Cameron. – Brinquei também.
Levantei-me procurando nos papeis espalhados pela minha mesa.
- Dallas! Vá lá, estavas a vir bem, Jess. – Ele implorou.
- Tudo bem, Dallas? – Ri.
Mas logo o meu sorriso caiu, não encontro os papéis.
- Não sei onde eles estão. Se calhar nunca os cheguei a trazer.
- E onde estão?
- Em casa. Espera quinze minutos, vou a casa busca-los. – Informei-o enquanto pegava na minha mala.
- E eu vou ficar aqui? Sozinho? – Ele travou-me.
- Precisas de Baby-sitter? – Provoquei-o sorrindo.
- Não! – Ele respondeu ofendido. – Mas o meu pai pode aparecer, e eu não dormi em casa e também não lhe quero dar justificações.
- Tudo bem. – Suspirei. – Podes vir comigo.
Ele esboçou um sorriso vitorioso e seguiu-me.
- O teu carro é mesmo de menina. – Ele gozou quando parei o carro à porta do meu prédio.
- Para a próxima o menino vem a pé, ou não! Melhor! Fica a falar com o seu paizinho que aposto que o quer felicitar pelo seu empenho e confiança. – Ironizei.
- Autch, essa doeu McVey. – Ele brincou.
- Se fosse no meio das pernas doía mais. – Provoquei-o rindo.
Ele baixou o seu olhar e as suas mãos caíram sobre as suas calças de ganga claras, tapando a zona dos seus órgãos genitais.
- Não serias capaz. – Ele encarou-me.
Eu soltei uma gargalhada e saí do carro.
- Espera! Eu vou contigo. – Ele saiu do carro, seguindo-me novamente.
- Começo achar que tu gostas é de ser a espécie de um cãozinho atrás de mim. – Provoquei-o.
- Ao menos, as vistas são boas. – Ele riu e eu virei-me para trás, fazendo um olhar ameaçador.
- Pronto, desculpa. – Ele elevou as suas mãos em sinal de redenção. – Agora, não tenho culpa que essas calças salientem o teu rabo. – Riu.
- Sabes o que irá salientar a tua cara? – Elevei a minha mão no ar.
- Pronto, pronto. Desisti. – Riu.
Subi as escadas até ao segundo andar, fazendo questão de que ele as subisse ao meu lado.
Quando cheguei à minha porta, fui recebida com uma música aos altos berros.
- Vives aqui? – O Dallas entreolhou-me confuso.
- A Ella deve estar em casa. – Dei de ombros levando as chaves à fechadura.
- Não moras sozinha? – Questionou-me.
- Não, moro com uma das minhas melhores amigas. – Respondi-lhe, abrindo a porta.
E ali estava ela, na cozinha, a dançar de pijama de verão, porque esta casa é realmente um forno.
- Oi? Ella! – Chamei a sua atenção quando baixei o som da aparelhagem.
Ela virou-se, ficando simplesmente sem reação.
O seu olhar voou do meu e parou no do Dallas, continuando imóvel.
- O-olá. – Ela gaguejou.
O seu rosto estava a ficar, como diz a expressão, mais vermelho do que um tomate.
Aposto que é por estar nestes preparos em frente ao Dallas. A Ella sempre foi uma rapariga muito resguardada e envergonhada.
Pelo menos, espero que o que ela tem com o Connor melhore esse aspeto nela.
- Desculpa, eu esqueci-me de uns papéis. – Justifiquei-me, acabando com a falta de diálogo naquele espaço.
- Tudo bem. – Ela encarou-me, não se movendo uma vez mais.
- Já venho. – Falei para o Dallas mas ele parecia estar focado na Ella, não me dando qualquer resposta.
Fogo, este gajo é mesmo um caça ratas. Chega a ser triste.
Não posso perder tempo, então fui até ao quarto deixando aqueles dois para trás.
Quando voltei o Dallas continuava encostado às costas do sofá e a Ella ao lado na ilha que temos na cozinha. Ambos imoveis e entreolhando-se.
Mas que raio se passa aqui?
Fui até ao Dallas e agarrei-o pelo braço, puxando-o.
- Ei Jess! – Ele queixou-se.
- Até logo, Ella. – Olhei-a por uns segundos antes de sair de casa.
Desta vez ele desceu as escadas à minha frente.
- Precisavas de me tirar dali daquela maneira? Nem me despedi da tua amiga. – Ele resmungou.
- Eu vi bem como a olhavas, se ela fosse chocolate já lhe tinhas dado uma trinca. – Ironizei, abrindo o carro.
- Eu gosto de chocolate... – Ele brincou e entrou no carro.
- Mas ela não é pro teu dente. – Encarei-o seriamente.
- Isso, só ela pode dizer. – Ripostou.
- Não te vais meter com a Ella, Dallas. Livra-te de te aproximar de alguma das minhas amigas! – Avisei-o, metendo o carro em andamento.
- Não olhei para todas as tuas amigas, estamos só a falar de uma. – Desafiou-me.
- A Ella é boa demais para ti. – Assegurei-lhe. – Ela é diferente, é uma miúda especial e merece alguém que goste dela, não um gajo que a quer somente comer.
- Pelo que me tomas? – Ele falou ofendido.
- Cameron, por favor. – Encarei-o por uns segundos e voltei a olhar para a estrada. – Não queres que eu responda a isso.
Ele ficou calado.
Não o quero ofender mas ele sabe bem a vida que leva e eu sei que a Ella nunca se interessaria por uma pessoa como ele.
- Aproximaste dela e és um homem morto. Não a vais magoar. – Ameacei-o.
- Tu fazes muitos ultimatos para o meu gosto. – Ele suspirou, olhando pela janela.
- É para ver se acordas para a vida. Não sou tua mãe, mas estou a ver que preciso de agir como se fosse a madrasta má.
Ele soltou um pequeno riso e eu ri também, aliviando o nosso ar.

Do Avesso 1Where stories live. Discover now