Capítulo 4 - O Gerente

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Os pais do jovem estavam a aguardá-lo sentados na recepção do hospital. Era uma sala grande com as paredes pintadas num tom bem claro de salmão, com sofás bonitos e confortáveis. No chão ao lado do sofá e sobre a mesinha de centro há revisteiros servidos com algumas revistas de medicina e algumas revistas comuns da semana corrente. Nos cantos da sala podemos ver plantas em vasos decorativos muito bonitos. Nas paredes, quadros abstratos dignos de testes de Rorschach. Eles ainda estavam muito preocupados com seu filho. A indefinição de exames atrás de exames destruía os seus nervos, mas bebiam água, tomavam café, e a angústia parecia diminuir um pouco. Apenas um pouco.

No ínterim, a aparição do filho que vinha vez em quando na recepção para vê-los deveria infundir-lhes algum grau de conforto. Mas, aquele era mesmo seu filho? Alguma coisa havia mudado, sabiam. Não sabiam, porém, se a mudança era originária da nova situação do filho, já que agora ele era deficiente, ou se a mudança era deles mesmos.

Foram os primeiros a se encontrarem com o gerente. Viram o terno preto, impecável, comprado numa loja cara do centro da cidade. O homem, do alto de seus 1,88 m, se portava como alguém mais alto, mais importante e mais rico do que realmente era. Mauro Coelho treinou durante anos com o objetivo de parecer alguém importante. E parecia realmente. Havia treinado a sempre manter a coluna ereta o máximo possível, a estufar o peito e sempre olhar diretamente no fundo dos olhos de qualquer pessoa a quem dirigisse a palavra.

No início, demorou a encontrar um meio termo sobre se deveria postar-se como superior apenas com pessoas que lhe eram subordinadas e com clientes que não tinham tanta importância comercial, ou se mesmo com pessoas que lhe eram superiores deveria se postar do mesmo jeito. Decidiu que se postaria com todos da mesma maneira, isso seria sua marca indelével. A única diferença, que na verdade era algo quase imperceptível a pessoas que não fossem boas observadoras, era que ao apertar as mãos de seus superiores ou de clientes com quem tivesse fechado negócio lucrativo, deixaria sua mão embaixo da mão da outra pessoa para dar-lhe, pelo menos naquele momento, a impressão de que estava no controle da situação. Também, não fixava o olhar diretamente nos olhos do outro, desviando sempre o seu olhar para passar a impressão de que estava um pouco intimidado com a postura do seu interlocutor. Um dado curioso é que sempre que acontecia isso, ele tinha o cuidado de não parecer desconfiado, sempre desviando o olhar. Não poderia passar a impressão errada.

Ao avistar os pais de seu empregado foi cumprimentá-los. O pai, Sr. Milton, já lhe era conhecido posto ter sido antes do filho um dos seus principais representantes comerciais. Porém, não lembrava do nome da mãe. Por mais que já lhe tivesse visto várias vezes, não conseguia lembrar nunca do seu nome. Era uma descortesia da qual ele não gostava, mas servia, de qualquer maneira, para fazê-lo sentir-se superior.

O Sr. Milton levantou-se para cumprimentá-lo. O gerente, internamente, sentiu-se lisonjeado com a reverência que seu ex-subordinado insistiu em fazer-lhe. Em sua mente, decidiu que seria o mais amável possível. Não sabia a complexidade do problema que esta família estava passando e não queria que lhe considerassem um homem duro.

- Bom dia Milton, senhora... Onde está nosso paciente? – Perguntou amavelmente o gerente.

- Não está nada bem. Nosso filho não está bem. Aconteceu algo terrível! – Falou Dona Márcia, começando imediatamente a chorar.

O gerente ficou desconcertado com a choradeira da mulher e chegou à conclusão de que algo realmente grave deveria ter acontecido. Voltou o olhar em direção de Milton procurando outras informações para melhor situar seus próximos comentários e para ter novas peças que lhe ajudem a montar melhor o quebra-cabeça que era esta situação. Mesmo que o pai fosse muito mais controlado que a mãe, estava quase tão abalado quanto sua esposa, posto que não conseguia falar coisas adicionais ao que Márcia já havia dito.

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⏰ Last updated: Jul 11, 2017 ⏰

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O Homem Que Não ExistiaWhere stories live. Discover now