Segredos de Ellera

O inverno já chegou

Nessa época do ano tudo parece morto, não há pássaros cantando e o vento também não faz som algum. A floresta, o céu e as montanhas tornam-se indistinguíveis, em meio a uma gigantesca paleta alva, e as terras que alguns meses atrás estavam sendo cultivadas, agora faziam parte desse grande lençol pálido da neve do inverno. Cercada pela floresta, a casa de aparência aconchegante, porém robusta, era a única a ser vista nos arredores brancos. O ruído do machado batendo contra a madeira e a respiração ofegante do homem que o empunhava, formavam a única melodia audível em quilômetros.

- Senhor, tem um momento?

O homem se preparava para desferir um golpe em outro pedaço de madeira, quando o vazio em sua mente se foi e ele percebeu a presença daquele senhor encolhido em uma capa marrom, tentando se proteger do frio.

- Edgar!? Finalmente, já faz mais de uma semana! Achei que fosse enlouquecer nesse lugar sem ninguém para conversar.

As mãos que a poucos segundos seguravam o machado agora abraçavam com alegria o outro homem.

- Mas e Helga, senhor? Tenho certeza de que ela adora uma boa conversa.- disse Edgar com um sorriso sarcástico no rosto.

- Aquela mulher passa o dia todo no quarto lendo seus livros. Ela só abre a boca para perguntar o que eu quero comer, você sabe muito bem disso.- o sorriso foi devolvido- Mas então, meu amigo, me conte o resultado da sua missão, o Hëgger nos enviará para outras terras no ano que vem?

Uma expressão séria tomou conta do rosto de Edgar.

- Desculpe senhor, ele disse que todas as outras terras já estão ocupadas pelos seus generais e suas respectivas...- o homem não deixou que Edgar terminasse sua frase.

- A colheita desse ano foi a pior que já tivemos! - os sorrisos de agora a pouco já não existiam e o homem aumentava o tom de sua voz.- Droga, o acordo é simples, ele nos dá as terras e nós enviamos uma parte da produção pra ele. Como aquele desgraçado quer alimentar seu exército se não nos dá terras novas para plantarmos? Nós estamos aqui, isolados da civilização, já fazem quase 7 anos. Esse solo já não era bom quando ele nos deu e a cada ano só fica pior, quase não dá frutos e ainda sim ele espera que entreguemos uma produção farta para os seus homens. Eu já estou cansado dessa idiotice. Amanhã sairei de viagem e eu mesmo vou conversar com esse velho.

- E-Eu não acho que confrontar a decisão de um Hëggar seja uma boa ideia, senhor.- disse Edgar em tom preocupado.- Ele disse que se continuarmos trabalhando bem, talvez ele nos dê terras novas em alguns anos.

- Alguns anos? A vila mais próxima daqui fica a 4 dias de viagem, isso se os cavalos estiverem com vontade e não fizermos paradas muito longas. Eu já não sou mais tão novo, Edgar, e ainda não encontrei uma mulher disposta a carregar meus filhos, e a cada ano que passa só vai ficando mais difícil.- fez uma pausa por alguns segundos e então disse - Edgar, pega o meu casaco e o meu arco, eu vou sair pra caçar. Preciso esfriar a cabeça.

Com os punhos cerrados ele deu as costas para Edgar, se apoiou na cerca e ficou encarando as árvores na floresta. Alguns minutos depois, seu funcionário volta com o que ele havia pedido:

- Tem certeza de que deveria sair para caçar agora? O inverno já começou, os lobos cinzas já devem ter ido embora e os brancos devem estar começando a aparecer.

Sem resposta. Ele nem mesmo olhou para Edgar enquanto colocava o casaco.

- E eu devo pedir para Helga preparar algo para o jantar?

- Ela vai fazer Lobo.