Tape 1, Side B

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Caminho devagar com as mãos para trás, com a cabeça baixa, encarando a grama, onde meus pés chutam para o alto todo vestígio de água da chuva que caiu hoje mais cedo.

Estou imerso em meus pensamentos, e o que passa em minha volta se torna inútil.

Louis era forte. Impermeável como uma pedra, nós nunca sabíamos o que de fato passava por sua cabeça. Louis se sentia responsável. Ele cuidava de todos nós, mesmo quando não nos dávamos conta. Ele se preocupava com as pessoas e queria vê-las felizes, nem que isso custasse sua própria felicidade. Louis se sacrificava. E ele se sacrificou.

— Bom dia, Harry! — O senhor barbudo de sobretudo verde musgo e cachecol vermelho, diz ao passar por mim.

— Bom dia, Senhor Morris. — Respondo, sem muita animação, acenando levemente com a cabeça.

— Sua mãe disse que você viria! — Ele caminha ao meu lado. — Então separei algumas coisas na loja que achei que você gostaria. Passe por lá depois!

— Obrigada, Senhor Morris. — Finjo um sorriso para o mesmo que logo passa em minha frente indo em direção à sua vendinha de itens para colecionadores, ainda de portas fechadas, do outro lado da rua.

São sete da manhã. Está frio aqui fora. Mas eu precisava de fato sair para pensar. Portanto assim que finalizei a primeira fita, desci as escadas na ponta dos pés e sai pela porta sem que ninguém notasse e me enchesse de perguntas. E aqui estou eu! Na praça central da cidade, andando sem rumo algum, já há um bom tempo.

Cedo-me ao cansaço do meu corpo, que não conseguiu pregar o olho depois de tudo que ouviu, e sento-me em um banco, próximo aos escorregadores enferrujados. Não há uma alma viva aqui. Afinal, quem sairia com seu filho para brincar numa manhã tão fria dessas?

— Bom dia, menino Harry! — A dona da confeitaria que frequento desde que era criança, passa por mim. — Caiu da cama?

— Bom dia, Senhora Clark! — A encaro com um sorriso no rosto. — Hm... Sim! Perdi o sono. — Respondo enquanto a mesma que já caminha em direção à sua confeitaria, também do outro lado da rua.

"Na verdade eu nem dormi, Senhora Clark!", meu pensamento a responde com sinceridade.

Coloco as mãos geladas dentro do bolso e aspiro a corrente de ar congelante que passa por aqui. Cerro os olhos mirando aqueles escorregadores em minha frente e no segundo seguinte, já estou mergulhado em meus pensamentos novamente.

Sempre pensei que juramentos, precisassem ser cumpridos com rigor. Que quando se faz uma promessa, ela deve ser pra valer. Que independente do que houvesse, ela seria o que era. Para sempre!

— Venha Harold! Você é um fracote! — Louis corria para o banco ao lado dos escorregadores enferrujados da praça central de Holmes Chapel. Eu estava exausto, carregando a enorme cesta de piquenique que Anne havia feito para nós. Louis sabia que era por isso que eu estava tão devagar, mas ele sempre gostou de me provocar. — Você está parecendo a minha tataravó, Harold! Anda logo!

— Você nem conheceu sua tataravó, Louis! — Retruquei, finalmente o alcançando, colocando a cesta sobre o gramado verde e jogando meu corpo cansado ao seu lado naquele banco velho, que nos dava uma visão privilegiada de um grupo de crianças disputando um lugar no escorregador mais alto.

— Eu não conheci, mas aposto que ela era mais rápida que você! — Louis respondeu imediatamente e logo rimos juntos. Ficamos calados por alguns segundos nos recompondo. — Aqui está perfeito! — O mesmo analisou o gramado debaixo de nossos pés. Ele estava florido e parecia tão vivo.

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