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Nova Orleans, Luisiana, EUA – 28 de agosto de 1998

Era noite em Nova Orleans, uma cidade aparentemente tranquila, situada no Estado americano da Luisiana — tranquila por, pelo menos, há sete anos. O céu estava encoberto por nuvens densas e pesadas, prontas para despejar a chuva que acumulavam desde o início do dia. O vento forte e frio soprava intensamente, fazendo as árvores dançarem e as folhas caídas se erguerem. As luzes amarelas dos postes iluminavam as ruas desertas, com as famílias se protegendo em suas casas.

Estavam refugiadas.

O som angustiado de pássaros noturnos também à procura de abrigo ecoou pelo céu.

Todos sentiam a presença do inimigo.

Mas não era apenas a tempestade que se esperava.

O estrondo de uma explosão interrompeu a "paz" da cidade. O medo dos pássaros não era da chuva, mas da ameaça. Mesmo sem raciocínio, seus instintos gritavam para que fugissem o mais rápido possível.

E, do local da explosão, vinham gritos de terror e morte.

— Querida, precisamos ir! — Um homem correu para o quarto onde sua esposa, prestes a dar à luz, estava deitada na cama velha e estreita demais para duas pessoas adultas.

— Ela não pode sair agora, o bebê vai nascer! — protestou a enfermeira e amiga do casal.

Mas o grito da mulher em trabalho de parto os interrompeu. O futuro pai estava nervoso com o caos lá fora e aflito com o sofrimento da esposa. Ele sabia o que os esperava se não agissem rápido.

E não era algo bom.

Gradualmente, a cidade foi consumida pelo caos. O terror se espalhava sem controle, as casas eram invadidas, revistadas e destruídas por um clã impiedoso que surgiu de repente. Famílias perdiam seus entes queridos sem a menor compaixão pelas mãos desses monstros destruidores. Eles eram cruéis e egocêntricos, não hesitando em matar, seja uma pessoa idosa e frágil ou uma criança indefesa.

O resultado foi um massacre sem fim.

O jovem homem estava cada vez mais angustiado, principalmente com os gritos dos moradores. Ele estava perdendo a esperança de conseguir escapar e sobreviver. Seus pensamentos estavam mergulhados no pessimismo profundo enquanto arrumava uma pequena mala com o que era necessário para a fuga. De repente, tudo ao seu redor foi esquecido quando um choro agudo e escandaloso se espalhou pelo cômodo.

Seu filho finalmente havia chegado ao mundo. Sem pensar, o homem parou o que estava fazendo e se virou para a enfermeira que segurava o recém-nascido.

— É uma menina — informou ela com um sorriso alegre no rosto enrugado.

Sem dizer uma palavra, o homem apenas pegou a pequena nos braços: sua filha. Mesmo no meio de um massacre, ele não conseguiu evitar sentir uma emoção incrível e nunca experimentada. Ele sentiu o amor paterno crescendo dentro de si, ainda maior do que imaginou que seria. Era tão poderoso, tudo tão novo, tão... Gritos! Mais uma família morta, concluiu ele. Fitou com determinação o rostinho de sua filha. Tudo o que queria era encontrar uma forma de escapar com as duas pessoas mais importantes de sua vida para protegê-las. E faria isso, pensaria no possível e no impossível e até mesmo sacrificaria sua vida por elas se necessário.

A raiva ardeu em seu peito. Era necessário!

— Clotilde! — Esse era o nome da enfermeira, que o olhou com atenção. — Pegue minha filha e leve-a para o carro! — ordenou, entregando a criança a ela.

Em seguida, Clotilde envolveu a criança em uma manta macia e espessa o suficiente para mantê-la aquecida diante do frio que enfrentariam, e saiu da casa. O homem, então, pegou sua esposa nos braços e a levou para fora. Rapidamente, ele voltou para pegar a única mala que mal havia preparado. Entrou no carro de cor desbotada e, com tudo pronto para a fuga, bateu com força os punhos cerrados no volante de couro rasgado, lembrando-se do item mais importante do mundo.

IMORTAIS: Mundo Sombrio - Livro 1Where stories live. Discover now