Capítulo 1

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— Eu quero um expresso, por favor.

O dono do estabelecimento, um rapaz alto, de barba baixa, continuava distraído, mesmo com um senhor de aparentemente cinquenta anos de idade em sua frente fazendo o seu pedido.

— Moço, eu quero um expresso. Pode me ouvir?

— Pode deixar que vou atendê-lo. Só um minuto, por favor. — declarou Priscilla, olhando para o senhor e agarrando o braço do amigo Rodrigo. — O que está fazendo? Desse jeito o "Targliese Café" vai à falência!

— Desculpe, Pri. Alguém estava me chamando?

— Claro, Rodrigo! É aquele senhor ali que está quase tendo um treco de tanto esperar. — falou, apontando para o senhor, que agora tinha sentado em uma das mesas.

— Eu não estou bem... Nós precisamos conversar.

— Tudo bem. Quando fecharmos aqui para o almoço, vamos para casa e você me conta tudo.

Priscilla preparou o expresso do senhor de idade. Enquanto isso, Rodrigo continuou pensativo. Os dois moravam em São Paulo e eram amigos desde a infância. Mas resolveram se mudar para o Rio de Janeiro, onde fundaram a cafetaria "Targliese Café". Já fazia dois anos, e com um pouco do dinheiro que ganhavam, eles investiam em cursos de teatro, porque sonhavam em atuar.

Os pais de Priscilla gostaram muito da atitude da filha. Eles achavam que ela tinha talento e sonhavam em vê-la um dia na telinha. Mas os pais de Rodrigo não gostaram muito bem da ideia. Eles almejavam que o filho trabalhasse na revista "Top dos momentos". Esta revista foi criada pelo seu pai Evaristo, e era uma das revistas mais vendidas em São Paulo.

Quando chegaram em casa, Rodrigo sentou-se no sofá e estava bastante nervoso. Priscilla não estava entendendo porque o amigo estava daquela forma. Então se sentou ao lado dele.

— Desde aquela ligação dos seus pais, você ficou muito estranho. E hoje, quase que o senhor te espancou lá na cafeteria por causa de um expresso.

— Eu sinto muito. Sei que a cafeteria é muito importante e nós investimos o que tínhamos nela... Mas eu estou com um problema bem sério, Priscilla. E quero muito que você me ajude.

— E lá vem bomba! O que foi dessa vez?

— Eu disse para o meu pai que eu tenho uma namorada!

— Você disse o quê? Me belisca, pelo o amor de Deus, porque eu não estou ouvindo isso!

— Eu também não queria dizer isso, mas eu não tive saída!

— Você não teve saída? Como assim? Por que não conta logo que é gay?

— Eu não posso. O meu pai é dono de umas revistas mais vendidas de São Paulo. Iria ser um grande escândalo! Além disso, tem uma parte da revista que fala de famílias tops! E famílias tops na visão dele, são famílias tradicionais.

— Você já me disse isso... Mas não tem como você esconder uma coisa dessas da sua família.

— Não? Para você é fácil, né? Você é hétero e nunca beijou uma mulher!

— Mas com o meu trabalho, posso beijar uma um dia.

— Pode... Mas não vai estar fudido como eu! Eu sou gay e nada vai mudar isso.

— Por isso, você tem que dizer a verdade aos seus pais. Para quê ficar se machucando desse jeito?

— Não adianta, Priscilla. Você não me entende.

— É... Não entendo mesmo uma pessoa que quer esconder sua felicidade.

— Chega! Não quero mais ouvir. — ele levantou-se. — Os meus pais vão chegar aqui amanhã e hoje nós dois precisamos arrumar uma namorada para mim.

— Nós dois? E você ainda vai me colocar nessa furada?

Ele se agachou aos pés dela, pegando em suas mãos.

— Priscilla, você precisa me ajudar. Eu não posso passar vergonha diante dos meus pais. — fez cara triste — Por favor! Eu nunca te pedi nada... — ele riu.

— Não faz essa carinha, Rodrigo... Eu tenho coração mole. Você sabe...

— Por favor! Eu te prometo que não te aborreço mais com isso e ficarei mais atento aos clientes no nosso café.

— Tudo bem... — revirou os olhos. — O que eu não faço por você, hein, meu amigo lindo?

Os dois se abraçaram. E Rodrigo todo feliz, deu um beijo na bochecha dela. Após o abraço, ele sentou-se ao lado dela novamente.

— O que você acha que eu escolho? Loira? Morena? Ruiva?

Priscilla sorriu, mostrando os dentes com o aparelho.

— Não. Eu não estou ouvindo isso, Rodrigo. — riu novamente — Nós não temos que ficar preocupados com a aparência física. Temos que achar uma pessoa, primeiramente, que aceite essa palhaçada.

— Não pense assim. Pense que isso é um trabalho, e precisamos atuar muito bem.

— Atuar? Vamos encenar a sua vida amorosa, é isso mesmo?

— Basicamente, sim.

Ela riu de novo.

— Priscilla, é sério. Eu estou aqui a mil. Não quero que nada dê errado.

— Ok... — pensou um pouco — Quando abrirmos o nosso café hoje à tarde, com certeza aparecerá garotas... E vamos analisar... Se você gostar de alguma, vai ser essa mesmo.

— Ok. Mas vamos analisar muito bem, porque você sabe como é o meu pai. Se eu aparecer com uma mulher toda putona, ele me mata!

— Ele vai te matar se descobrir o nosso teatro, isso sim!

— Deus me livre! Tá amarrado! Vai dar tudo certo.

— Tomara, né? — pensou um pouco — Por que você não disse que continuava solteiro, hein? Pouparíamos nós dois de tudo isso.

— Então... Ele quer conhecer a minha namorada e postar na revista...

— O quê? Não... Isso está indo longe demais, Rodrigo.

— Eu sei... Só que já faz muito tempo que ele me cobra, dizendo: Quando você vai me mostrar sua namorada? E eu, meio que já tinha dito que estava namorando alguém, que no caso é o Hugo. Mas não tive coragem de falar a verdade... E depois que eu falei essa mentira, ele disse que gostaria muito de fazer uma entrevista para a revista. Aí, não tive coragem de desmentir, porque você precisava ouvir como o meu velho ficou mega feliz com a notícia.

— Fudeu tudo mesmo! Se eu achei que não ficava pior, ficou!

— Vai ficar tudo bem, Priscilla. É só uma entrevistinha de nada... Se brincar, nem vai ter foto.

— Você não precisa ficar preocupado com a minha reação. Mas com a do Hugo, o seu namorado.

— Caramba, é mesmo... — falou, preocupado — Será que ele vai entender?

Natiese em : Saindo do armário (1 temporada) Место, где живут истории. Откройте их для себя