Nada está tão ruim que não possa piorar

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Desde então Claire e eu mantemos uma firme amizade até sermos separadas por Stanford e Princeton.

Mas não é isso que está pensando! Nenhum curso será capaz de nos separar.

A Claire é capaz de mover céus e terras para me ver. E eu não estou me exibindo. Ela é daquele tipo de amiga que quando faz uma amizade não desgruda jamais. Pra mim isto foi maravilhoso, por que antes dela eu não tinha muitas pessoas ao meu redor que não fosse da família e é claro, alguns colegas. Mas nunca uma amiga de verdade.

Deixando a nostalgia de lado fui descendo os degraus da escada parando direto na cozinha.

Como de costume peguei um prato e enchi de rufles depositando uma boa quantidade de molho barbecue por cima.

Sério: a mistura fica uma delícia.

—E quando começam as suas aulas? –perguntou minha mãe roubando uma batata do meu prato.

—Ei, isso é meu! Na verdade daqui a duas semanas.

Aquele diálogo demorou o tempo suficiente para que a senhorita Grace roubasse mais algumas batatas e fizesse mais perguntas em relação a Stanford. Tanto eu como ela estávamos muito ansiosas com a minha aprovação.

Minha mãe se formou em Stanford em letras e lecionava inglês. Na época ela teve o privilégio de não ser bolsista. Meu avô podia pagar seus estudos.

O problema foi que durante a sua vida ele gastou todo o dinheiro nos seus vícios: jogos e mulheres. A sorte foi que sua filha conseguiu terminar a faculdade, mas não pode usufruir de um bom futuro. Não que Grace deva se queixar da vida: não passávamos necessidades, mas poderíamos ter muito mais conforto se meu avô não tivesse feito as suas burradas.

Assim que se formou ela começou a trabalhar em uma escola. Três semanas depois descobriu que estava grávida.

Então advinha quem estava caminho desse mundo maravilhoso? Sim, eu mesma. Um fruto proibido feito em Stanford.

Na verdade mamãe nunca falou sobre o assunto abertamente comigo, mas o meu pai morreu quando eu ainda nem tinha colocado os pés na terra.

A única informação que tenho é que no início ele não quis assumir a paternidade e muito menos me registrar. E orgulhosa do jeito que é... Minha mãe ela nunca mais o procurou. Até porque alguns meses depois ficou sabendo que ele morreu.

Você pode pensar: Ah, coitadinha da Camila.

Não mesmo. Não sou vítima.

Eu sou feliz tendo minha mãe comigo pra tudo. O pior seria se não tivesse ela.

Depois que soube da gravidez ela continuou dando aula. Então pediu a sua licença maternidade e depois de um tempo continuou lecionando, exercendo o seu trabalho até hoje.

Quando terminei de comer e lavar a louça fui para meu quarto abrir uma conversa com Claire. Para minha surpresa o que vi na tela do notebook foi uma criatura com os olhos contornados por um delineador azul, os cílios grossos e alongados mostrando o quão pretos eram, as bochechas coradas por um rosa excessivamente... digamos... rosa. E por fim os seus lábios estavam pintados com um batom vermelho cardinal.

Minha expressão de espanto antecipou as minhas palavras.

—Anabelle, é você?

—Haha. Muito engraçadinha.

—Sério amiga, você parece a Anabelle. Sabe aquela do filme de terror? Pois é, sinto muito.

Ela revirou os olhos e apontou a câmera do computador para uma criança com um sorriso maquiavélico rodeada de maquiagens, adereços para cabelos e roupas estranhas.

Sonho InversoWhere stories live. Discover now