Capítulo 3

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O padre aguardou na escuridão de seu quarto com os olhos fechados. Esperava fazia horas, mas a igreja permaneceu quieta. O único som era seu coração, as batidas preenchendo seus ouvidos como tambores.

Nathan estava exausto, mas o sono não veio. Não nos últimos dias. No passado, quando a insônia atacava, ele lia a bíblia. As palavras do Senhor o acalmavam e apaziguavam sua mente. Mas eu não mereço Suas palavras de misericórdia agora, pensou; a imagem do Livro Sagrado o paralisava naquele momento.

Levantou-se e caminhou até sua escrivaninha. Até na escuridão, sabia onde a gaveta estava. Nate pôs a mão no Livro. Ainda que não visse, era o mais perto que estaria das palavras d'Ele.

Seja forte e corajoso. Não tema; não perca a fé, pois o SENHOR, seu Deus estará contigo para onde quer que vá, pensou ele, com um sorriso triste nos lábios. Um dos versículos favoritos de Nate; aquele com o qual gostava de encerrar sua missa. Mas, depois de tudo, era ele quem não tinha coragem.

Deus, rezou ele, pela primeira vez em dias. Não sei se o que fiz foi o certo a fazer. Sou um mero homem, que não conhece o caminho que traçou para mim. Mas se eu tiver pecado, por favor, perdoe o garoto. Ele não tem culpa. Por favor, Senhor... este humilde servo implora que perdoe o jovem.

O padre chorou enquanto orava para o silêncio.

Aqueles que teu nome conhecem em ti confiam, pois você, DEUS, nunca abandonou aqueles que o buscam, enquanto repetia as Preces em seu coração, Nate escutou algo. Foi fraco, pouco mais alto que suas próprias lágrimas, mas o padre sabia o que era e foi até a sala secreta após pegar a sacola em cima da escrivaninha.

No instante em que empurrou a porta secreta, a intenção assassina do jovem envolveu Nate. Mandou calafrios para seu corpo. Ele precisou segurar o braço para parar de tremer.

— É você — disse Samuel com a voz rouca, a intenção assassina sumindo no segundo seguinte.

Não tema, não perca a fé, repetiu Nate até acalmar seu coração. Ele ficou assim por minha culpa. Ele só olhou quando Samuel estendeu as mãos cobertas de sangue e sujeira atrás de comida. O padre nada disse, mas o jovem notara.

Samuel olhou para sua mão, fechando e abrindo os dedos.

— Enterrei Mirela — disse, sua voz indiferente e o olhar morto.

O padre sabia que era melhor não perguntar mais. Esperou até o jovem mal comer a comida.

— É isso que ia perguntar, né? — Samuel pegou algo do bolso da jaqueta e jogou pro padre.

Mesmo na escura sala, Nate conseguiu pegar. Ele sentiu a dormência o preenchendo assim que sentiu o coração frio ainda bater de alguma forma. Engoliu a ânsia de vômito repentina. E pensei que também já havia morrido por dentro. Nate inspecionou o órgão, o sangue escuro em suas mãos.

— Agora, só precisamos da...

— Da cabeça. — Até os sussurros dele transbordavam raiva.

Nate encarou o jovem perante si. No passado, aconselharia a abandonar a raiva. Ela o machucava mais do que qualquer outro. Diria para crer no Senhor e assim seu caminho surgiria, por mais misterioso que fosse. Contudo, agora as palavras pareciam vazias. Até para o próprio Nate. Sua fé no Senhor não podia forçá-lo a dizer qualquer coisa para Samuel.

O padre colocou o coração no velho baú, perto da pedra vermelha-escura. Carne e sangue, pensou, enquanto fechava a tampa.

— Melhor descansar. Trarei comida mais tarde — disse, antes de sair. Ele empurrou a estante de volta a sua posição original, escondendo a porta.

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