Assassina?

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Tão logo o crime foi descoberto, Kandel isolou a área e mandou buscar o cavaleiro Galdrik. Isto demorou um pouco, pois ele não dormia na guarnição anexa ao palácio, mas sim em sua residência no Bairro das Espadas. Kandel guardava a porta do alojamento pessoalmente, havia agitação na guarnição e muitos dos cavaleiros, escudeiros e soldados da guarda já estavam despertos, a despeito do alvorecer ainda incompleto. Kandel isolou também os corredores, não queria falação perto da cena do crime. O lugar deveria estar o tão quieto quanto possível. A autoridade da Capitã foi suficiente para furar o bloqueio e ela levou consigo o monge Yaren.

— Capitã, Yaren. — a voz de Kandel soou pesada. Ele parecia esgotado, ou talvez, transtornado.

— Conselheiro — ela disse, e não estava nada feliz com a notícia. Henyl era um dos cavaleiros mais capazes dos blackwings. Era casto, compenetrado e talvez o mais habilidoso na conjuração dos sagrados ofícios. Por algumas ocasiões a Capitã buscara conselho junto ao experiente cavaleiro que beirava os cinquenta anos de idade.

— Ele não merecia perecer assim — Kandel deixou escapar, rancoroso. Ele e Henyl se conheciam de longa data.

Yaren tocou-lhe o ombro e olhou-o nos olhos com uma expressão de genuína compaixão. A expressão fechada de Kandel se suavizou por um momento.

A Capitã fez menção de entrar no quarto de Henyl, mas Kandel a segurou com firmeza.

— Não entre! Quero o ambiente livre de perturbações para que Galdrik dê uma olhada.

A Capitã anuiu. Compreendia o que Kandel pretendia. O cavaleiro Galdrik possuía inclinação para o Jii, em especial a habilidade para perscrutar o passado à partir da leitura de ambientes, corpos e objetos.

— Henyl era um sacerdote — revelou Kandel. — Mas quando a crise caiu sobre nós, encontrou disposição para passar pelo treinamento marcial. Eu mesmo o treinei, nos primeiros anos da academia.

— Rezarei para que seu espírito encontre a paz — ofereceu Yaren. Kandel acenou agradecido.

Enquanto isso, a Capitã demonstrava sinais de impaciência. Tamborilava a parede com os dedos e dava passos curtos de um lado a outro. Ela também tinha percepção psíquica e estava ansiosa para examinar a cena do crime. Já era a terceira vítima daquele assassino. E desde que começou a se aprofundar na investigação, com a ajuda de Yaren, sua mente não pensava em outra coisa.

A perda de Nathannis ainda lhe causava dor. E ela fora incapaz de ler as anotações do amigo sem a ajuda de Yaren. O monge havia percebido a fragilidade da Capitã em relação ao cavaleiro. Era difícil consolá-la e optou por não revelar todo o conteúdo das anotações.

"Estou preocupado com ela, mas deveria?" Yaren não mencionara esse trecho à Capitã. "Ela é tão forte e tão bonita... Se ela soubesse que vi seu rosto, acho que ia me matar". E Yaren havia parado para ficar imaginado sob qual circunstâncias Nathannis conseguira ver o rosto dela. A Capitã o escondia de forma obsessiva.

— Ele estava preocupado com você, Capitã. Por ocasião de sua viagem a Lacoresh. Mas expressa aqui também preocupações quanto ao futuro de Kamanesh. Eis o que diz: "Temo que uma guerra esteja próxima. Talvez Lady Kátia devesse assumir o trono no lugar do príncipe. Isto certamente deixaria nossa situação mais estável. Não confio nesses conselheiros; Sei que muitos não hesitariam em vender Kamanesh a quem der a maior oferta".

Ela pensava muito a respeito da hipótese tratada por Nathannis, mas que a maioria dos demais sequer dava crédito. Ele estava gastando um tempo considerável percorrendo o palácio em busca de sinais de um demônio escondido. Ela discutira aquilo com Kandel. O conselheiro não descartava a hipótese, mas também não estava muito convencido da causa dos assassinatos estar relacionada a um demônio escondido no palácio. O trecho que mais impressionava Kandel era a passagem em que Nathannis descreve seu encontro acidental com os conselheiros Yourdon e DeVance.

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