Capítulo 2: Gato!

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Tive uma boa noite de sono.

Eu nunca lembro dos meus sonhos e quando lembro são pesadelos. Acordo sobressaltada e não tenho uma imagem clara do que sonhei, mas sempre envolve carros. Hoje não lembro de nada é isso bom. Meu bloco de notas está no criado mudo ao lado da minha cama e sei que o li antes de dormir. Eu sempre faço isso. Pelo menos eu acho que sempre faço isso. Quero assim tentar guardar algo na mente dos fatos do dia ou de dias passados. Tentar prender coisas na cabeça. Talvez seja por isso que nunca esqueço Cora e Gael e nem as coisas que conversamos quando eles vêm me visitar.

Levanto, me espreguiço e me assusto com um gato no chão ao lado da minha cama. Sim, eu tenho um gato! Ele está enroladinho e me olha agora.

- Olá Gato! Bom dia! – olho para o chão e sinto o piso frio. Estou descalça e Gato está deitado no meu tapetinho. O nome dele é Gato. Provavelmente eu dei algum outro nome, mas... por tanto Gato é simples e eu não esqueceria. Me sento novamente e olho pra ele. Gato é laranja com mesclas de pelos brancos. De longe diriam: Olha um gato laranja! Porém um bom observador verá que entre toda a forte coloração, há fileiras sutis de pelos brancos. Ele é esbelto e grande. Um belo gato. Não faço a menor ideia de como ele veio parar aqui e quando ele some não sei aonde vai. Só sei que ele sempre volta e eu sempre me assusto. Eu dou comida pra ele? Eu tenho comida para gatos? Devo ter do contrário ele teria me abandonado. Vai ver eu dou comida tantas e tantas vezes seguidas e ele se aproveita da minha memória, da falta dela na verdade.

Estou usando pijamas compridos com estampas de lua e ursos de gorro. É confortável e eu gosto dele. Não sou mais uma menina e sei que devo tê-lo há bastante tempo porque as calças estão curtas. Batem acima dos tornozelos. Pego a caneta ao lado do bloco e prendo meus cabelos num coque alto. Abro as janelas e o dia me recebe. Uma bela manhã de verão: o sol amarelinho e reluzente mergulhado em um imenso céu azul límpido. Quase posso ver um rostinho alegre no sol assim como nos desenhos infantis. Poderia facilmente estar estampado em uma garrafinha de iogurte. Minhas macieiras balançam ao sabor do vento e um aroma de flores me brinda.

Meu estômago ronca e sei que não tomei café da manhã ainda. As manhãs são boas porque são óbvias e o óbvio me facilita a vida.

Na cozinha a cafeteira está funcionando e o cheiro de café recém-passado me recebe. A mesa está posta com uma bela toalha branca e azul, tem pães com aparências saborosas, acompanhados de geleias variadas, iogurte, uma xícara branca com desenhos florais azuis, um pires combinando. Há flores amarelas num vasinho comprido. Uau!

- Eu caprichei, não? – Falo e me olho. Não estou mais de pijamas. Agora estou com um vestido vermelho com pequenas flores brancas. Meus cabelos estão amarrados. Nos meus pés sapatilhas brancas confortáveis. Me sinto fresca e cheirosa. Eu tomei banho!

- Maravilha! – Solto os ombros e sorrio de leve. Passo as mãos pelo vestido, ergo a cabeça e determinada com meu novo dia, sirvo meu café e aprecio a companhia de Gato.

Após a refeição matinal levo a louça para a pia e guardo as coisas comestíveis na geladeira. Escovo os dentes e decido aproveitar a manhã em meu pátio. Abro a pequena porta da frente da casa, passando antes por minha sala impecavelmente mogno. Consigo até sentir o cheiro do lustra móveis. Quando eu passei lustra móveis? Só Deus sabe! Talvez Gato saiba também.

- Você sabe Gato? – pergunto pro bichano que me acompanha até meu jardim. Como o esperado, ele não responde. Menos mal!

O sol banha meu rosto e eu olho pra cima para vislumbrá-lo. Respiro fundo o cheiro das macieiras Aquarianas. Hoje não há maçãs, somente folhas verdes e passarinhos cantores. A grama como sempre está muito bem aparada e verdinha. O sol nunca castiga demais por aqui. Viro de costas e toco o topo da minha cabeça e descubro que estou com um imenso chapéu de palha e meus cabelos caem sobre os ombros. Seguro o chapéu enquanto reparo na minha casinha: o azul está desbotando. Eu gosto de azul! Preciso retocar isso. Será que eu tenho tinta? Bom, eu vejo isso depois.

Há um banquinho de madeira com arabescos em ferro escuro nas laterais. Vou até ele e me sento. Gostaria de ter um daqueles bancos brancos que balançam. Acho extremamente bonito e combinaria tão bem com a decoração! Meus olhos percorrem a extensão do gramado e noto na frente da primeira macieira o banco balanço branco e pomposo.

- Por Deus! Eu tenho um! – Corro até o mesmo e Gato me acompanha num ritmo mais cadenciado. Sorrio enquanto saltito porque já prevejo minha diversão. Quando me atiro sem receios no banco uso meus pés para dar o embalo e ele vai pra frente e pra trás de forma sutilmente agradável. É um banco grande e caberia aqui comigo duas pessoas pequenas ou uma grande. No entanto estou só e estou bem com isso também.

- Que dia é hoje?! – Me assusto. Paro o embalo e desço voltando pra casa, Gato sumiu. Procuro um calendário e encontro na geladeira. Como vou saber que dia é hoje por aqui? Não vai dar certo. Um celular! Eu devo ter um em algum lugar! – Pense. Pense! Estantes! – Reviro a estante da sala e depois vou ao meu quarto. Encontro o aparelhinho na penteadeira. No visor vejo que é terça-feira. É dia de semana! Eu preciso trabalhar!

- Se eu tiver um emprego certamente serei demitida. – Preciso falar com a Cora. Procuro seu nome na agenda e ligo.

– Alô? Cora? É Luci!

- Bom dia Lucinda!

- Lucinda? Esse é meu nome? Oh sim! Deixa pra lá! Onde é meu emprego? Você sabia que estou em casa? Que estava há minutos curtindo o meu banco balanço? Cora, me ajuda!

- Ah amor! Você está de licença, lembra?

- De licença do que?

- Fica tranquila. Estou indo para aí. Anota no bloquinho que Cora chega em alguns minutos. Está anotando Lucinha?

- Estou. Com batom no espelho. Não achei a caneta.

- Perfeito meu bem. Vou desligar, nos vemos já já. Beijinhos doces de creme brulee.

- Beijo desse creme pra você também.

Tranquilo! Cora estava vindo e me ajudaria. Eu tinha que ter um emprego. Como me sustentava com coisas tão bonitas e boas? Cora estava vindo. Que dia é hoje? Terça. O que eu faço nas terças? Eu trabalho?

- Looping, looping. Ah como eu detesto quando isso acontece! Preciso ficar tranquila. – respiro pelo nariz e solto pela boca, sento na beirada da cama e repito esse processo até desacelerar os batimentos cardíacos. Funciona!

Levanto e decido preparar um chá para esperar Cora. Não estou mais usando sapatilhas. Estou descalça e aos meus pés há um par de pantufas cor de rosa parecendo dois algodoes doces. Calço ambos e olho para o lado, no tapetinho oval e me assusto brevemente.

Um gato! Eu tenho um gato!

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Vocês estão conhecendo a minha Luci. Ela está conhecendo vocês, mas não se chateiem, ela não vai lembrar de vocês amanhã. Então votem, comentem, divulguem e retornem pra que ela anote no bloquinho, quem sabe ela não memoriza? <3

Agradeço quem acompanhou a estreia e deixou seus votinhos, coments e seus olhinhos por aqui. Eu amei! Vocês fazem meus dias mais coloridos com sua leitura. Esse é o maior prêmio de um autor!

Obrigadaaaa imensamente e aguardo suas impressões, sempre <3

beijos de creme brulee

Camila Martins


A Lucidez de Luci (Completa Até Dia 01/12)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora