8. O Que For Preciso Para Me Manter Viva

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23 de Julho de 2014 às 02h02. Hotel La Reserve, Paris, França.

Ethan Wyatt se orgulhava de conseguir dormir bem, mesmo com várias preocupações lotando a sua mente e culpas pesando em sua consciência, mas naquela noite, não conseguia fechar os olhos e se entregar ao sono.

Ainda que soubesse que o hotel era seguro e que Jack e Mike eram os homens mais experientes para lhe ajudarem a manter Mia em segurança, não conseguia deixar de estar alerta.

Sabia que ela corria perigo e agora as ameaças eram ainda maiores. Grande parte da cena criminosa mundial não dava a mínima para códigos de honra, sendo assim, eles não hesitariam em entregar Bloody à Interpol se isso lhes garantisse uma quantia maravilhosamente alta e talvez até mesmo anistia. E considerando-se a ficha de Bloody, a melhor assassina da América, os federais não seriam nem um pouquinho condescendentes com a sua ex-noiva.

Um arrepio frio passou por sua espinha e Ethan levantou-se de uma vez. Havia algo de muito estranho naquele momento. Um hotel não deveria ser tão silencioso, apesar do adiantado da hora. Da maneira que estava, com a camisa aberta e a gravata borboleta pendurada, Ethan pegou a sua pistola debaixo do travesseiro, segurando-a perto do rosto enquanto atravessava o corredor o mais quieto possível.

A sua intuição raramente falhava e por isso soube imediatamente que era estranho demais que um homem com o uniforme dos carregadores se encontrasse em um andar tão alto, ainda mais quando ele se certificara de reservar todos os quartos do andar para evitar que qualquer pessoa tivesse acesso aos seus materiais e planos. Ele nem sequer permitira que as arrumadeiras entrassem no quarto, então estava bem ciente de que aquele homem não deveria estar naquele maldito corredor.

Entrou pela porta à sua esquerda, sabendo que ali era a sala de ligação ao quarto de Mia, buscando sempre fazer todos os gestos o mais silenciosamente que conseguia, enquanto atravessava a enorme suíte em direção ao quarto propriamente dito. A arma sempre empunhada, pronto para atirar em quer que estivesse em seu caminho.

Ethan havia desistido de tudo, até mesmo da própria Mia, para protegê-la e era isso que faria, nem que fosse o seu último ato.

Lá estava ela, em frente à janela, mas ao contrário do que esperava, Mia não estava apenas contemplando a visão da rua parisiense lá embaixo. Assim como ele, Bloody empunhava uma arma enquanto afastava a janela com cuidado, observando analiticamente como apenas uma assassina altamente treinada era capaz de fazer.

Ela ergueu os olhos para ele enquanto direcionava a pistola em sua direção, mas abaixou-a assim que o reconheceu.

- Um no corredor. – anunciou ele como se comunicação mais específica que o seu sussurro curto não fosse necessária.

- Pelo menos dois na lateral do hotel. – com mais uma olhada, ela fechou a cortina, enquanto ele a encarava. – O que está acontecendo, Ethan?

- Eu prometo que responderei quando não estivermos sob nenhuma mira, ok?

- Infelizmente, eu já não acredito em suas promessas desde que você morreu.

Antes que ele pudesse fazer qualquer comentário em represália, o som da porta lateral, geralmente usada pelos funcionários se fez ouvir. Ambos não pensaram, simplesmente deslizaram pela esquerda, alcançando o corredor pela outra porta antes que o atacante pudesse prever seus movimentos.

Eram sincronizados e por isso não precisaram de palavras para, juntos, descerem as escadas com pressa, escutando a porta bater com um grande estrondo enquanto o ruído do botão do elevador sendo acionado podia ser ouvido mesmo ali debaixo.

Os seus passos eram apressados e em poucos minutos chegaram ao primeiro andar e foram espertos o bastante para saberem que não poderiam chegar até o subsolo onde ficava o estacionamento. Ainda que pudessem pegar um dos carros que estavam lá, jamais fariam isso sem estar sob a mira de uma dezena de atiradores, provavelmente. A saída traseira também estava comprometida.

Ambos sabiam como os criminosos pensavam e sabiam que aquela seria a primeira escolha deles, assim como a saída dos empregados, mas a entrada não estaria tão bem protegida.

Jamais esperariam o óbvio de Ethan Wyatt ou de Bloody. Assim, com apenas um olhar, ambos sabiam o que fazer e rumaram para a entrada principal, saindo pela porta da frente sem olharem para trás.

Havia um carro parado mais à esquerda e Ethan sabia o propósito dele, no começo de sua carreira no crime dirigira carros de fuga o bastante para saber como ficar à paisana e, sem se preocupar com quem pudesse vê-los, ali diante de um dos hotéis mais caros da cidade de Paris, passou fez um sinal discreto com a cabeça na direção de Mia e ela, como a boa atiradora que era, apenas apontou.

Não era necessário mira. Apenas deixou que o seu dedo puxasse o gatilho e a bala acertasse o seu alvo no banco do motorista voltaram a correr até estarem longe o suficiente do hotel e assim pudessem finalmente conversar e discutir os seus planos.

Precisavam de um local, e rápido. Afinal, Bloody ainda estava de roupão e fora uma verdadeira sorte que houvesse conseguido sair do hotel com ele. Precisavam se esconder e estruturar um plano para uma represália rápida e sangrenta.

Bloody sabia que aqueles homens não eram da polícia. Nem mesmo agentes infiltrados eram tão sutis quanto aqueles no hotel. Aqueles eram da máfia e, mesmo sem saber precisar de onde, Mia sabia que os homens eram bem preparados e haviam entrado para matar.

Então não era nada em correlação com o assalto ao CDC, havia algo muito além acontecendo e Bloody sentia que todos, exceto ela, tinham conhecimento disso.

Assim, ergueu a sua pistola, mirando o ponto exato no meio dos olhos de Ethan. Podia muito bem explodir os miolos dele bem ali, bem naquele momento. Agora tudo entrava nos eixos em sua cabeça e tinha plena certeza de que aquele idiota não havia retornado dos mortos em vão.

- Diga. Diga, Ethan, ou eu juro que explodo a porra da sua cabeça.

- Eles estão atrás de você.

- Diga-me algo que eu não saiba.

- Há um prêmio por sua cabeça. A Interpol entrou em contato com os clãs do mundo inteiro, eles darão dez milhões pelo seu corpo entregue na sede.

- Isso é... – ela desmontou, abaixando a arma e olhando para o chão sem saber o que dizer. Como eles podiam dar um prêmio para a sua cabeça? Aqueles malditos. Eram incapazes de pegá-la sozinhos e fizeram da arte de sua captura uma verdadeira caçada.

Mas ela não havia feito o seu nome sendo relapsa.

Sabia exatamente o que fazer e por isso simplesmente deu de ombros, voltando a assumir a persona que salvara a sua vida quando achara que não era mais capaz de respirar. Justamente por causa daquele homem que agora parecia tão comprometido em salvá-la.

- Deixe que venham.

- Mia, você não entende, eu...

- Você inventou um assalto ao banco mais seguro do mundo apenas para me manter sob os seus olhos numa tentativa estúpida de me proteger. Então deixa eu te explicar uma coisa, Ethan: eu posso me cuidar sozinha. Posso ter sido uma garota dependente de você no passado, mas as coisas mudaram. Há um prêmio e é pela minha cabeça. Eu sou a assassina mais temida do mundo, ao que parece. E eu sou uma mulher e apenas isso já é o bastante para que você saiba que eu sou capaz de fazer o que for preciso para me manter viva.

- Eu posso te ajudar, Mia, eu posso te proteger. – disse ele, já derrotado. Aquela não era a Mia que conhecera. A mulher que o deixaria cobri-la com sua proteção, que o permitiria guiá-la pelo caminho que ele julgasse mais conveniente. E estranhamente, Ethan não via um problema nisso. Havia uma nota de orgulho crescente em seu coração e isso era tudo o que ele confessaria.

- Se quiser, pode me acompanhar e me dar cobertura. Mas eu estou no comando da minha vida.

E sem mais ela tomou o seu caminho, andando seminua pelas ruas escuras de Paris com ele atrás de si, escondendo um sorriso e a preocupação que o corroia em doses iguais com o orgulho que o preenchia.


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