Meleca de nariz

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Pois bem, ali está você, parado, observando se existe algum olhar em sua direção

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Pois bem, ali está você, parado, observando se existe algum olhar em sua direção. O ambiente é aleatório, mas uma regra é quase absoluta, você nunca está sozinho quando uma meleca começa a incomodar o seu nariz.

Com o mesmo efeito elefantíaco que faz um pedaço de milho de pipoca parecer uma laranja inteira entre os dentes, quando você coloca o dedo no nariz procurando algo que julga ser o iceberg que afundou o Titanic e acabou com o romance de Jack e Rose, e tira de lá nada mais que uma coisa diminuta sem forma, de composição de cor limitada a 3 tons da paleta de 16 cores do Windows, não sobra muito a não ser um pensamento indignado "aquela bigorna que tanto me incomodou era apenas isso?

Fita-a na ponta dos dedos por alguns instantes, existe um certo prazer em limpar o salão para uma festinha, há de se confessar, deve ser uma psique de raízes pré-históricas, com alguma explicação freudiana que não cabe a esse texto. Mas, por que diabos isso acontece majoritariamente quando você está no meio de pessoas? Ironias fisiológicas, artimanhas de um subconsciente vingativo aliado as glândulas de secreção? Pode ser. Divagações que cabem as futuras gerações responder.

Usa-se de habilidade cirúrgica ao enfiar o indicador sem que ninguém o veja em um orifício que parece ter tido como primeira meta comportar especificamente esse calibre, e executar com a última falange movimentos dignos de uma performance de dança do ventre. Retira-se de lá, das profundezas escuras da cavidade nasal o corpo estranho, envolto por uma camada de muco que convenhamos bem, em uma mãe-natureza mais democrática poderia bem ter o aspecto de pérolas.

Retirado o piano de cauda de dentro do nariz, sente-se breve alívio após a agonia começar novamente, em uma tentativa frustrada de usar o dedão como alavanca para arremessar o grude para longe, tem-se como único resultado a sua troca de lugar, da falange do indicador para a falange do dedão. Agito, sopro, nada disso adianta. Recorre-se ao dedo médio, o Golias dos dedos, que facilmente é vencido por um grude nas dimensões do pequeno Davi. O processo é repetido com todos os dedos, procurando desesperadamente algum com uma superfície menos aderente a cola nasal, esgotados os cinco, tenta-se a outra mão, que nada de positivo produz, não é tarefa de sua repartição.

Agitam-se as mãos e braços, e muito possivelmente nessa hora todo o esforço ninja empregado para retirá-la discretamente do nariz já caiu por terra, e todos sabem que você tem uma meleca nos dedos. Já não sobra muita coisa, se ainda não foi visto, em breve o será. Então, como pessoa civilizada que você é, e frustrado por ser vencido pela capacidade de aderência das suas digitais, dá-se a meleca o fim adequado, o lado de baixo do tampo de uma mesa, a quina de uma parede próxima, a parte de trás do sofá, as costas de algum cretino do seu convívio que você presenteia com um pequeno tapinha abaixo dos ombros, ou o bolso, para guardar e levar pra casa, e arranhar os dedos alguns dias depois, quando ela já estiver cristalizada.

Mas é sabido que o bolso é tido como opção apenas para os mais apegados com o próprio corpo, narcisistas extremos, do tipo que guardam dentes de leite e que provavelmente jamais doariam órgãos.

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