VINTE E NOVE

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O carro já havia dado tantas voltas em meio a ruas sinuosas e estreitas que Sofia já havia perdido a noção das horas. Parecia que estava presa ali dentro junto com aqueles dois maníacos há dias. Um silêncio estrangulador pairava no ar agravando a angustia que lhe ressecava a garganta, se ao menos conseguisse mexer as mãos poderia descontar a ansiedade que sentia em suas unhas. Havia se sacrificado por meses contendo a compulsão que sentia por roê-las apenas para conseguir deixá-las crescer alguns centímetros, mas se pudesse naquele momento arruinaria tudo sem nem ao menos pensar duas vezes, afinal de contas, provavelmente estaria morta em algumas horas então a boa aparência de suas mãos não lhe seria mais tão importante.

Por um minuto achou engraçado em se imaginar morta. Os mortos a haviam perseguido arduamente durante toda a sua vida, portanto quando se juntasse a eles, faria questão de azucrinar tanto cada um que lhe cruzasse o caminho que com certeza iriam se reunir para fazer um plebiscito e exigir que ela voltasse ao mundo dos vivos. Só assim se sentiria justiçada.

- Porque é que está demorando tanto para chegarmos? – Questionou Plínio rasgando o silêncio frio. – Para onde estamos indo afinal?

- Quando chegarmos você saberá. – Respondeu Lecto Sirrah utilizando a suave voz de Anabella sem tirar os olhos da rua.

- Mas já estamos a quase uma hora andando dentro deste carro sem chegarmos a lugar nenhum. Parece até que estamos andando em círculos.

- Estamos seguindo o plano, irei parar de dirigir na hora certa. Por enquanto, cale a boca e relaxa.

- Como assim relaxa? Você não me conta nada do que está acontecendo, nem parece que estamos nessa juntos.

- Nós não estamos nessa juntos, Plínio. – Fez questão de salientar Sirrah. – Eu sou o único que precisa saber o que está acontecendo, entendeu?

- Pois eu estou de saco cheio disso. Desde que conheci vocês eu não faço mais nada além de seguir ordens às escuras. Eu perdi toda a minha vida por causa disso e por isso exijo explicações. Agora! – Gritou Plínio esmurrando o painel do veiculo.

Como resposta ao ataque de fúria do outro, subitamente Lecto Sirrah com um único e ligeiro movimento, puxou o freio de mão e rodou o volante fazendo o carro girar quase 180 graus em uma pista de terra seca.

O coração de Plínio disparou assustado e antes que pudesse esboçar qualquer reação, já se encontrava pressionado contra o vidro de sua porta por um braço rígido que apertava o seu pescoço enquanto um cano de revólver era forçado para dentro de sua garganta.

- Eu vou te dizer isso apenas mais uma vez, então preste bastante atenção. – Ameaçou Sirrah sob os olhos verdes e raivosos de Anabella. – Eu não suporto mais essa sua choradeira, aja como um homem ao menos uma vez na vida e cale esta boca resmungona ou eu juro que estouro seus miolos de dentro para fora e dou sua carcaça para um gohren comer, entendeu?

Mesmo sem saber o que era um gohren, Plínio concordou com a cabeça sem tirar os olhos da arma fria que tocava sua garganta.

- Eu não sei qual o real interesse de Il Sabar contigo, mas prefiro me resolver com ele depois que lhe entregar seu cadáver do que ter que agüentar estas suas reclamações por mais um minuto sequer. – Concluiu Sirrah soltando o pescoço do homem amedrontado enquanto guardava novamente a arma na cintura. – Espero que tenha entendido de uma vez por todas que não está em condições de exigir nada.

Plínio tossiu por diversos minutos massageando o pescoço enquanto Sirrah dava a meia volta para a estrada.

Assustada com a cena que acabara de presenciar do banco de trás, Sofia teve certeza que em breve realmente iria se reunir aos finados amigos que lhe rodearam durante tanto tempo.

Elafium: A guerra ocultaOnde histórias criam vida. Descubra agora