Capítulo 3

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O obstetra confirmou o que eu já sabia: não havia salvação, cirurgia, tratamento, transplante, nenhuma luz. Eram grandes as chances de que nossa filha chegasse viva ao fim da gestação, enquanto meu corpo a suprisse de tudo; mas, uma vez nascida, não sobreviveria por conta própria por mais que algumas horas.

"E o que eu faço?" perguntei-lhe num fio de voz. A sensação de vulnerabilidade me paralisava. Queria que alguém decidisse por mim.

"É um assunto delicado, mas, como me perguntou tão diretamente, serei também direto. No lugar de vocês, eu optaria pelo aborto. Vocês ainda têm metade da gestação pela frente, é tempo demais para sofrer tanto assim."

Diante do silêncio de meu marido, encolhido na cadeira como que esmagado pelas palavras que acabara de ouvir, percebi que daquela vez não poderia contar com a iniciativa dele, e me adiantei:

"Você pode nos ajudar?"

Eu não tinha a menor ideia de como proceder, onde procurar, a quem recorrer. Ele entendeu que ajuda eu requisitava, pois anotou um nome e um número num papel e me estendeu.

Ao voltarmos para casa, num ímpeto mútuo, meu marido e eu invadimos o quarto que seria de nossa filha e ficamos ali, olhando para aquelas paredes recém-pintadas, em pé naquele cômodo ainda vazio da mobília que não mais compraríamos. Abraçamo-nos e permanecemos naquela posição por uns vinte minutos. Ao sairmos, em vez de deixar a porta aberta, como vínhamos fazendo até então, para que o cheiro da tinha se extinguisse mais depressa, ele a fechou. Aquilo ficara para trás, parecia dizer.


No ControleWhere stories live. Discover now