De perto e de longe

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O velho, sentado à soleira, balançando suave no alpendre da noite, vigia o horizonte de cabelos vermelhos. O velho cofia e pensa, pensa e cofia. E o rapaz aparece, saído de antes, cheirando a mofado perfume de flores. E sorri sépia para a garota cinzenta. O velho mareja.

Pela janela aberta, os jovens se beijam. O velho acompanha de perto e de longe. De perto e de longe. E assim ele viu tudo e de tudo lembrou-se. Viu de perto os seus olhos crispados de sonhos, mergulhados em contas de promessas. Viu de longe as pessoas, cochichando matreiras, cumplicidade e inveja.

Viu de perto aquelas mãos serpenteando em si mesmas, se enroscando em palavras, sob carinhosos dedões. Viu de longe a igreja, a praça e a morada, cada vez mais longe, cada vez mais ontem.

De perto, os cheiros que só tem quem se gosta. De longe o vazio do inverno da escolha. De perto o abraço que se abraça e que cola. De longe a estrada de uma só mão.

O velho, sentado à soleira, balançando suave no vestíbulo da noite, vigia o horizonte de cabelos negros cintilantes.

Cofiando e pensando, cofiando e pensando. O vento frio carrega a fumaça do pito e da alma, morna de histórias que a janela soltou.

Enfim se levanta e estica os braços para alcançar o não-sei-o-que que os bocejos buscam no céu. O velho dá adeus pro firmamento e vai para a cama. De perto, a janela fechada. De longe, as escolhas da gente.

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