Prólogo_Página 04

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Não mais do que de repente, todas as vozes roucas e ruídos distorcidos começaram então a se mesclar, e, de uma forma misteriosa e progressiva, cada som que por ali pairava passou a anular algum outro mais ou menos a ele mesmo inversamente similar. Evoluíram neste processo, abafando uns aos outros, até tudo na sala "A" do oitavo piso definitivamente se calar.

No entanto, à exceção do completo silêncio que se alojara por todo o andar, um chiado solitário e anônimo ou inexistente até então agora permeaaaava. Sua origem, porém, rapidamente fora identificada e já era visível, mais que plausível, que só poderia e partia do aparelho repousado por entre as mãos descansadas sobre a mesa do rapaz de mocassins calçado. Sendo então, portanto, por fim, um som que partia de seu próprio notebook, por entre suas próprias mãos, por sobre sua própria mesa, como ele e como há pouco já dito, ali repousado e lá permanecido... Chiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiaaaaaandooo.

...E o seu notebook, e as suas mãos, e a sua mesa, e o seu... chiiiiiiiaado — ??!! — e todos os outros "os seus", e as suas, e todos, todos permaneciam ali à sua frente, insistentes. Porém seu chiiiado havia cessado segundos após localizado, mas com êxito havia deixado os olhos do jovem rapaz voltados para a tela da máquina que, também e mais que todos ainda à sua frente, passou, a partir de então, a reluzir e pestanejar e emaranhar uma imensa quantidade de imagens confusas e frenéticas e incoerentes, intercaladas entre micros e contínuos e vertiginosos lapsos visuais.

De imediato, só mesmo imagens aleatórias de pessoas desconhecidas em paisagens completamente indefinidas. E no começo realmente tudo lhe parecia basicamente isso, uma carrada de acontecimentos alheios e incompreensíveis até uma destas, uma destas frenéticas sequências visuais, se deter e se estender por um pouco mais do que um quarto e meio de segundo, seguida de uma mais longa, depois da seguinte e logo de outra acompanhada de uma ainda menos compacta do que a anterior.

Daí  para mais alguns décimos de segundo adiante percebeu que todos aqueles pixels desgovernados  não se amontoavam aleatoriamente na tela do seu computador pelo simples objetivo de dar alguma forma qualquer à "imagens estáticas" .jpg, .png, .bmp casuais como havia concluído a princípio mas sim para dar forma e também alguma vida, pois juntas, e agora na sequência correta, as imagens evoluíam na formação de pequenos vídeos (.wmv) que vez ou outra avançavam um tanto nítidos sobre a mesa do rapaz, quase holográficos para além do display, e que na verdade seriam, em mais específico por assim dizer (se possível), curtas curtos ou diversos trechos de variados filmes entrecortados rodados em uma espécie de 3D  danificado e bastante vago. De todos eles nenhum grande clássico, sucesso de bilheteria ou relevantíssima produção, apenas cenas cinematográficas de produção parca, tipo "B", o que viria a ser justificativa ideal para que o jovem sequer fizesse alguma ideia do título de origem de quaisquer uma delas.

Observou ainda que todas as cenas se restringiam à personagens diante da euforia de pequenas conquistas, ou imersos em contemplações bucólicas e pessoais, ou inquietantemente envoltos em singelas ou tórridas paixões o que em sua avaliação momentânea, nada inspiradora ou poética, apenas lhe pareciam cenas confusas e alternadas, hora protagonizadas por gente excessivamente e/ou desnecessariamente feliz, hora por gente pra lá de chapada e bem extasiada, hora por gente bastante piegas ou por demais fogosa, mas, por fim, tudo gente e unicamente gente de todo tipo de gente. Gente caindo em si, gente saltando para fora de si, gente ainda aos tropeções por dentro de si. Tão-somente e tanta gente que no grosso da sinopse geral daquele festival hipster  de cinema individual só do que se falava era de gente. Exclusivamente e nada além do que gente usufruindo dos estranhos extremos de apenas ser gente.


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Manga Verde, Sal a GostoWhere stories live. Discover now